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Évora-Monte

António Sardinha
Foi em 26 de Maio de 1834 que sobre a colina de Évora-Monte se desenlaçou um dos maiores dramas da nossa história. Debaixo do grande céu alentejano, teve ali o seu epílogo uma luta fratricida que se resolveu para nós em consequências muito mais graves que as de uma já de si ensanguentada impugnação dinástica. As forças negativas que de longe vinham preparando a ruína da pátria tradicional encontraram em Évora-Monte o facto definitivo que lhe consumou a obra de dissolução. Não era D. Pedro quem vencia naquela hora desesperada em que, por acção das armas estrangeiras, a causa de Portugal inteiro se via obrigada a ceder diante de um princípio adversário por natureza e fim às aspirações seculares da nacionalidade. Quem vencia era o internacionalismo revolucionário, meio disfarçado no sofisma da monarquia parlamentar, mas para já preparar o salto que logicamente o havia de conduzir à aventura feliz da Rotunda.

Não tomemos a guerra civil, a que a convenção de Évora-Monte trouxe um desfecho trágico, no simples significado de uma simples questão sucessorial. Procurêmos-lhe bem o fundo e logo se reconhecerá que as razões íntimas que a provocaram e sustentaram se inserem todas na vasta conspiração europeia que tendia de novo ao alastramento das ideias saídas da Revolução. D. Pedro é apenas um pretexto, servindo optimamente no seu romantismo exaltado de «emancipador dos povos» ao plano tenebroso e paciente dos clubes secretos. Por outro lado, D. Miguel encarnava a resistência admirável do instinto colectivo, que se recuperara do antigo adormecimento na insurreição geral do país contra os franceses, e que, cheio das suas virtudes nativas, se dispunha agora a não consentir que se errasse outra vez o nosso destino histórico.

As instituições de um povo são sempre filhas da sua experiência, correspondem a uma criação demorada e de certo modo inconsciente do seu passado. Pombal falseara as nossas, abastardando-as com o absolutismo teórico do século XVIII. Já antes disso as esplêndidas aptidões municipalistas da nossa raça se tinham amordaçado violentamente pela influência excessiva que o direito romano exerceu na orientação do Estado português. Como reacção operada no conhecimento directo das nossas fontes de riqueza, o reinado de D. Maria I, tão denegrido pela calúnia sectária, marca um começo notável de revivescência nacional. São os naturalistas da Academia que a preparam activamente, elaborando memórias notáveis sobre as possibilidades económicas do país. São as bolsas-de-estudo instituídas pela Rainha e graças às quais lá fora se especializam competências que serão de aproveitar. Caminhava-se assim para um regresso à linha suspensa do nosso natural desenvolvimento histórico. Não o permitiram, porém, as invasões, a despeito do belo esforço criador que num ponto ou noutro é ainda a regência do Príncipe do Brasil. E quando, vencido Napoleão, nós nos preparávamos para nos reorganizarmos de vez e com segurança, o Liberalismo quebra a unidade moral da pátria e lança-nos na carreira funesta da perdição.

Uma política de abstracções, uma política de ideólogos e aprioristas se pretendeu impor – e se impôs, afinal, à conformação hereditária da nacionalidade. Enganam-se os que supõem o movimento que as Côrtes Gerais de 1828 consagraram na pessoa de D. Miguel I como uma sobrevivência exasperada do Absolutismo decaído. Pelo contrário, esse movimento procura expurgar das nossas instituições os exageros cesaristas de Pombal e restituí-las quanto possível à sua verdadeira pureza. D. Miguel foi aclamado pelo voto unânime da Nação que reconquistava assim o seu meio vital pervertido. Quando se nos invoque a Carta outorgada pelo Imperador, lembrêmo-nos de que só por um despotismo sem nome é que ela se introduziu no país, que nunca se identificou com o seu espírito geométrico e fora de toda a realidade. Verdadeiro «Acto constitucional» – se a expressão se admite em sentido diverso do que geralmente se lhe atribui –, nas referidas côrtes de 1828 se confirmou e robusteceu o velho pacto fundamental da nacionalidade e pela boca dos representantes das vilas se ressurgiu um momento a energia fecunda que inspirara outrora os períodos mais altos da nossa história.

Ninguém esqueceu ainda aquelas páginas de Taine em prefácio a L’Ancien régime, quando o filósofo, a propósito de constituições, nos observa que a forma social e política na qual um povo se enquadra e quer permanecer não depende do seu arbítrio, mas do seu carácter e do seu passado. Já Le Play nos fala da "constituição essencial" à vida das sociedades e de que as outras, as constituições escritas, deveriam ser somente o reconhecimento. A jornada tão desgraçadamente concluída em Évora-Monte, a ter-se continuado, serviria para demonstrar a verdade desses ensinamentos. Contra uma liberdade metafísica, girando no vago das mais vagas teorias, nós opusemos então o conjunto humano e vivido das nossas liberdades tradicionais – liberdades concelhias e liberdades corporativas –, que hoje a sociologia reabilita como sendo a regra mais eficaz para a boa coordenação das necessidades públicas. E não se me diga que a corrente constitucionalista que agitava a Europa inteira nos coagia inexoravelmente à aceitação de um Cartismo irresponsável e despido de raízes na nossa alma colectiva. Leiam a admirável lei de
4 de Junho de 1824 e lá acharão as bases em que se poderia firmar uma reforma sensata nas direcções superiores do Estado, sem alterar os quadros sociais em que a nacionalidade se repousava.

O que é interessante é que em França, por alturas de 1822, mal nós acabávamos de dar o primeiro golpe fundo na organização secular do nosso país, Royer-Collard, tocando com o dedo na chaga da monarquia parlamentar, defendia deste modo um projecto de descentralização que apresentara à câmara dos deputados: «Nous avons vu la vieille société périr, et avec elle cette foule d'institutions domestiques et de magistratures indépendantes, qu'elle portait dans son sein, faisceaux puissants des droits privés, vraies républiques dans la monarchie.» E Royer-Collard, pondo em relevo a feição descentralizadora do verdadeiro, do puro princípio monárquico, terminava com uma frase que é a condenação para sempre de toda a experiência constitucionalista, de que só
resultou o descrédito dos reis e a quebra crescente da dignidade dos povos: «Nous sommes devenus un peuple d'administrés sous la main de fonctionnaires irresponsables.»

As palavras de Royer-Collard contêm em si o retrato vivo da nacionalidade portuguesa, ao empreender o esforço que a alevantaria vigorosamente para uma nova época de prosperidade e respeito, se a força das armas estrangeiras e o advento de utopias mentirosas a não arrastassem ao calvário inglório, mas dignificado, de Évora-Monte.

Não foi apenas um príncipe o vencido naquela hora desesperada! Foi uma nação inteira que ali padeceu vexame e sacrifício para só bem tarde sentir, para lá dos horrores da sua agonia, o horizonte encher-se de um alvoroço de esperança redentora. Possa torná-lo luz plena a inflamada campanha nacionalista em que a mocidade da nossa terra assume posições e se adestra com firmeza para os combates decisivos! No sangue de todos nós ergue-se a voz dos Mortos indicando o único caminho que levará à salvação da pátria caída na mais vil das almoedas. Porque chegou o instante de optarmos, segundo o neto de Renan, pelo partido dos nossos avós contra o partido dos nossos pais, partiremos contentes do mundo se connosco houvermos fechado o parêntesis aberto em Évora-Monte. E o epitáfio da nacionalidade volver-se-á assim num grito soberano de ressurreição.


[ negritos acrescentados ]
Évora-Monte [ 1834], In Na Feira dos Mitos - Ideias e Factos, 1926.
​​...nós não levantaríamos nem o dedo mínimo, se salvar Portugal fosse salvar o conúbio apertado de plutocratas e arrivistas em que para nós se resumem, à luz da perfeita justiça, as "esquerdas" e as "direitas"!

​​
- António Sardinha (1887-1925) - 
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