A Ideia de “Quinto Império” em António Sardinha
Filipe não cingia a coroa dos Avis unicamente. Herdava-lhes e executava-lhes a ambição imperialista, que a esfera armilar de D. Manuel sedutoramente simboliza. Império de Cristo, Império do Ocidente, ou Quinto Império da religião sebástica, é o tema permanente, como que o leit-motiv eterno da epopeia de Camões.
- António Sardinha
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A Ideia de “Quinto Império” em António Sardinha
O Quinto Império, em António Sardinha, é a expressão da missão histórica, espiritual e universalista de Portugal (e da Península Ibérica), fundada num mito nacional, renovada pela esperança messiânica e concretizada numa aliança peninsular que visa restaurar o papel civilizacional do mundo ibérico. Trata-se de uma visão universalista que une tradição, mito e projeto de futuro, contrapondo-se ao nacionalismo fechado e ao cosmopolitismo do materialismo moderno.
Uma análise da missão nacional e universalista de Portugal e da Península Ibérica
Introdução. O conceito de Quinto Império ocupa um lugar central no pensamento de António Sardinha, integrando-se numa tradição intelectual portuguesa que vê a história nacional não apenas como uma sucessão de factos, mas como o cumprimento de uma missão providencial. Nesta perspetiva, o Quinto Império surge como expressão máxima do destino português, articulando dimensões míticas, espirituais e políticas. A sua relevância transcende o plano nacional, projetando-se como resposta à crise da civilização ocidental e propondo uma renovação do papel da Península Ibérica no mundo. Este artigo propõe-se analisar os principais eixos da ideia do Quinto Império em António Sardinha, tal como aparecem desenvolvidos nas suas obras e intervenções, sublinhando a centralidade do mito, as suas raízes proféticas, o universalismo peninsular, a crítica ao individualismo moderno e a valorização do dualismo político luso-espanhol.
O Quinto Império como Mito Nacional e Missão Universal. Para António Sardinha, o Quinto Império nasce do mito fundador português, especialmente do “milagre de Ourique”. Sardinha não se detém na comprovação histórica do evento, antes sublinha a sua função como mito agregador e mobilizador da consciência nacional. O milagre de Ourique constitui-se, assim, como um símbolo fundador, dotado de profundo significado coletivo, cuja eficácia reside no seu valor social e psicológico. Este mito não é encarado como ficção ou utopia, mas como expressão de uma vontade coletiva e de uma esperança. No entendimento de Sardinha, a crença no milagre de Ourique foi decisiva para forjar a identidade portuguesa, alimentando a confiança num destino próprio e sustentando o país em momentos de crise. O Quinto Império, enquanto mito nacional, configura-se, deste modo, como a missão histórica de Portugal, conferindo-lhe uma vocação de grandeza e de permanência.
Raízes Místicas e Proféticas. O Quinto Império articula-se com a tradição messiânica portuguesa, materializada no Sebastianismo e nas profecias do Bandarra. Estas manifestações são entendidas por Sardinha como revivescências atávicas da “religião da Esperança”, em que se deposita a fé na sobrevivência de Portugal e na realização de uma missão civilizadora. O Sebastianismo, longe de ser visto como resíduo de irracionalidade, é valorizado enquanto virtude do temperamento nacional, fonte de energia espiritual em períodos de adversidade e decadência. O mito de Ourique, as profecias do Bandarra e o culto do Encoberto alimentam a convicção de que Portugal detém um papel singular na história, o de instaurar uma nova ordem espiritual e social. A dimensão profética do Quinto Império liga-se, assim, à tradição de um povo que interpreta a sua história como cumprimento de promessas divinas e portador de uma vocação redentora.
Universalismo Peninsular. António Sardinha expande a ideia do Quinto Império para além do quadro estritamente nacional, propondo um “supernacionalismo hispânico” ou “Império do Ocidente”, unindo Portugal e Espanha numa missão comum. Rejeitando o antagonismo histórico entre os dois países, Sardinha argumenta que a força da Península Ibérica reside num harmonioso e cooperativo dualismo político. O paralelismo entre Portugal e Espanha é considerado a chave do sucesso das suas epopeias históricas, nomeadamente durante o período da Dinastia de Avis e da Expansão. Nesta perspectiva, o hispanismo não implica a anulação das individualidades nacionais, antes as conjuga num projeto de sentido universalista. Sardinha rejeita o materialismo cosmopolita que, em nome de uma fraternidade universal, visa a dissolução e fusão das nações e dos estados. Ao cosmopolitismo, opõe Sardinha o universalismo peninsular criador de nações.
O Quinto Império como Futuro e Atualização. O Quinto Império, na leitura de Sardinha, não se reduz a uma memória gloriosa ou a uma utopia irrealizável, constituindo uma tarefa a realizar, atualizando o espírito nacional e peninsular. Sardinha defende que a sobrevivência e o renascimento de Portugal e de Espanha dependem da renovação da fé no seu destino histórico, o que implica a restauração do universalismo católico e da cooperação entre os povos ibéricos. A dissipação da crença no mito fundador é associada à perda do sentido coletivo e às decadências nacionais. Por isso, Sardinha advoga a necessidade de regressar ao estado de espírito que animou as grandes realizações do passado, tornando a atualização do Quinto Império um imperativo para enfrentar as adversidades do presente e garantir a continuidade histórica.
Crítica ao Individualismo e ao Materialismo. Um dos eixos centrais do pensamento de António Sardinha consiste na crítica ao individualismo e ao materialismo que dominaram a Europa após o século XVII, especialmente após a derrocada do ideal universalista da Cristandade em Vestfália. Sardinha opõe ao moderno modelo europeu, centrado no indivíduo e na conquista do relativo, o ideal do Quinto Império, fundado na pessoa e na missão espiritual. Para Sardinha, a decadência europeia e peninsular resulta do abandono do universalismo cristão, conduzindo ao enfraquecimento das nações. O Quinto Império surge, neste contexto, como resposta regeneradora, capaz de restituir à civilização ocidental o seu fundamento espiritual e a sua vocação universal.
Dualismo Peninsular versus Unitarismo. Sardinha rejeita explicitamente a unificação política da Península Ibérica, defendendo o dualismo como condição essencial para o sucesso e a grandeza dos povos ibéricos. O dualismo político – a existência de dois Estados e de duas dinastias – é apresentado como garantia do interesse comum e do equilíbrio peninsular. Para Sardinha, a “amizade peninsular” deve substituir a miragem do unitarismo ibérico, pois só a cooperação, e não a fusão, permite preservar a riqueza das individualidades nacionais e cumprir a missão universalista da Península. O fracasso da monarquia dualista de Filipe II e as consequências negativas da oposição sistemática entre Portugal e Espanha são analisados como exemplos dos obstáculos à realização do Quinto Império. A aliança peninsular, e não a união, é vista como o meio adequado de evitar a absorção e de robustecer a força nacional, assegurando simultaneamente a projeção universal do mundo ibérico.
Conclusão. Fundado no valor simbólico do mito de Ourique, alimentado pelas raízes proféticas do Sebastianismo e do Bandarra, e projetado num ideal de supernacionalismo hispânico, o Quinto Império propõe-se como resposta à crise do Ocidente. Ao rejeitar o individualismo, o materialismo e o unitarismo, Sardinha defende o dualismo peninsular e a cooperação como vias para a renovação do espírito nacional e para a restauração do papel civilizacional do mundo ibérico. Trata-se, assim, de uma síntese que valoriza a continuidade das tradições fundadoras, a esperança messiânica e a abertura universalista, orientando o futuro à luz de uma vocação coletiva e de uma missão superior.
O Quinto Império como Mito Nacional e Missão Universal. Para António Sardinha, o Quinto Império nasce do mito fundador português, especialmente do “milagre de Ourique”. Sardinha não se detém na comprovação histórica do evento, antes sublinha a sua função como mito agregador e mobilizador da consciência nacional. O milagre de Ourique constitui-se, assim, como um símbolo fundador, dotado de profundo significado coletivo, cuja eficácia reside no seu valor social e psicológico. Este mito não é encarado como ficção ou utopia, mas como expressão de uma vontade coletiva e de uma esperança. No entendimento de Sardinha, a crença no milagre de Ourique foi decisiva para forjar a identidade portuguesa, alimentando a confiança num destino próprio e sustentando o país em momentos de crise. O Quinto Império, enquanto mito nacional, configura-se, deste modo, como a missão histórica de Portugal, conferindo-lhe uma vocação de grandeza e de permanência.
Raízes Místicas e Proféticas. O Quinto Império articula-se com a tradição messiânica portuguesa, materializada no Sebastianismo e nas profecias do Bandarra. Estas manifestações são entendidas por Sardinha como revivescências atávicas da “religião da Esperança”, em que se deposita a fé na sobrevivência de Portugal e na realização de uma missão civilizadora. O Sebastianismo, longe de ser visto como resíduo de irracionalidade, é valorizado enquanto virtude do temperamento nacional, fonte de energia espiritual em períodos de adversidade e decadência. O mito de Ourique, as profecias do Bandarra e o culto do Encoberto alimentam a convicção de que Portugal detém um papel singular na história, o de instaurar uma nova ordem espiritual e social. A dimensão profética do Quinto Império liga-se, assim, à tradição de um povo que interpreta a sua história como cumprimento de promessas divinas e portador de uma vocação redentora.
Universalismo Peninsular. António Sardinha expande a ideia do Quinto Império para além do quadro estritamente nacional, propondo um “supernacionalismo hispânico” ou “Império do Ocidente”, unindo Portugal e Espanha numa missão comum. Rejeitando o antagonismo histórico entre os dois países, Sardinha argumenta que a força da Península Ibérica reside num harmonioso e cooperativo dualismo político. O paralelismo entre Portugal e Espanha é considerado a chave do sucesso das suas epopeias históricas, nomeadamente durante o período da Dinastia de Avis e da Expansão. Nesta perspectiva, o hispanismo não implica a anulação das individualidades nacionais, antes as conjuga num projeto de sentido universalista. Sardinha rejeita o materialismo cosmopolita que, em nome de uma fraternidade universal, visa a dissolução e fusão das nações e dos estados. Ao cosmopolitismo, opõe Sardinha o universalismo peninsular criador de nações.
O Quinto Império como Futuro e Atualização. O Quinto Império, na leitura de Sardinha, não se reduz a uma memória gloriosa ou a uma utopia irrealizável, constituindo uma tarefa a realizar, atualizando o espírito nacional e peninsular. Sardinha defende que a sobrevivência e o renascimento de Portugal e de Espanha dependem da renovação da fé no seu destino histórico, o que implica a restauração do universalismo católico e da cooperação entre os povos ibéricos. A dissipação da crença no mito fundador é associada à perda do sentido coletivo e às decadências nacionais. Por isso, Sardinha advoga a necessidade de regressar ao estado de espírito que animou as grandes realizações do passado, tornando a atualização do Quinto Império um imperativo para enfrentar as adversidades do presente e garantir a continuidade histórica.
Crítica ao Individualismo e ao Materialismo. Um dos eixos centrais do pensamento de António Sardinha consiste na crítica ao individualismo e ao materialismo que dominaram a Europa após o século XVII, especialmente após a derrocada do ideal universalista da Cristandade em Vestfália. Sardinha opõe ao moderno modelo europeu, centrado no indivíduo e na conquista do relativo, o ideal do Quinto Império, fundado na pessoa e na missão espiritual. Para Sardinha, a decadência europeia e peninsular resulta do abandono do universalismo cristão, conduzindo ao enfraquecimento das nações. O Quinto Império surge, neste contexto, como resposta regeneradora, capaz de restituir à civilização ocidental o seu fundamento espiritual e a sua vocação universal.
Dualismo Peninsular versus Unitarismo. Sardinha rejeita explicitamente a unificação política da Península Ibérica, defendendo o dualismo como condição essencial para o sucesso e a grandeza dos povos ibéricos. O dualismo político – a existência de dois Estados e de duas dinastias – é apresentado como garantia do interesse comum e do equilíbrio peninsular. Para Sardinha, a “amizade peninsular” deve substituir a miragem do unitarismo ibérico, pois só a cooperação, e não a fusão, permite preservar a riqueza das individualidades nacionais e cumprir a missão universalista da Península. O fracasso da monarquia dualista de Filipe II e as consequências negativas da oposição sistemática entre Portugal e Espanha são analisados como exemplos dos obstáculos à realização do Quinto Império. A aliança peninsular, e não a união, é vista como o meio adequado de evitar a absorção e de robustecer a força nacional, assegurando simultaneamente a projeção universal do mundo ibérico.
Conclusão. Fundado no valor simbólico do mito de Ourique, alimentado pelas raízes proféticas do Sebastianismo e do Bandarra, e projetado num ideal de supernacionalismo hispânico, o Quinto Império propõe-se como resposta à crise do Ocidente. Ao rejeitar o individualismo, o materialismo e o unitarismo, Sardinha defende o dualismo peninsular e a cooperação como vias para a renovação do espírito nacional e para a restauração do papel civilizacional do mundo ibérico. Trata-se, assim, de uma síntese que valoriza a continuidade das tradições fundadoras, a esperança messiânica e a abertura universalista, orientando o futuro à luz de uma vocação coletiva e de uma missão superior.
António Sardinha rejeitou a unificação política peninsular. Eis algumas passagens significativas:
- Sobre o dualismo como condição do sucesso peninsular: “O dualismo político – dois Estados e duas Dinastias – garantiu o interesse comum da Península ao longo dos séculos, sendo o paralelismo entre ambos o segredo para o sucesso das suas epopeias históricas.” (Sardinha valoriza o dualismo, não a fusão política, como base da grandeza peninsular)
- Contra o unitarismo ibérico: “Que a truculenta e impossível miragem do unitarismo ibérico seja substituída por uma ideia firme de ‘amizade peninsular’!” (Aqui, Sardinha rejeita explicitamente a ideia de unificação política, chamando-a de ‘miragem impossível’)
- Sobre a cooperação e não fusão: “A fórmula de amanhã em política exterior há-de ser, sem dúvida, não união ibérica, mas aliança peninsular.” (Sardinha distingue claramente entre ‘união’ (fusão política) e ‘aliança’ (cooperação entre Estados soberanos))
- Sobre o perigo do centralismo: “Que o velho paralelismo de Quinhentos, enriqueça-o agora a opulenta e decisiva colaboração da América-Hispânica – encarnação sorridente de uma nova idade do mundo! … O conceito de ‘Espanha’, derivado de ‘Hispania’, traduzindo uma significação geográfica, traduzia então igualmente um estado de consciência colectiva.” (Sardinha defende a colaboração e o paralelismo, não a fusão centralizadora)
- Sobre o fracasso da monarquia dualista: “…o dualismo restaurado em 1640 foi restaurado sobre a ideia de oposição à Espanha, ao contrário do dualismo intentado e efectivado pela casa de Avis. … O que se salienta são as condições desgraçadas em que Portugal ficou, como igualmente ficou a Espanha. A conspiração europeia tramada contra a supremacia da Península atingiu conjuntamente as duas pátrias peninsulares.” (Sardinha mostra que a tentativa de fusão dinástica foi desastrosa e que o equilíbrio dualista é preferível)
- Sobre o perigo da absorção: “Contra a aliança espanhola apenas surge a alguns o espectro fugaz da união-ibérica. Pois bem: nós afirmamos que a aliança espanhola é também o único meio de evitarmos a absorção pela Espanha, por isso mesmo que é o meio único de robustecer a nossa força nacional.” (A aliança, e não a unificação, é o caminho para evitar a perda da identidade portuguesa)
- Em síntese, para António Sardinha, o Quinto Império só pode realizar-se com a manutenção da individualidade nacional de Portugal e Espanha, numa relação de cooperação e não de fusão política. A unificação peninsular é vista como um obstáculo, pois anularia a riqueza do dualismo e a missão universalista que ele atribui à Península Ibérica.
Referências
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