Alberto da Cunha Sampaio (Guimarães, 15 de Novembro de 1841 - Quinta de Boamense, São Cristóvão de Cabeçudos, Vila Nova de Famalicão, 1 de Dezembro de 1908).
Bacharel em Direito pela Universidade de Coimbra, em 1863. Durante os seus cinco anos de estudante em Coimbra, colaborou em diversas publicações académicas, num período em que cursaram também Antero de Quental, José Falcão, Teófilo Braga, Manuel de Arriaga, António de Azevedo Castelo Branco e Alberto Teles.
Tentou a advocacia em Lisboa, mas a vida cosmopolita da capital frustrou-o, regressando ao Minho, à Quinta de Boamense, propriedade dos seus pais, situada na freguesia de Cabeçudos, concelho de Vila Nova de Famalicão.
Em 1869, integrou a filial de Guimarães da Associação Arqueológica de Lisboa e, quatro anos mais tarde, o núcleo de fundadores da Companhia dos Banhos de Vizela. Em 1881, é distinguido como sócio honorário da Sociedade Martins Sarmento. Considerado, no seu tempo, um profundo conhecedor do mundo rural, especialmente no domínio da vitivinicultura, área em que a excelência dos vinhos verdes produzidos em Boamense foram internacionalmente premiados, os seus serviços de aconselhamento foram, por esse motivo, frequentemente solicitados.
Em 1884, Alberto Sampaio publicou O Presente e o Futuro da Viticultura no Minho, o seu primeiro contributo para o conhecimento da economia rural do norte do país. Nesse ano, foi o diretor técnico da 1.ª Exposição Industrial de Guimarães. A pedido de Oliveira Martins, colaborou na elaboração do Projeto de Lei de Fomento Rural apresentado na Câmara dos Deputados em Abril de 1887. Esse projecto não chegou a ser votado.
Alberto Sampaio veio depois a revelar-se um excepcional investigador histórico, pioneiro da história económica em Portugal, publicando dois estudos - As Vilas do Norte de Portugal e As Póvoas Marítimas, medievais - que virão a ter repercussão decisiva nas obras de António Sardinha, O Valor da Raça (1915) e A Teoria das Cortes Gerais (1925).
Em O Valor da Raça - Introdução a uma Campanha Nacional, nas páginas 110-111, é em Sampaio que Sardinha recolhe as bases para a compreensão do papel dos municípios e dos vereadores dos Concelhos na formação da nacionalidade - "essa magistratura pacífica, estofo medular da Era de Quatrocentos":
"O ilustre Alberto Sampaio ressuscita o lapso tão ensombrado que, sobre a ocupação latina, prepara os intróitos da Nacionalidade. Na extraordinária monografia, As villas do norte de Portugal, nós assistimos à formação e ao desenvolvimento da propriedade. Lá se verifica o afervorado sentido localista do Luso. Pelo favor das colheitas e com um carácter efectivo de patriarcalismo, uma espécie de aristocracia se corporiza e adquire recorte fisionómico. São os domini, que funcionam em detentores do direito, aplicando os usos e discernindo as contendas nos bancos toscos das fontes. Dos domini vão derivar os maiorais da behetria que, à sombra da azinheira simbólica da Raça, assinam as cartas de foral com o Príncipe eleito para seu regedor vitalício.
Nascidos do seio da população e investindo-se de prestigio pelo consenso tácito das massas, os domini não predominam por mercê de situações de regalia. Traduzem a aptidão espontânea dos agregados para destacarem de si figuras que os signifiquem e encaminhem em justiça. Na véspera haviam sido os magnates da Citânia. Iam ser no dia seguinte os vereadores do Concelho. Essa magistratura pacifica é o estofo medular da Era de Quatrocentos. Encontra-se nas tábuas de Nuno Gonçalves, alinhando-se como fundo da dinastia exposta. Porque incarnava todas as virtudes simples duma família de lavradores, nela se encerrou a consciência da Grey. Com ela Afonso III consolida o Estado. É por ela ainda que as Cortes-Gerais se enchem da ressonância honesta dos seus pareceres avisados.
Guiando as vilas pelo prudente arbítrio, tornado herança consuetudinária, os domini deram, como já dissemos, os homens-bons da governança. O conceito político de republica (de respublica), cedo o tiveram como autoridades sociais, condensadoras das preferencias do agrupamento e seus órgãos naturais. É em trinta infanções, companheiros do conde D. Henrique, que o Livro Velho das linhagens do Reino entronca toda a nossa ramaria nobiliárquica. Pois com os domini rurais se chocaram os aventureiros da Reconquista "(...)
Em A Teoria das Cortes Gerais (1925, 2ª edição, 1975), pp. 74-75; 80-82; 86-91; 92-98; 108.
Os trabalhos de Alberto Sampaio tinham sido publicados na Revista de Portugal, dirigida por Eça de Queirós, e na revista Portugália, editada por Ricardo Severo e Rocha Peixoto, fazendo emergir o povo anónimo da penumbra da história pátria, e que Sardinha vai retomar para o entender como o autêntico alicerce da nacionalidade e liberdade portuguesa. No estudo inacabado sobre as póvoas marítimas de Sampaio, verifica-se também que, no norte do país, se achava firmada uma marinha mercante de longo curso muito antes de concluída a reconquista cristã dos territórios penínsulares.
Alberto Sampaio morreu na sua Casa de Boamense em 1 de Dezembro de 1908.
Em 1923, por iniciativa de Luís de Magalhães, a Livraria Chardron Lello & Irmão publicou parte da sua obra sob o título Estudos Históricos e Económicos.
Bibliografia
Manuel Alves de Oliveira, Dois Vimaranenses na obra de António Sardinha - Martins Sarmento e Alberto Sampaio, Guimarães, 1979.
Emília N. Faria; António Martins, org., introd., notas. Cartas a Alberto Sampaio (Porto, Campo das Letras, 2008).
Refs.:
https://www.arquivoalbertosampaio.org/details?id=1&detailsType=Authority
Bacharel em Direito pela Universidade de Coimbra, em 1863. Durante os seus cinco anos de estudante em Coimbra, colaborou em diversas publicações académicas, num período em que cursaram também Antero de Quental, José Falcão, Teófilo Braga, Manuel de Arriaga, António de Azevedo Castelo Branco e Alberto Teles.
Tentou a advocacia em Lisboa, mas a vida cosmopolita da capital frustrou-o, regressando ao Minho, à Quinta de Boamense, propriedade dos seus pais, situada na freguesia de Cabeçudos, concelho de Vila Nova de Famalicão.
Em 1869, integrou a filial de Guimarães da Associação Arqueológica de Lisboa e, quatro anos mais tarde, o núcleo de fundadores da Companhia dos Banhos de Vizela. Em 1881, é distinguido como sócio honorário da Sociedade Martins Sarmento. Considerado, no seu tempo, um profundo conhecedor do mundo rural, especialmente no domínio da vitivinicultura, área em que a excelência dos vinhos verdes produzidos em Boamense foram internacionalmente premiados, os seus serviços de aconselhamento foram, por esse motivo, frequentemente solicitados.
Em 1884, Alberto Sampaio publicou O Presente e o Futuro da Viticultura no Minho, o seu primeiro contributo para o conhecimento da economia rural do norte do país. Nesse ano, foi o diretor técnico da 1.ª Exposição Industrial de Guimarães. A pedido de Oliveira Martins, colaborou na elaboração do Projeto de Lei de Fomento Rural apresentado na Câmara dos Deputados em Abril de 1887. Esse projecto não chegou a ser votado.
Alberto Sampaio veio depois a revelar-se um excepcional investigador histórico, pioneiro da história económica em Portugal, publicando dois estudos - As Vilas do Norte de Portugal e As Póvoas Marítimas, medievais - que virão a ter repercussão decisiva nas obras de António Sardinha, O Valor da Raça (1915) e A Teoria das Cortes Gerais (1925).
Em O Valor da Raça - Introdução a uma Campanha Nacional, nas páginas 110-111, é em Sampaio que Sardinha recolhe as bases para a compreensão do papel dos municípios e dos vereadores dos Concelhos na formação da nacionalidade - "essa magistratura pacífica, estofo medular da Era de Quatrocentos":
"O ilustre Alberto Sampaio ressuscita o lapso tão ensombrado que, sobre a ocupação latina, prepara os intróitos da Nacionalidade. Na extraordinária monografia, As villas do norte de Portugal, nós assistimos à formação e ao desenvolvimento da propriedade. Lá se verifica o afervorado sentido localista do Luso. Pelo favor das colheitas e com um carácter efectivo de patriarcalismo, uma espécie de aristocracia se corporiza e adquire recorte fisionómico. São os domini, que funcionam em detentores do direito, aplicando os usos e discernindo as contendas nos bancos toscos das fontes. Dos domini vão derivar os maiorais da behetria que, à sombra da azinheira simbólica da Raça, assinam as cartas de foral com o Príncipe eleito para seu regedor vitalício.
Nascidos do seio da população e investindo-se de prestigio pelo consenso tácito das massas, os domini não predominam por mercê de situações de regalia. Traduzem a aptidão espontânea dos agregados para destacarem de si figuras que os signifiquem e encaminhem em justiça. Na véspera haviam sido os magnates da Citânia. Iam ser no dia seguinte os vereadores do Concelho. Essa magistratura pacifica é o estofo medular da Era de Quatrocentos. Encontra-se nas tábuas de Nuno Gonçalves, alinhando-se como fundo da dinastia exposta. Porque incarnava todas as virtudes simples duma família de lavradores, nela se encerrou a consciência da Grey. Com ela Afonso III consolida o Estado. É por ela ainda que as Cortes-Gerais se enchem da ressonância honesta dos seus pareceres avisados.
Guiando as vilas pelo prudente arbítrio, tornado herança consuetudinária, os domini deram, como já dissemos, os homens-bons da governança. O conceito político de republica (de respublica), cedo o tiveram como autoridades sociais, condensadoras das preferencias do agrupamento e seus órgãos naturais. É em trinta infanções, companheiros do conde D. Henrique, que o Livro Velho das linhagens do Reino entronca toda a nossa ramaria nobiliárquica. Pois com os domini rurais se chocaram os aventureiros da Reconquista "(...)
Em A Teoria das Cortes Gerais (1925, 2ª edição, 1975), pp. 74-75; 80-82; 86-91; 92-98; 108.
Os trabalhos de Alberto Sampaio tinham sido publicados na Revista de Portugal, dirigida por Eça de Queirós, e na revista Portugália, editada por Ricardo Severo e Rocha Peixoto, fazendo emergir o povo anónimo da penumbra da história pátria, e que Sardinha vai retomar para o entender como o autêntico alicerce da nacionalidade e liberdade portuguesa. No estudo inacabado sobre as póvoas marítimas de Sampaio, verifica-se também que, no norte do país, se achava firmada uma marinha mercante de longo curso muito antes de concluída a reconquista cristã dos territórios penínsulares.
Alberto Sampaio morreu na sua Casa de Boamense em 1 de Dezembro de 1908.
Em 1923, por iniciativa de Luís de Magalhães, a Livraria Chardron Lello & Irmão publicou parte da sua obra sob o título Estudos Históricos e Económicos.
Bibliografia
Manuel Alves de Oliveira, Dois Vimaranenses na obra de António Sardinha - Martins Sarmento e Alberto Sampaio, Guimarães, 1979.
Emília N. Faria; António Martins, org., introd., notas. Cartas a Alberto Sampaio (Porto, Campo das Letras, 2008).
Refs.:
https://www.arquivoalbertosampaio.org/details?id=1&detailsType=Authority
(Na imagem, capa da edição de 2019: As Vilas do Norte de Portugal, Lisboa, Universidade de Lisboa, 2019).
As Vilas do Norte de Portugal é um livro pioneiro sobre o estabelecimento e as origens da propriedade. Trata-se de um estudo histórico e económico que se concentra na região do Minho e vai do período romano à constituição definitiva do Estado português, passando pelas invasões bárbaras e o período neogodo. Apesar da sua aparente circunscrição, é este estudo que vai estabelecer os fundamentos da organização económica do país, que se mantêm até aos nossos dias.
Esta obra de Alberto Sampaio tornou-se um clássico da historiografia portuguesa e, mesmo contando mais de um século de existência, mantém uma vitalidade inegável. Esta deve-se em muito a um dos seus traços mais originais, a opção de Sampaio por contar a história social em vez da tradicional narrativa política.
Esta edição da obra é a primeira que reúne num único volume a obra principal e o seu resumo, intitulado Lavouras e Lavradores (Norte de Portugal), redigido três anos mais tarde. É, também, a primeira edição a fixar o texto definitivo, incluindo-se as anotações manuscritas feitas pelo autor.
Apresentação, edição e fixação de texto: Emília Nóvoa Faria e António Martins / Prefácio: Hermenegildo Fernandes
Esta obra de Alberto Sampaio tornou-se um clássico da historiografia portuguesa e, mesmo contando mais de um século de existência, mantém uma vitalidade inegável. Esta deve-se em muito a um dos seus traços mais originais, a opção de Sampaio por contar a história social em vez da tradicional narrativa política.
Esta edição da obra é a primeira que reúne num único volume a obra principal e o seu resumo, intitulado Lavouras e Lavradores (Norte de Portugal), redigido três anos mais tarde. É, também, a primeira edição a fixar o texto definitivo, incluindo-se as anotações manuscritas feitas pelo autor.
Apresentação, edição e fixação de texto: Emília Nóvoa Faria e António Martins / Prefácio: Hermenegildo Fernandes