NACIONALISMO E COLABORAÇÃO INTERNACIONAL
VI - QUE ATITUDE ASSUMIREMOS?
Diante do mapa-múndi, passámos em revista os rumos dos povos por entre as dificuldades desta hora aflitiva para a humanidade. Vimos como todos os países se erguem assumindo atitudes nacionalistas; observámos as dificuldades para a solução do problema do desarmamento; notámos os empecilhos que impedem a solução da crise económica; percebemos o mal-estar dos capitães de indústria e dos comerciantes honestos; sentimos as angústias da classe proletária. A questão dos "sem-trabalho" está de pé; os orçamentos nacionais desequilibrados; as balanças comerciais exprimindo o drama dos povos; tudo isso exercendo uma pressão fortíssima sobre as nações, inspiram-lhes como que uma ânsia de fuga a males irremediáveis, e essa fuga se efetua num sentido de regresso a si mesmas, de afirmação nacionalista.
Verificámos como o conceito de soberania nacional se anulou sob a ação da própria vontade geral de que ela provém, e como a autoridade se diluiu na água régia da liberdade. Contemplámos o fracasso das democracias, que deixaram de exprimir o sentido da marcha do mundo, a qual, efectivando-se sob o imperativo do desenvolvimento económico, deslocou a autoridade do Estado para os indivíduos e grupos de indivíduos, que agem à revelia dos governos. Apreciámos as desconfianças mútuas entre as nações e considerámos as desconfianças ainda maiores entre as forças representativas da produção. Concluímos, finalmente, que a situação de angústia e inquietação universais tem levado a humanidade a vislumbrar na autoridade do Estado a possibilidade de cerceamento de indébitas autoridades no campo económico. E, como um complemento dessa esperança, registámos a tendência dos povos para adotar uma política de fortíssimo nacionalismo.
Todo esse panorama nos demonstra que o mundo de hoje está volvendo os passos. Cada Nação está operando um recuo, à maneira dos tigres, para dar no futuro um bote definitivo contra a potência Supranacional, sem Pátria, sem Deus, sem piedade dos homens. O certo é que estão recuando. As nações querem bastar-se a si mesmas.
Querem cooperar menos. A atmosfera de desconfiança tolda os horizontes. O movimento de defesa se aguça.
VI - QUE ATITUDE ASSUMIREMOS?
Diante do mapa-múndi, passámos em revista os rumos dos povos por entre as dificuldades desta hora aflitiva para a humanidade. Vimos como todos os países se erguem assumindo atitudes nacionalistas; observámos as dificuldades para a solução do problema do desarmamento; notámos os empecilhos que impedem a solução da crise económica; percebemos o mal-estar dos capitães de indústria e dos comerciantes honestos; sentimos as angústias da classe proletária. A questão dos "sem-trabalho" está de pé; os orçamentos nacionais desequilibrados; as balanças comerciais exprimindo o drama dos povos; tudo isso exercendo uma pressão fortíssima sobre as nações, inspiram-lhes como que uma ânsia de fuga a males irremediáveis, e essa fuga se efetua num sentido de regresso a si mesmas, de afirmação nacionalista.
Verificámos como o conceito de soberania nacional se anulou sob a ação da própria vontade geral de que ela provém, e como a autoridade se diluiu na água régia da liberdade. Contemplámos o fracasso das democracias, que deixaram de exprimir o sentido da marcha do mundo, a qual, efectivando-se sob o imperativo do desenvolvimento económico, deslocou a autoridade do Estado para os indivíduos e grupos de indivíduos, que agem à revelia dos governos. Apreciámos as desconfianças mútuas entre as nações e considerámos as desconfianças ainda maiores entre as forças representativas da produção. Concluímos, finalmente, que a situação de angústia e inquietação universais tem levado a humanidade a vislumbrar na autoridade do Estado a possibilidade de cerceamento de indébitas autoridades no campo económico. E, como um complemento dessa esperança, registámos a tendência dos povos para adotar uma política de fortíssimo nacionalismo.
Todo esse panorama nos demonstra que o mundo de hoje está volvendo os passos. Cada Nação está operando um recuo, à maneira dos tigres, para dar no futuro um bote definitivo contra a potência Supranacional, sem Pátria, sem Deus, sem piedade dos homens. O certo é que estão recuando. As nações querem bastar-se a si mesmas.
Querem cooperar menos. A atmosfera de desconfiança tolda os horizontes. O movimento de defesa se aguça.
*
Qual deve ser a nossa atitude de povo jovem, de país que se apresenta ao capitalismo internacional como uma presa a ser disputada?
É fora de dúvida que o Brasil deve assumir uma atitude de franco nacionalismo. Temos chegado a um instante de profunda revisão de todos os valores, abandonando nossa longa posição passiva. Tratar de sermos o que somos. Com as nossas possibilidades, nosso carácter, com a consciência de nossas necessidades.
A questão é complexa, mas deve ser encarada firmemente. Temos de determinar, com absoluta precisão, até que ponto deve ir a nossa cooperação com os outros povos, e até que ponto devemos nos fechar, tirando de nós mesmos o de que carecemos para a nossa vida e a nossa prosperidade.
Há no terreno das ideias pontos de contacto entre todos os povos, como há, no terreno dos interesses materiais os impositivos de reciprocidade de tratamento que consultam a interesses mútuos.
Mas, tanto na esfera das ideias, como na dos negócios, cumpre examinarmos com muito cuidado a orientação que nos convém, como garantia de defesa e de independência nacionais.
O caso do Brasil é muito delicado e a nossa situação muito especial em face das dificuldades que o mundo atravessa.
Uma atitude de jacobinismo não nos fica bem, pois somos um povo que importa o braço e o capital e que ainda está importando os subsídios culturais indispensáveis ao trabalho de construção da nossa cultura própria.
Isso não quer dizer, porém, que devemos ir aceitando tudo como nos mandam.
A importação de ideias, de gente e de dinheiro deve submeter-se aos imperativos da nossa independência e dignidade nacional.
No tocante às ideias, devemos tomar as que tiverem carácter de universalidade, as que encerrarem verdades essenciais e normas de ações inerentes a todo o género humano. O liberalismo foi uma ideia universal no século passado; as formas do liberalismo é que variaram. Assim, hoje, podemos adotar uma ideia de Estado, desde que ela tenha caracter de universalidade, mas a forma, a estrutura institucional, devem ser profundamente brasileiras. Os princípios da ciência não têm Pátria. Um teorema de geometria ou uma lei química pertencem a todos os países. Os dogmas religiosos pertencem à humanidade. Assim, em política, estamos presos ao que temos de essencial, de humano, porém estamos presos, por outro lado, ao que temos de contingente, de nacional.
No referente à importação de massas humanas, devemos subordiná-la ao critério das conveniências nacionais. Se pudermos prescindir delas será muito melhor.
No relativo aos capitais, todo cuidado é pouco. As grandes empresas estrangeiras estão habituadas a entrar no Brasil como em uma colónia. Seus capitais estão cercados de garantias excessivas. As facilidades que lhes outorgamos são exageradas. Não temos tido a preocupação de nacionalizar os capitais. A reforma das leis nesse tocante é indispensável. E, quanto ao banqueirismo internacional que explora o trabalho do caboclo brasileiro, nossa atitude deve ser heróica, a fim de pormos termo a longas humilhações e sofrimentos.
Relativamente à importação de produtos manufaturados e de consumo, precisamos operar uma verdadeira revolução nacional.
O incremento do nosso comércio interno é o alicerce da nossa independência. Nossa extensão territorial nos coloca em circunstâncias privilegiadas. Si soubermos tirar partido disso, a nossa soberania estará salva.
Principalmente se tivermos em vista que, não somente temos capacidade de nos bastarmos a nós mesmos, como temos possibilidades — dada a extensão do nosso litoral e as dificuldades estratégicas que se oferecem a qualquer tropa que tenha a ousadia de nos incomodar — de assumirmos novamente, em face de nossos exploradores, a atitude de Tamandaré contra os navios ingleses no Prata, ou de Floriano, contra as ameaças estrangeiras.
É fora de dúvida que o Brasil deve assumir uma atitude de franco nacionalismo. Temos chegado a um instante de profunda revisão de todos os valores, abandonando nossa longa posição passiva. Tratar de sermos o que somos. Com as nossas possibilidades, nosso carácter, com a consciência de nossas necessidades.
A questão é complexa, mas deve ser encarada firmemente. Temos de determinar, com absoluta precisão, até que ponto deve ir a nossa cooperação com os outros povos, e até que ponto devemos nos fechar, tirando de nós mesmos o de que carecemos para a nossa vida e a nossa prosperidade.
Há no terreno das ideias pontos de contacto entre todos os povos, como há, no terreno dos interesses materiais os impositivos de reciprocidade de tratamento que consultam a interesses mútuos.
Mas, tanto na esfera das ideias, como na dos negócios, cumpre examinarmos com muito cuidado a orientação que nos convém, como garantia de defesa e de independência nacionais.
O caso do Brasil é muito delicado e a nossa situação muito especial em face das dificuldades que o mundo atravessa.
Uma atitude de jacobinismo não nos fica bem, pois somos um povo que importa o braço e o capital e que ainda está importando os subsídios culturais indispensáveis ao trabalho de construção da nossa cultura própria.
Isso não quer dizer, porém, que devemos ir aceitando tudo como nos mandam.
A importação de ideias, de gente e de dinheiro deve submeter-se aos imperativos da nossa independência e dignidade nacional.
No tocante às ideias, devemos tomar as que tiverem carácter de universalidade, as que encerrarem verdades essenciais e normas de ações inerentes a todo o género humano. O liberalismo foi uma ideia universal no século passado; as formas do liberalismo é que variaram. Assim, hoje, podemos adotar uma ideia de Estado, desde que ela tenha caracter de universalidade, mas a forma, a estrutura institucional, devem ser profundamente brasileiras. Os princípios da ciência não têm Pátria. Um teorema de geometria ou uma lei química pertencem a todos os países. Os dogmas religiosos pertencem à humanidade. Assim, em política, estamos presos ao que temos de essencial, de humano, porém estamos presos, por outro lado, ao que temos de contingente, de nacional.
No referente à importação de massas humanas, devemos subordiná-la ao critério das conveniências nacionais. Se pudermos prescindir delas será muito melhor.
No relativo aos capitais, todo cuidado é pouco. As grandes empresas estrangeiras estão habituadas a entrar no Brasil como em uma colónia. Seus capitais estão cercados de garantias excessivas. As facilidades que lhes outorgamos são exageradas. Não temos tido a preocupação de nacionalizar os capitais. A reforma das leis nesse tocante é indispensável. E, quanto ao banqueirismo internacional que explora o trabalho do caboclo brasileiro, nossa atitude deve ser heróica, a fim de pormos termo a longas humilhações e sofrimentos.
Relativamente à importação de produtos manufaturados e de consumo, precisamos operar uma verdadeira revolução nacional.
O incremento do nosso comércio interno é o alicerce da nossa independência. Nossa extensão territorial nos coloca em circunstâncias privilegiadas. Si soubermos tirar partido disso, a nossa soberania estará salva.
Principalmente se tivermos em vista que, não somente temos capacidade de nos bastarmos a nós mesmos, como temos possibilidades — dada a extensão do nosso litoral e as dificuldades estratégicas que se oferecem a qualquer tropa que tenha a ousadia de nos incomodar — de assumirmos novamente, em face de nossos exploradores, a atitude de Tamandaré contra os navios ingleses no Prata, ou de Floriano, contra as ameaças estrangeiras.
*
O critério estatístico é indispensável entre nós. É a base do conhecimento das realidades da Nação.
Nunca atravessámos um período histórico em que tivéssemos tanta necessidade de nos conhecermos, como agora.
A questão tarifaria, por exemplo, em que se enfrentam hostilmente nossa indústria e nossa lavoura, deve ser estudada sob um critério de perfeito conhecimento das realidades nacionais. Uma nação não é livre-cambista, ou protecionista, de uma maneira sistemática. Uma nação, que possui uma doutrina política superior, resolve cada questão pelo critério dos supremos interesses nacionais.
Nunca atravessámos um período histórico em que tivéssemos tanta necessidade de nos conhecermos, como agora.
A questão tarifaria, por exemplo, em que se enfrentam hostilmente nossa indústria e nossa lavoura, deve ser estudada sob um critério de perfeito conhecimento das realidades nacionais. Uma nação não é livre-cambista, ou protecionista, de uma maneira sistemática. Uma nação, que possui uma doutrina política superior, resolve cada questão pelo critério dos supremos interesses nacionais.
*
Urge, no Brasil, a afirmação da nossa personalidade de povo. Defesa contra quaisquer gestos de absorção dos grandes países que mantêm connosco relações comerciais ou culturais. Defesa contra o cosmopolitismo, o snobismo, o internacionalismo comunista e o internacionalismo capitalista. Esse deve ser o nosso nacionalismo.
Um nacionalismo sadio, que não rejeite sem exame, nem aceite sem perfeita compreensão das consequências que pode redundar uma atitude de passividade.
Um nacionalismo sadio, que não rejeite sem exame, nem aceite sem perfeita compreensão das consequências que pode redundar uma atitude de passividade.
[ Plínio Salgado in O Sofrimento Universal, 2ª edição (Outubro de 1934), Rio de Janeiro, Livraria José Olympio, 1934, pp. 157-163.]
[negritos acrescentados]
[negritos acrescentados]
Relacionado