António Sardinha - Ao Ritmo da Ampulheta - Crítica e Doutrina, 1925 [ .pdf ]
Coimbra, Lvmen - Empresa Nacional Editora.
[ Obra organizada pelo Autor, mas não completamente revista ]
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Nestes ensaios de Crítica e Doutrina, António Sardinha defende a tradição religiosa, política e cultural como base da identidade nacional portuguesa. Critica o individualismo, o liberalismo e as influências estrangeiras, valoriza a família e a ligação à terra. Exalta o papel da literatura e da poesia popular na renovação do espírito nacional, reabilita figuras históricas como D. João IV, D. João V e D. Miguel I, e considera essencial restaurar valores espirituais, históricos e educativos para superar a decadência e fortalecer a unidade de Portugal.
- Olhando o Caminho, Janeiro de 1923 (Prefácio, pp. XI-XXVII). Neste prefácio de "Ao Ritmo da Ampulheta", António Sardinha reflete sobre o papel da tradição religiosa e política na formação de Portugal, criticando o individualismo filosófico e o liberalismo. Relembra movimentos e figuras que resistiram à desagregação nacional desde o miguelismo até o início do século XX, defendendo a tradição como uma força dinâmica para renovar o país. Apesar das dificuldades históricas, expressa esperança na restauração dos valores espirituais e históricos como meio de fortalecer a identidade coletiva portuguesa.
- A Herança de Garrett, 1918. Analisa as diferenças entre o Romantismo francês e o português, destacando que o francês é marcado pelo intelectualismo clássico e pela desorganização sentimental, enquanto o português tem raízes medievais, líricas e populares, ligadas à tradição e à independência nacional. Sardinha valoriza o papel de Garrett e Herculano na renovação da poesia nacional, defendendo o retorno às origens e à autenticidade do povo português, e critica o ultra-romantismo e o centralismo político que afastaram Portugal de sua identidade. Sardinha exalta o trabalho de arqueólogos e folcloristas como fundamentais para preservar a alma coletiva e cumprir o “testamento de Garrett”, que consiste em restituir Portugal à posse de si mesmo, valorizando as suas raízes históricas e culturais.
- O problema da Vinculação. António Sardinha defende que a família, e não o indivíduo, é a base fundamental da sociedade. Para garantir a estabilidade e prosperidade da família, é essencial assegurar-lhe uma base económica sólida, o que só é possível através do sistema de vinculação (vínculos), que imobiliza parte do património familiar, impedindo a sua divisão e dispersão por herança. Destaca o rigor histórico de Xavier Cordeiro na análise das instituições vinculares, sublinhando a sua visão do Direito como expressão dinâmica das relações sociais e rejeitando abordagens abstratas. Sardinha defende que a restauração dos Vínculos deverá ser facultativa, adaptando-os à realidade económica atual, mas critica a liberdade de testar defendida pela Action française por ser alheia à tradição portuguesa. Termina com a exortação de preservar o património nacional como base da identidade e continuidade da Pátria.
- A tomada da Bastilha. António Sardinha critica a Revolução Francesa, considerando-a resultado de ideias abstratas de Rousseau e de influências estrangeiras, especialmente da Maçonaria e da Inglaterra. Argumenta que a Bastilha era mais um símbolo retórico do que uma verdadeira prisão de tirania, pois nela estavam apenas sete prisioneiros, a maioria por crimes comuns. Sardinha defende que a miséria do povo antes da Revolução foi exagerada e que o reinado de Luís XVI procurava reformas para melhorar a situação de França. A Revolução destruiu antigas formas de organização social e agravou a condição dos mais pobres, criando novas formas de opressão e burocracia.
- O 'oitavo-sacramento'. António Sardinha reflete sobre o papel espiritual da Realeza, defendendo que o poder real só cumpre a sua finalidade ao servir o povo e manter a ordem e a justiça, inspirado por tradições e valores morais. Critica o afastamento desse ideal nas monarquias modernas, que, ao perderem a dimensão espiritual, tornam-se irrelevantes e deixam de inspirar a confiança dos povos.
- A Cultura Clássica, 1917. António Sardinha considera que o romanismo e a Renascença não foram benéficos para Portugal, tendo introduzido desvios e perturbações no desenvolvimento nacional, ao invés de fortalecerem a identidade portuguesa. Apesar das críticas históricas, Sardinha defende a educação clássica como essencial para combater a decadência cultural e intelectual contemporânea, especialmente a perda do gosto literário e das capacidades lógicas. O autor argumenta que só uma educação humanista pode restaurar o pensamento claro e combater a superficialidade e confusão de ideias promovidas pelo parlamentarismo e pela retórica vazia. Sardinha destaca o contributo de Silva Gaio para a defesa do ensino clássico, sublinhando que a educação clássica deve estimular a originalidade e não a mera imitação, e lamenta que Gaio não tenha publicado uma obra completa sobre o tema. Sardinha defende que o ensino das humanidades deve incluir referências cristãs, como os Padres da Igreja, para promover um humanismo cristão e evitar o risco de descrença associado ao humanismo pagão da Renascença, considerando a revitalização das humanidades fundamental para o progresso cultural de Portugal.
- 1820, 1917 (ed. 1925) António Sardinha reflete acerca do movimento revolucionário de 1820, tratando as suas origens, influências e consequências. O dia 24 de agosto de 1820 tem sido apresentado como o do nascimento da Liberdade, coincidindo com o dia de São Bartolomeu, tradicionalmente associado ao Caos. Naquela data as tropas no Porto ergueram vivas subversivos em Santo Ovídio, iniciando-se uma trajetória que traria grandes mudanças e desafios ao país. É uma data fundamental para compreender os acontecimentos que moldaram o destino português nos séculos XIX e XX, refletindo persistentes ideias e influências.
- A energia nacional. António Sardinha defende aqui que a verdadeira força de Portugal reside na energia e tradição do seu povo, que deve superar o pessimismo e a má política através de uma renovada fé no legado histórico da nação.
- Nacionalismo Literário, 1918. António Sardinha exalta a relevância da obra de Afonso Lopes Vieira, em especial do seu livro "Ilhas de Bruma" no contexto do lirismo português, destacando a simplicidade poética enraizada na tradição popular e o combate ao cosmopolitismo e ao esteticismo superficial. Defende que a verdadeira poesia deve refletir a herança, a paisagem e as emoções do povo, sendo um elo entre passado e presente, capaz de reeducar a sensibilidade nacional e afirmar a identidade portuguesa através da arte.
- A 'Vila-Francada'. Analisa o contexto e o significado do movimento da 'Vila-Francada', que pôs fim à experiência liberal de 1820-1823. Descreve o ambiente de desordem, festividades e imitação estrangeira que se seguiu à revolução e destaca o papel da Maçonaria e das influências internacionais, especialmente espanholas, na preparação da revolução de 1820. Aponta a fragilidade do regime liberal, a instabilidade política e a crescente insatisfação popular. Com o regresso de D. João VI e a recusa de D. Carlota Joaquina em jurar a Constituição, a tensão aumentou, surgindo a 'Vila-Francada' como uma resposta à desordem liberal e a uma ameaça estrangeira. O movimento, liderado por D. Miguel, contou com amplo apoio popular e resultou na restauração dos “direitos inauferíveis” da monarquia. Sardinha sublinha que a contrarrevolução foi rapidamente capturada por elementos ligados ao liberalismo e à Maçonaria, o que explica o seu fracasso em consolidar um regime nacional e tradicional.
- No jardim da Raça, 1916. Este texto reflete sobre o livro Pão alheio de Luís de Almeida Braga, destacando a sua profunda ligação com a geração do autor e o conflito entre ação e pensamento. A obra é vista como um roteiro emocional, um compêndio de "exercícios espirituais", expressão de um novo misticismo, valorizando a tradição, a espiritualidade e o sentido de serviço coletivo, além de ressaltar o papel do autor como futuro novelista capaz de honrar a herança literária portuguesa. É neste texto que António Sardinha identifica o Integralismo Lusitano como "o filho de Ramires", personagem do romance A Ilustre Casa de Ramires, de Eça de Queirós.
- D. João V. António Sardinha procura reabilitar a imagem de D. João V, destacando o seu esforço na promoção das artes, ciências e educação, bem como nas obras públicas. Sardinha valoriza o uso de fontes documentais e testemunhos contemporâneos para fundamentar a sua análise, contrapondo-a à visão caricatural e superficial do rei. Sardinha procura mostrar que D. João V trabalhou pela grandeza do país e merece uma avaliação mais justa e equilibrada do seu legado.
- Consanguinidade e degenerescência. António Sardinha defende que a consanguinidade nas dinastias reais não é, por si só, causa inevitável de degenerescência, e que a hereditariedade do poder é um facto natural e histórico, contrariando argumentos republicanos baseados em exageros científicos e preconceitos.
- Conde de Monsaraz. António Sardinha apresenta o Conde de Monsaraz como um poeta profundamente ligado à tradição rural e à terra natal, que superou o parnasianismo ao incorporar elementos regionais do Alentejo, criando uma poesia autêntica e emotiva. Destaca-se a sua herança familiar de lavradores nobres e o compromisso com o bem comum, sendo considerado um exemplo de como a ligação à terra e aos antepassados pode gerar uma poesia verdadeiramente nacional: “Ele espiritualizou esse esforço. E, comunicando-lhe a alma da sua alma, deu-lhe a expressão das coisas eternamente moças”.
- Duas datas. António Sardinha reflete sobre dois momentos marcantes da história de Portugal, ambos ocorridos em Agosto: a conquista de Ceuta (21 de Agosto de 1415), que marcou o início da expansão ultramarina portuguesa, e a derrota em Alcácer-Quibir (4 de Agosto de 1578), de que resultou o desaparecimento do rei D. Sebastião e uma crise nacional. Para Sardinha essas datas simbolizam o auge e o declínio da segunda dinastia portuguesa.
- Velando as armas. O Integralismo Lusitano nasceu do amor à literatura e à cultura nacional, defendendo Sardinha que o Romantismo português, representado por Garrett e Herculano, resgatou as raízes populares e históricas do país, em oposição ao classicismo artificial e ao ultra-romantismo decadente. É aqui destacado que o nacionalismo da sua geração transformou uma motivação estética numa razão social e política, propondo a união entre literatura e política como caminho para restaurar a identidade nacional. O livro “Outro Mundo”, de Hipólito Raposo, é apontado como exemplo de um neo-romantismo equilibrado e comprometido com a ideia nacional.
- Super flumina Babylonis. António Sardinha defende que os problemas enfrentados pela Monarquia e pela Igreja em Portugal não resultaram da essência dessas instituições, mas sim da influência corruptora de ideias estrangeiras introduzidas pela Maçonaria. Na sequência do despotismo iluminista do marquês de Pombal, o Constitucionalismo e o Liberalismo continuaram a enfraquecer a Realeza e a Igreja: a Realeza foi submetida aos particulares e instáveis interesses das oligarquias partidárias, enquanto os líderes da Igreja se tornavam meros funcionários do Estado. Para Sardinha, a regeneração de Portugal exige que as essências tradicionais da Monarquia e da Igreja sejam repostas, libertando-as do ideologismo e das corrupções da Maçonaria.
- Mouzinho da Silveira. Texto cerca das reformas liberais introduzidas em Portugal por Mouzinho da Silveira, que António Sardinha critica por terem sido precipitadas e inadequadas à realidade portuguesa. As mudanças introduzidas foram baseadas na cópia de modelos estrangeiros e na negligência das tradições nacionais, resultando em consequências económicas, sociais e políticas muito negativas para o país, fragilizando as bases do desenvolvimento coletivo e da identidade nacional.
- A dor de Antero, 1924. António Sardinha analisa a complexidade filosófica e espiritual de Antero de Quental, destacando a sua influência nas ideias integralistas e o seu percurso entre o naturalismo científico, o pessimismo e a busca por uma síntese espiritualista. Longe de ser um mero adepto do cepticismo ou do pessimismo trágico, Antero é aqui apresentado como um pensador afirmativo, crítico da inteligência excessiva do seu tempo e movido por uma ânsia de verdade absoluta, aproximando-se da tradição católica no valor conferido ao sentimento moral e à impersonalidade. Sardinha argumenta que é essencial resgatar Antero de visões simplificadoras, reconhecendo nele uma figura apaixonada pela ação, pela certeza e pela superação das limitações naturalistas da época.
- El-Rei D. Miguel. António Sardinha apresenta D. Miguel I como legítimo rei de Portugal, injustamente caluniado e derrotado pelos liberais e pela influência estrangeira. Sardinha critica o liberalismo e a Maçonaria, valorizando as instituições tradicionais e a fidelidade dos miguelistas. Relata a perseguição sofrida por D. Miguel, o seu exílio e o contexto da sua capitulação em Évora-Monte, imposta pela Quádrupla Aliança. A queda do rei D. Miguel marcou o início da decadência nacional e o afastamento das verdadeiras raízes portuguesas.
- Fátima, 1917, Setembro. António Sardinha defende que as aparições de Fátima devem ser vistas como fenómenos suprassensíveis que desafiam o materialismo, mostrando que ciência e fé podem coexistir na busca pela compreensão do mistério humano e divino.
- Ao crepúsculo da Inteligência, 1917. António Sardinha critica a fundação do Ateneu Popular de Lisboa, alertando para o risco do “semi-intelectualismo” e da superficialidade cultural promovida pelas Universidades Livres. Defende que o ensino ao operariado deve valorizar a dignidade e o amor pela profissão, em vez de difundir ideias gerais e vagas. Conclui que a missão dos Ateneus Populares deve ser o ensino técnico e prático, adaptado ao mundo operário, para cumprir verdadeiramente a sua função educativa e social.
- D. João IV. António Sardinha defende o rei D. João IV como figura central na Restauração da independência de Portugal em 1640, destacando não só o seu papel diplomático e político, mas também a sua prudência e visão estratégica. Contesta visões negativas do monarca, valorizando a sua habilidade em reorganizar o país após décadas de domínio espanhol e sublinhando o seu contributo vital para a consolidação da monarquia e da identidade nacional portuguesa.
- 31 de Janeiro. Analisa o surgimento do regime da República em Portugal como uma promessa de reconciliação nacional e libertação das oligarquias, destacando as ilusões do municipalismo e o anti-parlamentarismo influenciados pelo exemplo suíço. Relata a frágil revolta de 31 de Janeiro, marcada pela falta de coesão e liderança, e reflete sobre o desencanto dos idealistas que sonharam com uma república nacional, cujo desfecho foi o isolamento e o silêncio dos seus principais defensores.
- A retirada para o Brasil. António Sardinha analisa a importância estratégica da retirada da corte portuguesa para o Brasil em 1807, argumentando que não foi um ato de pânico, mas sim uma decisão política ponderada diante das ameaças de Napoleão e da Inglaterra. Esta opção já havia sido considerada em ocasiões anteriores e que a perda do Brasil significaria o fim da independência portuguesa. Sardinha critica a visão sectária que classifica o episódio como fuga, defende a necessidade de restaurar a verdadeira História de Portugal e apela às novas gerações para que assumam a missão de reconstruir a unidade nacional.