António Sardinha e o Iberismo
- Acusação Contestada
A República Portuguesa é de raiz iberista e dessa mancha vergonhosa não há barrelas que a possam lavar.
- Manuel Galvão
«Até a bandeira da sua república... é bandeira de traição — a bandeira da União Ibérica.»
- Óscar Paxeco (Fausto Fontes)
- Manuel Galvão
«Até a bandeira da sua república... é bandeira de traição — a bandeira da União Ibérica.»
- Óscar Paxeco (Fausto Fontes)
À maneira de prefácio, por Manuel de Bettencourt e Galvão
Alberto Franco Nogueira, antigo cronista político-literário de O Diabo, e posteriormente ministro da República durante o Estado Novo de Oliveira Salazar, no livro As Crises e os Homens (Ática, 1971), tentou diminuir a figura e a obra de António Sardinha, atribuindo-lhe a defesa do Iberismo. Neste texto "à maneira de prefácio" ao volume de Acusação Contestada, no qual se reunem artigos desfazendo os erros e sofismas da argumentação de Franco Nogueira, e o depoimento de mais de cinquenta personalidades, Manuel Galvão documenta a posição do Integralismo Lusitano e de António Sardinha face aos diversos processos de traição à existência de um Portugal livre e independente e em especial ao Iberismo defendido por republicanos e maçónicos.
Manuel Galvão discute e critica as ideias de união ou federação entre Portugal e Espanha sempre rejeitadas pelos integralistas. São citados exemplos de obras e de conferências que documentam o iberismo presente na origem da República Portuguesa, mostrando que muitos dos seus líderes defendiam uma união política entre os dois países. Galvão relata também episódios da luta monárquica, como a tentativa de restauração da Monarquia em 1919, e o exílio de António Sardinha, onde manteve viva e aprofundou a ideia de uma aliança peninsular baseada no equilíbrio e respeito mútuo entre as tradições de Portugal e Espanha. O texto conclui defendendo o papel do Integralismo Lusitano na preservação da independência nacional e criticando as tentativas de associar o movimento ao iberismo, reafirmando o patriotismo e a visão profética de Sardinha para o futuro de Portugal
Manuel Galvão discute e critica as ideias de união ou federação entre Portugal e Espanha sempre rejeitadas pelos integralistas. São citados exemplos de obras e de conferências que documentam o iberismo presente na origem da República Portuguesa, mostrando que muitos dos seus líderes defendiam uma união política entre os dois países. Galvão relata também episódios da luta monárquica, como a tentativa de restauração da Monarquia em 1919, e o exílio de António Sardinha, onde manteve viva e aprofundou a ideia de uma aliança peninsular baseada no equilíbrio e respeito mútuo entre as tradições de Portugal e Espanha. O texto conclui defendendo o papel do Integralismo Lusitano na preservação da independência nacional e criticando as tentativas de associar o movimento ao iberismo, reafirmando o patriotismo e a visão profética de Sardinha para o futuro de Portugal
À maneira de prefácio
Ao recordar na conferência feita na Liga Naval Portuguesa, em 23 de Março de 1925 [1], o primeiro ato público do Integralismo Lusitano, dizia Hipólito Raposo: «Assim se juntaram os oito nomes que aparecem no rosto da «Nação Portuguesa», em 8 de Abril de 1914.» Um desses oito era precisamente António Sardinha que o seu fraterno companheiro de combate recordará de maneira bem expressiva. «António Sardinha realizava então, entre nós todos, o mais vivo paradoxo, era tradicionalista, tinha no mais alto grau o culto do lar e da família, professava e justificava a necessidade da nobreza, era municipalista, regionalista, e o sentido dos seus melhores versos de então acusava uma aspiração nova, a fé na virtude secreta da nossa gente.
«O seu entusiasmo republicano era, portanto, superficial e representava mais um protesto contra a corrupção dos costumes políticos da Monarquia do que uma convicção intelectual.
«Ser republicano afigurava-se-lhe naquele tempo a atitude mais digna para um bom português, razão bastante para que só mereça louvor a sua sinceridade.» [2]
António Sardinha que depois de concluída a sua formatura em Direito abandonara Coimbra no Verão de 1911, mantivera com os companheiros de curso e seus amigos fiéis estreitas relações, iria reunir-se com dois deles — Hipólito Raposo e Alberto Monsaraz — em Setembro de 1913, para preparar o lançamento da revista Nação Portuguesa, arauto do movimento integralista.
Durante esses dois anos, António Sardinha estudara, meditara e assistira com assombrada angústia ao desenvolvimento da balbúrdia sanguinolenta da síntese profética de Eça de Queirós, em que se traduzira a implantação do regime senhor dos destinos do país a partir de 5 de Outubro de 1910.
Com a coragem e a retidão mental que são seu timbre, corta definitivamente com o ideário democrático-maçónico e abraça totalmente e com ardente entusiasmo os princípios monárquicos tradicionais, raízes e alicerces da Pátria [3].
Essa nobre e dignificante revisão de ideias que lhe cortava aliás todas as possibilidades de uma carreira fácil na administração pública, nunca mais lhe será perdoada - mesmo para além da morte — pelos escravos da Liberdade e pelos estrangeiros do interior.
A intriga mesquinha, o insulto soez e a calúnia venenosa, ficavam doravante de atalaia à espera da primeira oportunidade para lhe assaltarem a memória.
E mais dois anos passaram... O Integralismo Lusitano dentro de pouco tempo estaria devidamente estruturado com a constituição da sua primeira Junta Central [4].
Mas ainda antes, em Abril de 1915, promove na Liga Naval Portuguesa, a série de conferências mais tarde coligidas em volume com o título: A QUESTÃO IBÉRICA (Lisboa, 1916).
O que motivaria esta necessária e inadiável afirmação de portuguesismo militante, nos vários aspetos tratados pelos conferentes? A resposta está claramente dada na nota introdutória do volume citado: «Os desvarios da República em Portugal alentam de novo a questão ibérica. Ninguém ignora que desde a vinda do humanitarismo revolucionário e romântico, todo o apóstolo da panaceia democrática se julgava com direito de chamar o seu país independente à união ou à federação peninsular.»
Um pouco adiante se acrescenta: «Mas logo que alguma noção concreta de responsabilidade conteve um pouco a torrente da asneira (única liberdade agora licita), não mais os democratas pregaram a união ibérica, sem que já pudessem abafar os antigos ecos dos seus imprudentes e perigosos clamores.
«Espanha, porém, entendeu não dever esquecê-los, e no princípio deste ano renovou mais claramente do que nunca, as suas aspirações fusionistas.»
Prosseguia depois o texto a que me reporto: «Seja a federação amigável nos termos em que a preconiza o político romântico Don Juán del Nido y Segalerva ou a simples anexação para nos salvar da ruína, no pensamento cruelmente irónico do professor Vicente Gay, toda a Espanha se deslumbra com a visão do Rei Afonso XIII, erguendo em triunfo a águia bicéfala, cujas asas cubram a velha Ibéria.»
E, finalmente, a última transcrição que desejo fazer desta nota introdutória: «As conferências que se vinham realizando no salão da Liga Naval Portuguesa, em resposta à campanha da imprensa espanhola, alguma coisa testemunham, cremos, das ideias dos monárquicos, acerca da união ibérica.
«A toda a hora, à falta de razões para nos calar e de boa-fé para reconhecer os nossos propósitos, é repetida a calúnia de que os monárquicos desejam a intervenção de Espanha.
«Respondam-lhe, de uma vez para sempre, as seguintes palavras de Segalerva no seu livro La Unión Ibérica, a pág. 364: "Nada se puede intentar más contrario a todo esto, ni más favorable à la continuación, aumentada y agravada, de la triste historia de la ruina del Imperio Peninsular, que acabamos de examinar en los capítulos de este libro, que la restauración de la Dinastía de la Casa de Braganza en el Trono de Portugal.
"Sobre esa Dinastía pesa la responsabilidad de haber deshecho en tiempo de Felipe IV la obra de Don Felipe II, y si fuere restaurada renacerían en ella todos los obstáculos que desde 1640 vienen impidiendo la Unión Ibérica.
... ... ... ... ... ... ... ...
"La política sensata aconseja la más absoluta abstención y esperar el desenvolvimiento de la República portuguesa. Nosotros no debemos ayudar ni la Monarquía ni la República; pero en todo caso, más debemos ayudar la República que la Restauración monárquica".»
Não se pode, na realidade, ser nem mais claro nem mais perentório. Aliás, Segalerva conhecia de sobejo os apoios, no terreno do iberismo, dos seus amigos e compadres — os republicanos-maçónicos portugueses (?) a que em breve farei a devida referência.
Mas agora importa mais documentar a posição de António Sardinha nesse processo ignóbil de traição à existência de Portugal livre e independente.
É ele que inicia, em 7 de Abril de 1915, a série de conferências na Liga Naval, ocupando-se do tema: O Território e a Raça.
Ao referir-se ao iberismo, na parte inicial do seu trabalho, esclarece: «E deste modo que, por volta de 1851, se emite em público a doutrina da nossa fusão. Traduzido por Latino Coelho, D. Sinibaldo de Mas pontifica arvorado em doutor do novo credo. Avança-se tanto para um programa de realizações imediatas que até já Santarém se aponta para capital da Ibéria unida. A base de aproximação é o projeto de casamento de Isabel II com D. Pedro V. O vento de insânia esconjura-se, porém, um instante, fracassadas todas as tentativas diplomáticas que se empenhavam naquele enlace.
«Mas, caixeiro-viajante da ideia iberista, não tarda que apareça em cena Fernandez de los Rios com Mi misión en Portugal.
«El-Rei D. Fernando II nos salva então, quando no entusiasmo dos propagandistas já as armas nacionais do velho reino de Afonso Henriques se sumiam ingloriamente para cederem o campo a outras inverosímeis armas de Portugal-condado.»
Um pouco adiante, António Sardinha recorda: «Vitoriosa a revolução em Portugal, a mira era dividir-se a península em nove repúblicas independentes, mas confederadas. Se nos lembrarmos agora do livro do senhor Magalhães Lima, La fédération ibérique, mais do programa do jantar de Badajoz, não necessitamos de invocar outros testemunhos para descobrir diante de Deus e dos homens o trama tecido com cautelas miúdas pela irmandade tenebrosa dos de avental e trolha.»
E com o seu entusiasmo e a sua eloquência inigualável, António Sardinha concluía com estas palavras o seu protesto contra o iberismo, de novo militante: «Desfeitos na poalha álgida da sepultura, nós proclamaremos ainda a revivescência admirável da Grey no sacrifício em que os nossos anos ardentemente se consumirem. E Castela quem o afirma, é Calderón de la Barca quem o afiança. Tão fundo o insigne dramaturgo lera na nossa fereza de povo livre que no Príncipe Constante obrigou o castelhano vernáculo de seiscentos a ceder diante de um verso seu moldado em pura língua de Camões. Esse verso, meus Senhores, somos todos nós — é toda a Pátria amada que estremecemos. Ele, o verso de maravilha, reconhece as razões invencíveis que sustentam Portugal de pé, por muito que os vendavais se desencadeiem sobre as nossas cabeças, como outrora em cima das casquinhas de noz em que dávamos a volta à Esfera. Ele, o verso formidável, reconhece o direito sagrado de Portugal a ser senhor dos seus caminhos e manter-se com honra na assembleia das nações. Saiba-se de cor o verso vingador —o verso como o qual outro não há, bradando tão alto a nossa vitalidade de assombro! A Pátria não morrerá, meus Senhores! E não morrerá, porque nós somos tais - lá diz Calderon de la Barca: Que ainda mortos, somos portugueses.»
«O seu entusiasmo republicano era, portanto, superficial e representava mais um protesto contra a corrupção dos costumes políticos da Monarquia do que uma convicção intelectual.
«Ser republicano afigurava-se-lhe naquele tempo a atitude mais digna para um bom português, razão bastante para que só mereça louvor a sua sinceridade.» [2]
António Sardinha que depois de concluída a sua formatura em Direito abandonara Coimbra no Verão de 1911, mantivera com os companheiros de curso e seus amigos fiéis estreitas relações, iria reunir-se com dois deles — Hipólito Raposo e Alberto Monsaraz — em Setembro de 1913, para preparar o lançamento da revista Nação Portuguesa, arauto do movimento integralista.
Durante esses dois anos, António Sardinha estudara, meditara e assistira com assombrada angústia ao desenvolvimento da balbúrdia sanguinolenta da síntese profética de Eça de Queirós, em que se traduzira a implantação do regime senhor dos destinos do país a partir de 5 de Outubro de 1910.
Com a coragem e a retidão mental que são seu timbre, corta definitivamente com o ideário democrático-maçónico e abraça totalmente e com ardente entusiasmo os princípios monárquicos tradicionais, raízes e alicerces da Pátria [3].
Essa nobre e dignificante revisão de ideias que lhe cortava aliás todas as possibilidades de uma carreira fácil na administração pública, nunca mais lhe será perdoada - mesmo para além da morte — pelos escravos da Liberdade e pelos estrangeiros do interior.
A intriga mesquinha, o insulto soez e a calúnia venenosa, ficavam doravante de atalaia à espera da primeira oportunidade para lhe assaltarem a memória.
E mais dois anos passaram... O Integralismo Lusitano dentro de pouco tempo estaria devidamente estruturado com a constituição da sua primeira Junta Central [4].
Mas ainda antes, em Abril de 1915, promove na Liga Naval Portuguesa, a série de conferências mais tarde coligidas em volume com o título: A QUESTÃO IBÉRICA (Lisboa, 1916).
O que motivaria esta necessária e inadiável afirmação de portuguesismo militante, nos vários aspetos tratados pelos conferentes? A resposta está claramente dada na nota introdutória do volume citado: «Os desvarios da República em Portugal alentam de novo a questão ibérica. Ninguém ignora que desde a vinda do humanitarismo revolucionário e romântico, todo o apóstolo da panaceia democrática se julgava com direito de chamar o seu país independente à união ou à federação peninsular.»
Um pouco adiante se acrescenta: «Mas logo que alguma noção concreta de responsabilidade conteve um pouco a torrente da asneira (única liberdade agora licita), não mais os democratas pregaram a união ibérica, sem que já pudessem abafar os antigos ecos dos seus imprudentes e perigosos clamores.
«Espanha, porém, entendeu não dever esquecê-los, e no princípio deste ano renovou mais claramente do que nunca, as suas aspirações fusionistas.»
Prosseguia depois o texto a que me reporto: «Seja a federação amigável nos termos em que a preconiza o político romântico Don Juán del Nido y Segalerva ou a simples anexação para nos salvar da ruína, no pensamento cruelmente irónico do professor Vicente Gay, toda a Espanha se deslumbra com a visão do Rei Afonso XIII, erguendo em triunfo a águia bicéfala, cujas asas cubram a velha Ibéria.»
E, finalmente, a última transcrição que desejo fazer desta nota introdutória: «As conferências que se vinham realizando no salão da Liga Naval Portuguesa, em resposta à campanha da imprensa espanhola, alguma coisa testemunham, cremos, das ideias dos monárquicos, acerca da união ibérica.
«A toda a hora, à falta de razões para nos calar e de boa-fé para reconhecer os nossos propósitos, é repetida a calúnia de que os monárquicos desejam a intervenção de Espanha.
«Respondam-lhe, de uma vez para sempre, as seguintes palavras de Segalerva no seu livro La Unión Ibérica, a pág. 364: "Nada se puede intentar más contrario a todo esto, ni más favorable à la continuación, aumentada y agravada, de la triste historia de la ruina del Imperio Peninsular, que acabamos de examinar en los capítulos de este libro, que la restauración de la Dinastía de la Casa de Braganza en el Trono de Portugal.
"Sobre esa Dinastía pesa la responsabilidad de haber deshecho en tiempo de Felipe IV la obra de Don Felipe II, y si fuere restaurada renacerían en ella todos los obstáculos que desde 1640 vienen impidiendo la Unión Ibérica.
... ... ... ... ... ... ... ...
"La política sensata aconseja la más absoluta abstención y esperar el desenvolvimiento de la República portuguesa. Nosotros no debemos ayudar ni la Monarquía ni la República; pero en todo caso, más debemos ayudar la República que la Restauración monárquica".»
Não se pode, na realidade, ser nem mais claro nem mais perentório. Aliás, Segalerva conhecia de sobejo os apoios, no terreno do iberismo, dos seus amigos e compadres — os republicanos-maçónicos portugueses (?) a que em breve farei a devida referência.
Mas agora importa mais documentar a posição de António Sardinha nesse processo ignóbil de traição à existência de Portugal livre e independente.
É ele que inicia, em 7 de Abril de 1915, a série de conferências na Liga Naval, ocupando-se do tema: O Território e a Raça.
Ao referir-se ao iberismo, na parte inicial do seu trabalho, esclarece: «E deste modo que, por volta de 1851, se emite em público a doutrina da nossa fusão. Traduzido por Latino Coelho, D. Sinibaldo de Mas pontifica arvorado em doutor do novo credo. Avança-se tanto para um programa de realizações imediatas que até já Santarém se aponta para capital da Ibéria unida. A base de aproximação é o projeto de casamento de Isabel II com D. Pedro V. O vento de insânia esconjura-se, porém, um instante, fracassadas todas as tentativas diplomáticas que se empenhavam naquele enlace.
«Mas, caixeiro-viajante da ideia iberista, não tarda que apareça em cena Fernandez de los Rios com Mi misión en Portugal.
«El-Rei D. Fernando II nos salva então, quando no entusiasmo dos propagandistas já as armas nacionais do velho reino de Afonso Henriques se sumiam ingloriamente para cederem o campo a outras inverosímeis armas de Portugal-condado.»
Um pouco adiante, António Sardinha recorda: «Vitoriosa a revolução em Portugal, a mira era dividir-se a península em nove repúblicas independentes, mas confederadas. Se nos lembrarmos agora do livro do senhor Magalhães Lima, La fédération ibérique, mais do programa do jantar de Badajoz, não necessitamos de invocar outros testemunhos para descobrir diante de Deus e dos homens o trama tecido com cautelas miúdas pela irmandade tenebrosa dos de avental e trolha.»
E com o seu entusiasmo e a sua eloquência inigualável, António Sardinha concluía com estas palavras o seu protesto contra o iberismo, de novo militante: «Desfeitos na poalha álgida da sepultura, nós proclamaremos ainda a revivescência admirável da Grey no sacrifício em que os nossos anos ardentemente se consumirem. E Castela quem o afirma, é Calderón de la Barca quem o afiança. Tão fundo o insigne dramaturgo lera na nossa fereza de povo livre que no Príncipe Constante obrigou o castelhano vernáculo de seiscentos a ceder diante de um verso seu moldado em pura língua de Camões. Esse verso, meus Senhores, somos todos nós — é toda a Pátria amada que estremecemos. Ele, o verso de maravilha, reconhece as razões invencíveis que sustentam Portugal de pé, por muito que os vendavais se desencadeiem sobre as nossas cabeças, como outrora em cima das casquinhas de noz em que dávamos a volta à Esfera. Ele, o verso formidável, reconhece o direito sagrado de Portugal a ser senhor dos seus caminhos e manter-se com honra na assembleia das nações. Saiba-se de cor o verso vingador —o verso como o qual outro não há, bradando tão alto a nossa vitalidade de assombro! A Pátria não morrerá, meus Senhores! E não morrerá, porque nós somos tais - lá diz Calderon de la Barca: Que ainda mortos, somos portugueses.»
*
A República Portuguesa é de raiz iberista e dessa mancha vergonhosa não há barrelas que a possam lavar.
Num opúsculo [5] de rara oportunidade e com a publicação do qual prestou um excelente serviço de esclarecimento de indiscutível utilidade para todos os portugueses, o Dr. Mário Saraiva responde a um acervo de falsidades e calúnias sobre o Integralismo Lusitano e alguns dos seus mais altos valores, escritas por um jornalista (?) sem escrúpulos.
Dá-nos esse trabalho uma sugestiva síntese das manobras iberistas dos fundadores e precursores do regime, desgraçadamente vigente neste país desde 5 de Outubro de 1910.
Vou aqui fazer algumas transcrições copiosamente documentadas, do opúsculo do Dr. Mário Saraiva:
«Temos na nossa frente o livro Fédération Ibérique, escrito em 1892, da autoria de Magalhães Lima, antigo grão-mestre da Maçonaria e diretor de O Século.......
Traduzimos à letra, da 3ª página do Prefácio, o trecho que se segue:
" - Eis o que eu preconizo.
"Republicano convicto, concentro os meus esforços para chegar à República portuguesa e em seguida a uma Federação entre a Espanha e Portugal. A República proclamada nestes dois países terá como consequência a Federação Ibérica.» ([6])
............. aqui lhe deixamos traduzidas mais umas passagens fundamentais do livro de Magalhães Lima - La Fédération Ibérique.
A págs. 145 lê-se: "O fundador do partido republicano português era um federalista. O verdadeiro fundador das doutrinas republicanas em Portugal foi José Félix Henriques Nogueira. Sobre o seu túmulo, os seus amigos inscreveram estas palavras significativas: — Apóstolo ardente da liberdade, da igualdade, da fraternidade, ele foi o grande propagandista da doutrina democrática e da ideia de uma federação política com a Espanha."
A págs. 151 prossegue Magalhães Lima: "Como campeões desta ideia, nós podemos também citar António de Oliveira Marreca, que, em 1848, fez parte do primeiro triunvirato republicano com José Estêvão Coelho de Magalhães e António Rodrigues Sampaio.
A estes é preciso juntar: Sousa Brandão e Latino Coelho, o primeiro a proclamar na Câmara dos Pares os princípios republicanos."
E a págs. 175 escreve: "O partido republicano português não pode ser senão federalista. Em primeiro lugar, é esta a tradição que nos legaram os nossos chefes..." [7]
A págs. 261 de Fédération Ibérique começa por dizer Magalhães Lima, referindo-se ao «Congresso de Badajoz» [8):
«Os republicanos portugueses devem felicitar-se de terem cooperado nesta grande obra de paz, de amor, de fraternidade, de concórdia e de solidariedade. Ela fica como a mais bela página da história do partido republicano português e do partido republicano espanhol.»
A págs. 263: "A delegação portuguesa ao Congresso de Badajoz era composta de três deputados: Eduardo de Abreu, Jacinto Nunes e M. Teixeira de Queiroz; um conselheiro municipal, Teixeira Bastos; os representantes dos jornais republicanos: Cecílio de Sousa, diretor da Folha do Povo; Gomes da Silva, diretor de O Dia; Feio Terenas, diretor de A Batalha; Alves Correia, diretor de A Vanguarda; Magalhães Lima, diretor de O Século; Cunha e Costa, diretor de A Voz Pública, do Porto; Martins Lima, diretor de A Ideia Nova, de Barcelos; Azevedo Ramos, diretor de A Lucta, da Madeira; etc." ([9]).
O movimento federalista assinala-se por toda a parte em Portugal. Os jornais republicanos defendem esta ideia com calor e entusiasmo (pág. 209). As conferências sucedem-se. Gomes da Silva (diretor político do órgão republicano O Dia), um dos jornalistas mais distintos do partido republicano português, acaba também de fazer, sobre a Federação peninsular, uma brilhante dissertação (pág. 210).
Eduardo de Abreu... este ardente republicano compreende como nós a necessidade de uma federação ibérica (pág. 216).» [10]
«Contemporâneos do preclaro grão-mestre, autorizado republicano e famigerado iberista, mais este rol de... patriotas ibéricos: Augusto César, Brito Camacho, Gustavo Cabrita, M. Samardã e Borges Grainha, que escreveu estas sentenças: "A Federação não pode ter por base senão a forma republicana; é por esta que a ideia de uma república ibérica e federal tomou raízes em toda a península".»
Sem esquecer (e como seria possível tão grave omissão?) os dois iberistas confessos que foram os primeiros presidentes da República: Teófilo Braga (o provisório) e Manuel de Arriaga (o eleito).» [11]
E basta...
Como quem sente o espinho agudo de uma vergonhosa posição, que a todo o transe se pretende esconder, procuram ciclicamente alguns bons republicanos, lançar sobre os monárquicos em geral e particularmente sobre os integralistas, o labéu infamante de que não logram eles próprios libertar-se, porque os documentos comprovativos da sua vilíssima atitude de traição à Pátria, não podem ser suprimidos ou desmentidos.
Na sua desafronta de El-Rei Dom Carlos I ([12]), o saudoso jornalista Óscar Paxeco deixou-nos a preciosa informação de que o primeiro diário republicano, dirigido por Carrilho Videira e com Consiglieri Pedroso como redator-principal, fora auxiliado na sua fundação (confessa o próprio Carrilho Videira) pelos espanhóis Paulo Angulo, assassino de Prim, Ramon Cala, Eduardo Benot, Nicolas Estevanez, Fernando Garrido, Gumersindo da la Rosa e Manuel de Lafuentes. E o intemerato jornalista acrescentava: «Até a bandeira da sua república... é bandeira de traição — a bandeira da União Ibérica.»
Quantos dos portugueses que tão valente e gloriosamente se bateram e morreram por Portugal à sua sombra, conheceriam esta abominável origem?
Sobre as conferências da Liga Naval, tinham decorrido escassos quatro anos. Portugal suportava no sangue de muitos dos seus filhos, esse pesadelo de morte que fora a primeira Guerra Mundial.
O Integralismo Lusitano fizera o seu caminho, aliciando muitos dos melhores portugueses de todas as classes sociais e alinhando nas suas fileiras uma grande parte da juventude, com o seu entusiasmo generoso pronto a todos os sacrifícios, tornara-se a força que um corifeu republicano, espécie de filósofo oficial do regime - Leonardo Coimbra — chamara em público: o perigo integralista.
Em Fevereiro de 1917 tinha iniciado a sua publicação o jornal A MONARQUIA, que apesar da férrea censura prévia a Imprensa que chegava a cortar-lhe a maior parte dos artigos, continuava o bom combate iniciado em 1914 pela revista NAÇÃO PORTUGUESA.
A república democrática oscilava pendularmente entre o batuque partidário vizinho do caos político e a ditadura do partido ou dos chefes, mais ou menos autoritários e omnipotentes.
Sidónio Pais acendera no país uma chama de esperança com a sua decidida ação anti partidária e anti demagógica, mas essa esperança fora cortada tragicamente pelas balas assassinas de um sicário, instrumento do mais poderoso partido republicano.
Paiva Couceiro, o Soldado heroico de Marracuene e de Magul, o Governador ilustríssimo de Angola, desembainhara mais uma vez a sua espada pura para restaurar a Monarquia, no Porto, em Janeiro de 1919. Procurou o Integralismo Lusitano, por lhe não parecer mais oportuno o momento, impedir a eclosão desse movimento. António Sardinha e Luís de Almeida Braga, ainda seguiram para o Norte com essa missão. Quando lá chegaram, porém, a sorte já estava lançada e as decisões definitivamente tomadas.
O Dr. Leão Ramos Ascensão descreveria magistralmente este lance político e as suas consequências: «Aos delegados integralistas, perante o facto consumado, só restava pôr-se ao serviço da Monarquia restaurada, como fizeram.
«Pela mesma razão, era natural que Lisboa secundasse o movimento monárquico triunfante no Norte do país.
«Os chefes da Causa Monárquica, porém, numa inércia absurda e suicida, não se decidiam. Enquanto os republicanos, energicamente, organizavam a resistência, aqueles, seguros da maior parte da guarnição da capital, nada faziam, embora tudo fosse tão fácil.
«Quando resolveram tomar uma atitude, mais empurrados do que por vontade própria, levaram as tropas para Monsanto, mas ainda sem intenção restauracionista. O objetivo era unicamente o de se defenderem dos ataques dos republicanos, visto que os quartéis não ofereciam condições de defesa suficientes. Estavam de antemão condenados à derrota —o desfecho era fatal. Foi preciso que soassem os primeiros tiros dos republicanos para que, cedendo à pressão indignada dos que para ali tinham ido oferecer o sangue e a vida pela Monarquia, consentissem em que se hasteasse a bandeira azul-e-branca. Após dois dias de combate, em que houve atos numerosos de heroísmo individual e total ausência de comando, os monárquicos eram derrotados, a bandeira azul-e-branca arreada e feita em pedaços. Fazia-se a prova trágica da incapacidade dos velhos chefes monárquicos.
«Tanto sacrifício em vão, vidas perdidas inutilmente, a prisão, o exílio, a miséria para milhares de homens conduzidos ao combate sem planos, sem ideias, sem ânimo de vencer!» ([13])
Agora, no seu exílio em Espanha, António Sardinha tem ocasião de «pensar» de novo a Pátria:
Em toda a parte há terra portuguesa
desde que a alma a tenha na lembrança
e a sirva sempre com fervor igual.
Talvez por isso, em horas de tristeza,
eu pude, à sua amada semelhança,
criar p'ra mim um novo Portugal. [14]
Em Toledo, desterro e túmulo de D. Sancho II, ali onde o Tejo é um riacho a correr em direção a Lisboa, rememora as grandezas do passado e como foi possível aos dois grandes povos peninsulares - Portugal e Espanha —sempre que se libertaram da ideia de domínio ou de posse — D. João I, de Castela; D. Afonso V, de Portugal; D. Manuel I, de Portugal; os Habsburgos espanhóis (Filipes II, III e IV) — tomar no mundo a posição cimeira que o Tratado de Tordesilhas consagrara gloriosamente!
Toma vulto no seu espírito a construção da harmoniosa aliança entre as duas Monarquias peninsulares. De facto, importa não perder nunca de vista este aspeto essencial: tanto para António Sardinha como para os seus pares da Junta Central do Integralismo Lusitano, essa aliança só era possível e desejável com o perfeito equilíbrio dos dois povos peninsulares, fortes nas suas instituições tradicionais.
Nesse conjunto perfeito que o Mestre insigne de AO PRINCÍPIO ERA O VERBO articulara com alta visão e perfeita lucidez, haviam de incluir-se ao lado do Reino de Portugal e do Reino de Espanha, as Nações irmãs da América Hispânica, que franceses e italianos (logicamente...) teimam em chamar latina.
Escrito sobre o núcleo originário de uma conferência pronunciada em Madrid, desenvolvido e completado, o livro A ALIANÇA PENINSULAR só viria a ser publicado em 1924, pouco antes da morte de António Sardinha, em 10 de Janeiro de 1925, com 37 anos de idade!
Dentro daquela regularidade cíclica que atrás referi, a que nos acostumaram já os nossos adversários, querem eles endossar à viva força para os monárquicos o iberismo que está na base da república democrática, a continuadora, sob certos aspetos, da Monarquia liberal...
Esse ideal iberista foi, como vimos, publicamente confessado pelos corifeus do novo regime, e de que maneira!
Naquele empenho de alijar para cima dos outros a carga iberista da sua irmandade, veio de navalha em punho há poucos anos, o publicista sem escrúpulos e sem vergonha, já devidamente castigado pelo Dr. António José de Brito no seu notável trabalho que intitulou: REFLEXÕES SOBRE O INTEGRALISMO, e também pelo Dr. Mário Saraiva no seu vigoroso e oportuno opúsculo, já por mim largamente citado.
Agora um antigo cronista político-literário de O DIABO, e posteriormente ministro da República do «Estado Novo» e, em seguida, da sua sucessora e continuadora, a República do «Estado Social», vem nas páginas de um livro que, sem tal aliciante, talvez passasse despercebido, procurar diminuir a figura e a obra de António Sardinha.
A esse intento ambicioso, mas vão, responderam desfazendo as bolas de sabão de uma argumentação deficiente e eivada de erros e sofismas, os nomes que subscrevem os artigos coligidos neste volume.
Sem que tal represente menos respeito e admiração pelo valor e oportunidade de todos os outros depoimentos apresentados, a cujos Autores presto a minha homenagem de monárquico e afirmo a minha gratidão de integralista, seja-me permitido abraçar comovidamente, em perfeita comunhão de respeito e admiração pela alta memória de António Sardinha, os meus camaradas Dr. José Pequito Rebello, querido Mestre, e Dr. António Rodrigues Cavalheiro.
Sobre a má-fé da interpretação do seu claro e patriótico pensamento, sobre a injuriosa e torcida apreciação do seu esforço e da sua ação, as palavras de António Sardinha respondem vitoriosamente a todos os seus detratores, como um toque de clarim no final da batalha: «Adiante, por sobre os cadáveres!»
E o Portugal do futuro, da sua visão profética no belo livro que é A ALIANÇA PENINSULAR, há-de surgir, ainda que laboriosamente, das suas fortes, perpétuas, raízes seculares.
Lisboa, Natal de 1973.
MANOEL DE BETTENCOURT E GALVÃO
[1] Trabalho mais tarde no volume com o título Dois Nacionalismos – L’Action française e o Integralismo lusitano, Lisboa, Livraria Ferin, 1929.
[2] Obra citada, pp. 33-34 e seguintes.
[3] Só o limitado espaço de que disponho me não permite transcrever aqui a carta escrita por António Sardinha a Luís de Almeida Braga; então exilado na Bélgica, e na qual lhe comunica com convida alegria a sua aceitação definitiva e sem reservas da Verdade Monárquica.
[4] A Junta Central era constituída por Adriano Xavier Cordeiro, Hipólito Raposo, António Sardinha, João do Amaral, José Pequito Rebelo, Alberto Monsaraz e Luís de Almeida Braga.
Durante algum tempo presidiu à Junta Central o Prof. Doutor Rui Enes Ulrich, que fora na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, professor de alguns dos fundadores do Integralismo Lusitano acima referidos.
[5] Mário Saraiva, A Verdade e a Mentira, Lisboa, Biblioteca do Pensamento Político, 1971.
[6] Idem, Ibidem, p. 12.
[7] Ibidem, pp. 14 e 15.
[8] Esta sinistra patuscada teve lugar em 24 de Janeiro de 1893 no Teatro Ayala, de Badajoz...
[9] Ob. cit., p. 21 e 22.
[10] Ob. cit., p. 16.
[11] São de Manuel de Arriaga estas afirmações: “As duas nações vizinhas, divididas pelo interesse dinástico, devem estar unidas e solidárias no mesmo ideal de justiça.
Permiti-me formular votos sinceros pelos futuros Estados Unidos da Ibéria e pelo próximo triunfo do nosso ideal político (in A Verdade e a Mentira, p. 19)
[12] Óscar Paxeco (Fausto Fontes), El-Rei D. Carlos, o Grande Caluniado, Lisboa, 1964.
[13] Leão Ramos Ascensão, O Integralismo Lusitano, Lisboa, Edições Gama, 1943.
[14] Para um entendimento saloio e tacanho, estes belos tercetos de Na Corte da Saudade, mostram que António Sardinha concebia Portugal como um simples espírito (sic!). Custa a crer, mas é verdade...
Num opúsculo [5] de rara oportunidade e com a publicação do qual prestou um excelente serviço de esclarecimento de indiscutível utilidade para todos os portugueses, o Dr. Mário Saraiva responde a um acervo de falsidades e calúnias sobre o Integralismo Lusitano e alguns dos seus mais altos valores, escritas por um jornalista (?) sem escrúpulos.
Dá-nos esse trabalho uma sugestiva síntese das manobras iberistas dos fundadores e precursores do regime, desgraçadamente vigente neste país desde 5 de Outubro de 1910.
Vou aqui fazer algumas transcrições copiosamente documentadas, do opúsculo do Dr. Mário Saraiva:
«Temos na nossa frente o livro Fédération Ibérique, escrito em 1892, da autoria de Magalhães Lima, antigo grão-mestre da Maçonaria e diretor de O Século.......
Traduzimos à letra, da 3ª página do Prefácio, o trecho que se segue:
" - Eis o que eu preconizo.
"Republicano convicto, concentro os meus esforços para chegar à República portuguesa e em seguida a uma Federação entre a Espanha e Portugal. A República proclamada nestes dois países terá como consequência a Federação Ibérica.» ([6])
............. aqui lhe deixamos traduzidas mais umas passagens fundamentais do livro de Magalhães Lima - La Fédération Ibérique.
A págs. 145 lê-se: "O fundador do partido republicano português era um federalista. O verdadeiro fundador das doutrinas republicanas em Portugal foi José Félix Henriques Nogueira. Sobre o seu túmulo, os seus amigos inscreveram estas palavras significativas: — Apóstolo ardente da liberdade, da igualdade, da fraternidade, ele foi o grande propagandista da doutrina democrática e da ideia de uma federação política com a Espanha."
A págs. 151 prossegue Magalhães Lima: "Como campeões desta ideia, nós podemos também citar António de Oliveira Marreca, que, em 1848, fez parte do primeiro triunvirato republicano com José Estêvão Coelho de Magalhães e António Rodrigues Sampaio.
A estes é preciso juntar: Sousa Brandão e Latino Coelho, o primeiro a proclamar na Câmara dos Pares os princípios republicanos."
E a págs. 175 escreve: "O partido republicano português não pode ser senão federalista. Em primeiro lugar, é esta a tradição que nos legaram os nossos chefes..." [7]
A págs. 261 de Fédération Ibérique começa por dizer Magalhães Lima, referindo-se ao «Congresso de Badajoz» [8):
«Os republicanos portugueses devem felicitar-se de terem cooperado nesta grande obra de paz, de amor, de fraternidade, de concórdia e de solidariedade. Ela fica como a mais bela página da história do partido republicano português e do partido republicano espanhol.»
A págs. 263: "A delegação portuguesa ao Congresso de Badajoz era composta de três deputados: Eduardo de Abreu, Jacinto Nunes e M. Teixeira de Queiroz; um conselheiro municipal, Teixeira Bastos; os representantes dos jornais republicanos: Cecílio de Sousa, diretor da Folha do Povo; Gomes da Silva, diretor de O Dia; Feio Terenas, diretor de A Batalha; Alves Correia, diretor de A Vanguarda; Magalhães Lima, diretor de O Século; Cunha e Costa, diretor de A Voz Pública, do Porto; Martins Lima, diretor de A Ideia Nova, de Barcelos; Azevedo Ramos, diretor de A Lucta, da Madeira; etc." ([9]).
O movimento federalista assinala-se por toda a parte em Portugal. Os jornais republicanos defendem esta ideia com calor e entusiasmo (pág. 209). As conferências sucedem-se. Gomes da Silva (diretor político do órgão republicano O Dia), um dos jornalistas mais distintos do partido republicano português, acaba também de fazer, sobre a Federação peninsular, uma brilhante dissertação (pág. 210).
Eduardo de Abreu... este ardente republicano compreende como nós a necessidade de uma federação ibérica (pág. 216).» [10]
«Contemporâneos do preclaro grão-mestre, autorizado republicano e famigerado iberista, mais este rol de... patriotas ibéricos: Augusto César, Brito Camacho, Gustavo Cabrita, M. Samardã e Borges Grainha, que escreveu estas sentenças: "A Federação não pode ter por base senão a forma republicana; é por esta que a ideia de uma república ibérica e federal tomou raízes em toda a península".»
Sem esquecer (e como seria possível tão grave omissão?) os dois iberistas confessos que foram os primeiros presidentes da República: Teófilo Braga (o provisório) e Manuel de Arriaga (o eleito).» [11]
E basta...
Como quem sente o espinho agudo de uma vergonhosa posição, que a todo o transe se pretende esconder, procuram ciclicamente alguns bons republicanos, lançar sobre os monárquicos em geral e particularmente sobre os integralistas, o labéu infamante de que não logram eles próprios libertar-se, porque os documentos comprovativos da sua vilíssima atitude de traição à Pátria, não podem ser suprimidos ou desmentidos.
Na sua desafronta de El-Rei Dom Carlos I ([12]), o saudoso jornalista Óscar Paxeco deixou-nos a preciosa informação de que o primeiro diário republicano, dirigido por Carrilho Videira e com Consiglieri Pedroso como redator-principal, fora auxiliado na sua fundação (confessa o próprio Carrilho Videira) pelos espanhóis Paulo Angulo, assassino de Prim, Ramon Cala, Eduardo Benot, Nicolas Estevanez, Fernando Garrido, Gumersindo da la Rosa e Manuel de Lafuentes. E o intemerato jornalista acrescentava: «Até a bandeira da sua república... é bandeira de traição — a bandeira da União Ibérica.»
Quantos dos portugueses que tão valente e gloriosamente se bateram e morreram por Portugal à sua sombra, conheceriam esta abominável origem?
Sobre as conferências da Liga Naval, tinham decorrido escassos quatro anos. Portugal suportava no sangue de muitos dos seus filhos, esse pesadelo de morte que fora a primeira Guerra Mundial.
O Integralismo Lusitano fizera o seu caminho, aliciando muitos dos melhores portugueses de todas as classes sociais e alinhando nas suas fileiras uma grande parte da juventude, com o seu entusiasmo generoso pronto a todos os sacrifícios, tornara-se a força que um corifeu republicano, espécie de filósofo oficial do regime - Leonardo Coimbra — chamara em público: o perigo integralista.
Em Fevereiro de 1917 tinha iniciado a sua publicação o jornal A MONARQUIA, que apesar da férrea censura prévia a Imprensa que chegava a cortar-lhe a maior parte dos artigos, continuava o bom combate iniciado em 1914 pela revista NAÇÃO PORTUGUESA.
A república democrática oscilava pendularmente entre o batuque partidário vizinho do caos político e a ditadura do partido ou dos chefes, mais ou menos autoritários e omnipotentes.
Sidónio Pais acendera no país uma chama de esperança com a sua decidida ação anti partidária e anti demagógica, mas essa esperança fora cortada tragicamente pelas balas assassinas de um sicário, instrumento do mais poderoso partido republicano.
Paiva Couceiro, o Soldado heroico de Marracuene e de Magul, o Governador ilustríssimo de Angola, desembainhara mais uma vez a sua espada pura para restaurar a Monarquia, no Porto, em Janeiro de 1919. Procurou o Integralismo Lusitano, por lhe não parecer mais oportuno o momento, impedir a eclosão desse movimento. António Sardinha e Luís de Almeida Braga, ainda seguiram para o Norte com essa missão. Quando lá chegaram, porém, a sorte já estava lançada e as decisões definitivamente tomadas.
O Dr. Leão Ramos Ascensão descreveria magistralmente este lance político e as suas consequências: «Aos delegados integralistas, perante o facto consumado, só restava pôr-se ao serviço da Monarquia restaurada, como fizeram.
«Pela mesma razão, era natural que Lisboa secundasse o movimento monárquico triunfante no Norte do país.
«Os chefes da Causa Monárquica, porém, numa inércia absurda e suicida, não se decidiam. Enquanto os republicanos, energicamente, organizavam a resistência, aqueles, seguros da maior parte da guarnição da capital, nada faziam, embora tudo fosse tão fácil.
«Quando resolveram tomar uma atitude, mais empurrados do que por vontade própria, levaram as tropas para Monsanto, mas ainda sem intenção restauracionista. O objetivo era unicamente o de se defenderem dos ataques dos republicanos, visto que os quartéis não ofereciam condições de defesa suficientes. Estavam de antemão condenados à derrota —o desfecho era fatal. Foi preciso que soassem os primeiros tiros dos republicanos para que, cedendo à pressão indignada dos que para ali tinham ido oferecer o sangue e a vida pela Monarquia, consentissem em que se hasteasse a bandeira azul-e-branca. Após dois dias de combate, em que houve atos numerosos de heroísmo individual e total ausência de comando, os monárquicos eram derrotados, a bandeira azul-e-branca arreada e feita em pedaços. Fazia-se a prova trágica da incapacidade dos velhos chefes monárquicos.
«Tanto sacrifício em vão, vidas perdidas inutilmente, a prisão, o exílio, a miséria para milhares de homens conduzidos ao combate sem planos, sem ideias, sem ânimo de vencer!» ([13])
Agora, no seu exílio em Espanha, António Sardinha tem ocasião de «pensar» de novo a Pátria:
Em toda a parte há terra portuguesa
desde que a alma a tenha na lembrança
e a sirva sempre com fervor igual.
Talvez por isso, em horas de tristeza,
eu pude, à sua amada semelhança,
criar p'ra mim um novo Portugal. [14]
Em Toledo, desterro e túmulo de D. Sancho II, ali onde o Tejo é um riacho a correr em direção a Lisboa, rememora as grandezas do passado e como foi possível aos dois grandes povos peninsulares - Portugal e Espanha —sempre que se libertaram da ideia de domínio ou de posse — D. João I, de Castela; D. Afonso V, de Portugal; D. Manuel I, de Portugal; os Habsburgos espanhóis (Filipes II, III e IV) — tomar no mundo a posição cimeira que o Tratado de Tordesilhas consagrara gloriosamente!
Toma vulto no seu espírito a construção da harmoniosa aliança entre as duas Monarquias peninsulares. De facto, importa não perder nunca de vista este aspeto essencial: tanto para António Sardinha como para os seus pares da Junta Central do Integralismo Lusitano, essa aliança só era possível e desejável com o perfeito equilíbrio dos dois povos peninsulares, fortes nas suas instituições tradicionais.
Nesse conjunto perfeito que o Mestre insigne de AO PRINCÍPIO ERA O VERBO articulara com alta visão e perfeita lucidez, haviam de incluir-se ao lado do Reino de Portugal e do Reino de Espanha, as Nações irmãs da América Hispânica, que franceses e italianos (logicamente...) teimam em chamar latina.
Escrito sobre o núcleo originário de uma conferência pronunciada em Madrid, desenvolvido e completado, o livro A ALIANÇA PENINSULAR só viria a ser publicado em 1924, pouco antes da morte de António Sardinha, em 10 de Janeiro de 1925, com 37 anos de idade!
Dentro daquela regularidade cíclica que atrás referi, a que nos acostumaram já os nossos adversários, querem eles endossar à viva força para os monárquicos o iberismo que está na base da república democrática, a continuadora, sob certos aspetos, da Monarquia liberal...
Esse ideal iberista foi, como vimos, publicamente confessado pelos corifeus do novo regime, e de que maneira!
Naquele empenho de alijar para cima dos outros a carga iberista da sua irmandade, veio de navalha em punho há poucos anos, o publicista sem escrúpulos e sem vergonha, já devidamente castigado pelo Dr. António José de Brito no seu notável trabalho que intitulou: REFLEXÕES SOBRE O INTEGRALISMO, e também pelo Dr. Mário Saraiva no seu vigoroso e oportuno opúsculo, já por mim largamente citado.
Agora um antigo cronista político-literário de O DIABO, e posteriormente ministro da República do «Estado Novo» e, em seguida, da sua sucessora e continuadora, a República do «Estado Social», vem nas páginas de um livro que, sem tal aliciante, talvez passasse despercebido, procurar diminuir a figura e a obra de António Sardinha.
A esse intento ambicioso, mas vão, responderam desfazendo as bolas de sabão de uma argumentação deficiente e eivada de erros e sofismas, os nomes que subscrevem os artigos coligidos neste volume.
Sem que tal represente menos respeito e admiração pelo valor e oportunidade de todos os outros depoimentos apresentados, a cujos Autores presto a minha homenagem de monárquico e afirmo a minha gratidão de integralista, seja-me permitido abraçar comovidamente, em perfeita comunhão de respeito e admiração pela alta memória de António Sardinha, os meus camaradas Dr. José Pequito Rebello, querido Mestre, e Dr. António Rodrigues Cavalheiro.
Sobre a má-fé da interpretação do seu claro e patriótico pensamento, sobre a injuriosa e torcida apreciação do seu esforço e da sua ação, as palavras de António Sardinha respondem vitoriosamente a todos os seus detratores, como um toque de clarim no final da batalha: «Adiante, por sobre os cadáveres!»
E o Portugal do futuro, da sua visão profética no belo livro que é A ALIANÇA PENINSULAR, há-de surgir, ainda que laboriosamente, das suas fortes, perpétuas, raízes seculares.
Lisboa, Natal de 1973.
MANOEL DE BETTENCOURT E GALVÃO
[1] Trabalho mais tarde no volume com o título Dois Nacionalismos – L’Action française e o Integralismo lusitano, Lisboa, Livraria Ferin, 1929.
[2] Obra citada, pp. 33-34 e seguintes.
[3] Só o limitado espaço de que disponho me não permite transcrever aqui a carta escrita por António Sardinha a Luís de Almeida Braga; então exilado na Bélgica, e na qual lhe comunica com convida alegria a sua aceitação definitiva e sem reservas da Verdade Monárquica.
[4] A Junta Central era constituída por Adriano Xavier Cordeiro, Hipólito Raposo, António Sardinha, João do Amaral, José Pequito Rebelo, Alberto Monsaraz e Luís de Almeida Braga.
Durante algum tempo presidiu à Junta Central o Prof. Doutor Rui Enes Ulrich, que fora na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, professor de alguns dos fundadores do Integralismo Lusitano acima referidos.
[5] Mário Saraiva, A Verdade e a Mentira, Lisboa, Biblioteca do Pensamento Político, 1971.
[6] Idem, Ibidem, p. 12.
[7] Ibidem, pp. 14 e 15.
[8] Esta sinistra patuscada teve lugar em 24 de Janeiro de 1893 no Teatro Ayala, de Badajoz...
[9] Ob. cit., p. 21 e 22.
[10] Ob. cit., p. 16.
[11] São de Manuel de Arriaga estas afirmações: “As duas nações vizinhas, divididas pelo interesse dinástico, devem estar unidas e solidárias no mesmo ideal de justiça.
Permiti-me formular votos sinceros pelos futuros Estados Unidos da Ibéria e pelo próximo triunfo do nosso ideal político (in A Verdade e a Mentira, p. 19)
[12] Óscar Paxeco (Fausto Fontes), El-Rei D. Carlos, o Grande Caluniado, Lisboa, 1964.
[13] Leão Ramos Ascensão, O Integralismo Lusitano, Lisboa, Edições Gama, 1943.
[14] Para um entendimento saloio e tacanho, estes belos tercetos de Na Corte da Saudade, mostram que António Sardinha concebia Portugal como um simples espírito (sic!). Custa a crer, mas é verdade...
À maneira de Prefácio,
por Manuel de Bettencourt e Galvão, Natal de 1973
por Manuel de Bettencourt e Galvão, Natal de 1973
ÍNDICE
À maneira de Prefácio, por Manuel de Bettencourt e Galvão, Natal de 1973
DEPOIMENTOS:
Procurámos incluir neste volume todos os depoimentos que pudemos obter, a propósito da polémica suscitada pelo ataque desferido contra António Sardinha, num livro recentemente publicado.
Se alguma omissão se verifica, ela é devida unicamente a termos obtido os textos por desconhecimento das publicações em que tenham sido eventualmente inseridos.
- Biblioteca do Pensamento Político.
DEPOIMENTOS:
- As Crises e os Homens (pequeno comentário a um grande livro), por José Pequito Rebelo (in O Debate, 1086, de 15 de Janeiro de 1972)
- O "Iberismo" de António Sardinha - uma resposta do Sr. Dr. Franco Nogueira (in O Debate, 1087, de 22 de Janeiro de 1972)
- António Sardinha e o "Iberismo", por T. M. C. L. (in O Debate, 1087, de 22 de Janeiro de 1972)
- O pretenso "Iberismo" de António Sardinha, por José Pequito Rebelo (in O Debate, 1088, de 29 de Janeiro de 1972)
- Actualidade de António Sardinha (In O Debate, 1088, de 29 de Janeiro de 1972)
- Resposta a uma resposta, por Herculano Marques da Costa (in O Debate, 1089, de 5 de Fevereiro de 1972)
- Paralelo, por assinante 1620 (in O Debate, 1089, de 5 de Fevereiro de 1972)
- Carta ao dr. Pequito Rebelo sobre António Sardinha e o seu hispanismo, por Rodrigues Cavalheiro (in O Debate, 1090, de 12 de Fevereiro de 1972; 1092, de 26 de Fevereiro de 1972; 1093, de 4 de Março de 1972)
- Acerca de António Sardinha - Resposta do dr. Franco Nogueira a Herculano Marques da Costa (in O Debate, 1090, de 12 de Fevereiro de 1972)
- Uma resposta, por J. Oliveira Leite (in O Debate, 1091, de 19 de Fevereiro de 1972)
- Nova resposta. Uma "resposta" pouco feliz, por Herculano Marques da Costa (O Debate, 1092, de 26 de Fevereiro de 1972)
- À margem de uma polémica. Aliança Peninsular, por Henrique Martins de Carvalho (in O Debate, 1093, de 4 de Março de 1972)
- Acerca de António Sardinha. Nova resposta do dr. Franco Nogueira (O Debate, 1094, de 11 de Março de 1972; 1095, de 18 de Março de 1972; 1096, 25 de Março de 1972)
- Há mais de meio século ( excerto de Duas Datas, in A Monarquia, Agosto de 1917; Ao ritmo da Ampulheta, 1925, p. 137; O Debate, de 11 de Março de 1972)
- O Integralismo a propósito de um livro, por Fernão Pacheco de Castro ( O Debate, 1094, de 11 de Março de 1972)
- Será o ponto final?, por Herculano Marques da Costa (O Debate, 1096, de 25 de Março de 1972)
- Ainda acerca de António Sardinha. Um documento significativo, assinado por 52 personalidades (O Debate, 1097, de 1 de Abril de 1972; 8 de Abril de 1972)
- À margem de uma polémica. Ainda a Aliança Peninsular, por Henrique Martins de Carvalho (O Debate, 1098, 8 de Abril de 1972)
- A Aliança Peninsular. Uma polémica indesejável e indesejada, por José Pequito Rebelo (O Debate, 1099, 15 de Abril de 1972; 1100, de 22 de Abril de 1972)
- Actualidade do pensamento integralista - notável sessão no Centro de Cultura Popular (O Debate, 1099, de 15 de Abril de 1972)
- Reflexões a uma polémica, por Marcus de Noronha da Costa (in semanário Beira Baixa, 1814, de 3 de Junho de 1972)
- Apêndice - trecho da obra As Crises e os Homens, por Alberto Franco Nogueira.
Procurámos incluir neste volume todos os depoimentos que pudemos obter, a propósito da polémica suscitada pelo ataque desferido contra António Sardinha, num livro recentemente publicado.
Se alguma omissão se verifica, ela é devida unicamente a termos obtido os textos por desconhecimento das publicações em que tenham sido eventualmente inseridos.
- Biblioteca do Pensamento Político.
[ Este livro foi composto e impresso nas OFICINAS DE SÃO JOSÉ para a Biblioteca do Pensamento Político, em Janeiro de 1974 ]
A Biblioteca do Pensamento Político teve como principais organizadores, Mário Saraiva, Manuel de Bettencourt e Galvão, Fernão Pacheco de Castro, Marcus de Noronha da Costa e Henrique Barrilaro Ruas, mobilizando então cerca de 50 personalidades em defesa da memória e da verdade do pensamento de António Sardinha.
A Biblioteca do Pensamento Político teve como principais organizadores, Mário Saraiva, Manuel de Bettencourt e Galvão, Fernão Pacheco de Castro, Marcus de Noronha da Costa e Henrique Barrilaro Ruas, mobilizando então cerca de 50 personalidades em defesa da memória e da verdade do pensamento de António Sardinha.
Referencias
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