1933 - Carta para o "Camarada Quitério"
Aqui se reproduz uma carta enviada por António Pacheco ao "Camarada Quitério", que ficou depositada no Espólio de Francisco Rolão Preto e que me foi gentilmente cedida pela sua filha Rita Rolão Preto.
Estamos perante correspondência entre dois dirigentes, um de um núcleo de base e o outro na direção regional ou nacional do Movimento Nacional-Sindicalista (MNS). São ambos integralistas, aqui denunciando que seguiam uma política de atracção dos jovens simpatizantes do fascismo. Além da imitação dos seus métodos milicianos de organização e propaganda, estes integralistas procuravam ocultar o programa máximo do seu movimento - avançar para uma restauração da monarquia. A carta que aqui se reproduz é muito eloquente a esse respeito. O chefe de um núcleo local está a organizar uma biblioteca para a sede e pede ao seu superior hierárquico, na estrutura do movimento, que lhe enviem "livrecos" de propaganda. A cumplicidade entre o emissor e o receptor é evidente. Que livros são de excluir? - "não convém os mestres integralistas, porque falam sempre em Monarquia. Não convém pelo menos por enquanto"
Em 1933, os fascismos estavam no auge do seu prestígio e fascínio entre as juventudes. Nesta carta não se escreveu "dos mestres dos integralistas lusitanos", como já por aí vi ser citada esta carta, trata-se, sim, de "os mestres integralistas", isto é, "os nossos mestres". Não convinha "espantar a caça". (J.M.Q.)
1933
Camarada Quitério:
Com vai a questão Nacional-Sindicalista? Resolvida? Em via de solução? Peço-lhe encarecidamente que me conte o que se passa. Quanto à questão, por aqui pensa-se dum modo um pouco diferente do que em Coimbra: não interessa absolutamente nada a questão; esperam que ela se resolva e aceitam qualquer solução desde que conduza à unificação do Nacional-Sindicalismo; até à solução mantêm uma atitude de absoluta independência, não comunicando nem com um, nem com outro dos secretariados.
Eis a razão desta minha carta e do favor que lhe vou pedir. Eu explico: os camaradas daqui organizam-se e trabalham e têm já feito coisas interessantes. Assim, temos uma sede, fazemos instrução militar, têm um perfeito serviço disciplinar, com sanções, que vão desde a suspensão de direitos por tempo determinado até à expulsão. Estes castigos já foram aplicados. Fizeram um destes dias uma subscrição, mas uma subscrição sui generis. O directório local estipulou quais deviam ser os subscritores e qual a quantia com que cada um deles devia contribuir; além disso em vez do vulgar aditamento "pago" escrevia-se à frente do nome e à vista do próprio a lápis vermelho: é por nós ou é contra nós, conforme o subscritor (?) pagasse o estipulado ou não. Como vê os nossos camaradas daqui estão absolutamente integrados no espírito revolucionário nacional-sindicalista.
Mas vamos ao pedido. Os rapazes precisam de ler uma coisas, precisa-se arranjar uma biblioteca nova para sede, por isso eu me dirijo ao Chefe Quitério para me escolher aí uns livrecos de propaganda até aí uns 70 ou 80 escudos. Peço-lhe que tenha em atenção o nível mental cá dos rapazes, que é necessariamente baixo, na escolha dos livros. Claro que também não convém os mestres integralistas, porque falam sempre em Monarquia. Não convém pelo menos por enquanto. Os folhetos editados pela Revolução já temos por cá todos. Suponho que uns discursos do Hitler e Mussolini, A Família do Alberto Esteves; Para Além do Comunismo - Rolão Preto, etc., não deixarão de convir. Enfim V. fará o favor de ver por aí alguma coisa mais.
A maneira mais prática é encarregar o Joaquim da Atlântida de me mandar essa coisa. Ele que me mande também uma sebenta de Economia Política e outra de Economia Social; estas para uso pessoal. É necessário recordar as basesinhas.
Um abraço agradecido do amigo certo
António Pacheco
(Transcrição de Carta dirigida ao Camarada Quitério (negrito acrescentado), 1933, Espólio de Francisco Rolão Preto, Arquivo de Rita Rolão Preto)
Estamos perante correspondência entre dois dirigentes, um de um núcleo de base e o outro na direção regional ou nacional do Movimento Nacional-Sindicalista (MNS). São ambos integralistas, aqui denunciando que seguiam uma política de atracção dos jovens simpatizantes do fascismo. Além da imitação dos seus métodos milicianos de organização e propaganda, estes integralistas procuravam ocultar o programa máximo do seu movimento - avançar para uma restauração da monarquia. A carta que aqui se reproduz é muito eloquente a esse respeito. O chefe de um núcleo local está a organizar uma biblioteca para a sede e pede ao seu superior hierárquico, na estrutura do movimento, que lhe enviem "livrecos" de propaganda. A cumplicidade entre o emissor e o receptor é evidente. Que livros são de excluir? - "não convém os mestres integralistas, porque falam sempre em Monarquia. Não convém pelo menos por enquanto"
Em 1933, os fascismos estavam no auge do seu prestígio e fascínio entre as juventudes. Nesta carta não se escreveu "dos mestres dos integralistas lusitanos", como já por aí vi ser citada esta carta, trata-se, sim, de "os mestres integralistas", isto é, "os nossos mestres". Não convinha "espantar a caça". (J.M.Q.)
1933
Camarada Quitério:
Com vai a questão Nacional-Sindicalista? Resolvida? Em via de solução? Peço-lhe encarecidamente que me conte o que se passa. Quanto à questão, por aqui pensa-se dum modo um pouco diferente do que em Coimbra: não interessa absolutamente nada a questão; esperam que ela se resolva e aceitam qualquer solução desde que conduza à unificação do Nacional-Sindicalismo; até à solução mantêm uma atitude de absoluta independência, não comunicando nem com um, nem com outro dos secretariados.
Eis a razão desta minha carta e do favor que lhe vou pedir. Eu explico: os camaradas daqui organizam-se e trabalham e têm já feito coisas interessantes. Assim, temos uma sede, fazemos instrução militar, têm um perfeito serviço disciplinar, com sanções, que vão desde a suspensão de direitos por tempo determinado até à expulsão. Estes castigos já foram aplicados. Fizeram um destes dias uma subscrição, mas uma subscrição sui generis. O directório local estipulou quais deviam ser os subscritores e qual a quantia com que cada um deles devia contribuir; além disso em vez do vulgar aditamento "pago" escrevia-se à frente do nome e à vista do próprio a lápis vermelho: é por nós ou é contra nós, conforme o subscritor (?) pagasse o estipulado ou não. Como vê os nossos camaradas daqui estão absolutamente integrados no espírito revolucionário nacional-sindicalista.
Mas vamos ao pedido. Os rapazes precisam de ler uma coisas, precisa-se arranjar uma biblioteca nova para sede, por isso eu me dirijo ao Chefe Quitério para me escolher aí uns livrecos de propaganda até aí uns 70 ou 80 escudos. Peço-lhe que tenha em atenção o nível mental cá dos rapazes, que é necessariamente baixo, na escolha dos livros. Claro que também não convém os mestres integralistas, porque falam sempre em Monarquia. Não convém pelo menos por enquanto. Os folhetos editados pela Revolução já temos por cá todos. Suponho que uns discursos do Hitler e Mussolini, A Família do Alberto Esteves; Para Além do Comunismo - Rolão Preto, etc., não deixarão de convir. Enfim V. fará o favor de ver por aí alguma coisa mais.
A maneira mais prática é encarregar o Joaquim da Atlântida de me mandar essa coisa. Ele que me mande também uma sebenta de Economia Política e outra de Economia Social; estas para uso pessoal. É necessário recordar as basesinhas.
Um abraço agradecido do amigo certo
António Pacheco
(Transcrição de Carta dirigida ao Camarada Quitério (negrito acrescentado), 1933, Espólio de Francisco Rolão Preto, Arquivo de Rita Rolão Preto)