..."a verdade, quando impedida de marchar, refugia-se no coração dos homens e vai ganhando em profundidade o que parece perder em superfície... Um dia, essa verdade obscura, sobe das profundidades onde se exilara e surge tão forte claridade, que rasga as trevas do Mundo"- Rolão Preto in Inquietação
Francisco de Barcelos Rolão Preto (1893-1977) nasceu em 12 de Fevereiro de 1893, no Gavião, distrito de Portalegre, no Alto Alentejo, filho do juiz António Adolfo Sanches Rolão Preto (n. 1858), natural da Soalheira (encosta sul da Serra da Gardunha), Fundão, e de Rita Augusta Gaspar. Dada a profissão do pai, Francisco teve uma infância errante, de comarca em comarca. Era ainda um estudante no "Colégio Liceu Figueirense" (Figueira da Foz), fundado em 1905 pelo professor Mendes Pinheiro, quando se foi juntar na Galiza às tropas que, comandadas por Paiva Couceiro, desencadearam as incursões monárquicas de 1911-12. Por essa altura, o professor Mendes Pinheiro também saiu para o exílio e, levando consigo professores e alunos, reabriu o Liceu em Huy, na Bélgica. E foi na Bélgica que o jovem Francisco, ainda estudante liceal, veio a ser o secretário da revista Alma Portuguesa, onde Luís de Almeida Braga (1886-1970) cunhou a expressão "Integralismo Lusitano". Frequentou depois a Universidade de Lovaina, onde foi aluno do cardeal Mercier (arcebispo de Malines). Após o início da Grande Guerra, seguiu para Toulouse onde se vem a licenciar em Direito. Antes de retornar a Portugal, de passagem por Paris, ainda terá privado com destacadas personalidades do nacionalismo francês da época, como Maurice Barrès (republicano) ou Charles Maurras, Léon Daudet, Jacques Bainville (monárquicos).
Em finais de 1917, Rolão Preto estava em Portugal, assumindo responsabilidades no jornal A Monarquia - diário integralista da tarde. Após o assassínio de Sidónio Pais, em Dezembro de 1918, quando os partidos da «República Velha» preparavam a sua reinstalação no poder, Rolão Preto levou a ordem de Aires de Ornelas ("Go on!") pela Serra da Estrela e Beira Baixa, a levantar o Exército pela restauração da Monarquia (veio a ser proclamada no Norte e em Monsanto, Lisboa, em 1919; ver Os combates pela bandeira azul e branca, 1910-1919).
Em 1920, durante a prisão de Hipólito Raposo em S. Julião da Barra, Rolão Preto vem a assumir a direcção do jornal A Monarquia e da organização do Integralismo Lusitano. Cooptado para a sua Junta Central, em 1922, veio depois a desempenhar destacado papel nas acções conspirativas que derrubaram o regime parlamentar na sequência da revolta militar de 28 de Maio de 1926. Estreito colaborador do general Gomes da Costa, Rolão Preto escreveu o Manifesto em 12 pontos afixado nas paredes de Braga, no qual se formulavam as bases programáticas do movimento militar que ali se iniciava (ver José Manuel Quintas, O Integralismo Lusitano perante a "Salazarquia").
A máxima notoriedade de Rolão Preto, porém, viria a dar-se na sequência do lançamento do «Movimento Nacional-Sindicalista» (MNS), em Fevereiro de 1932, através do qual foi desafiada a instauração do Estado Novo de Oliveira Salazar. Sob a direcção dos integralistas Rolão Preto e Alberto Monsaraz, o MNS agitou o país político. Através do jornal A Revolução, Rolão Preto imprimiu ao MNS uma liderança carismática que mobilizou grande número de jovens, sobretudo das academias. Para a sua notoriedade e sucesso de adesões muito contribuiu a adopção de métodos milicianos de organização e propaganda, então em voga em organizações políticas que aspiravam a mobilizar as massas contra governos conservadores. Tais métodos foram adoptados por fascistas, comunistas, e mesmo por anarquistas, como a FAI (Federación Anarquista Ibérica) espanhola. A coreografia do MNS incluiu a saudação "à romana", a adopção de uma "camisa azul" (a cor das camisas dos operários portugueses) e uma braçadeira com a Cruz de Cristo.
Teria o MNS representado uma deriva fascista no seu percurso político tradicionalista, como pretendem alguns historiadores? Teria Rolão Preto abandonado a doutrina organicista, comunitária, municipalista, e sindicalista, do Integralismo Lusitano? - O programa do MNS desmente-o; e Rolão Preto sempre o negou. O Fascismo foi bem mais do que um método de organização, uma técnica de assalto ao poder ou uma coreografia - foi uma doutrina e uma prática política que o próprio Mussolini veio a definir como totalitária, nos antípodas do sindicalismo do MNS.
O equívoco de alguns historiadores pode radicar na confusão ou amálgama entre Fascismo e Nacionalismo. Sem dúvida que Rolão Preto se situou no campo das "revoluções nacionalistas", e foi por isso que saudou as vitórias dos fascistas em Itália, dos nacional-socialistas na Alemanha, e inclusive, após a morte de Lenine, a viragem nacionalista do bolchevismo - a "reacção nacionalista", notava Rolão Preto em Setembro de 1924, estava a revelar-se também no sovietismo, "que tem defendido os interesses exteriores da Rússia com tanto denodo e boa vontade como o imperialismo de Pedro o Grande". Questionava-se então Rolão Preto: "Para onde vamos na verdade? Para a direita, para a esquerda, velhas palavras sem sentido, mitos depostos pela onda incessante de vida nova que se ergue no horizonte da nova era. Não! Ninguém pode determinar a trajectória do tempo que corre cheio de inesperados saltos no abismo e cheio de largos vôos no céu azul da nossa esperança." Rolão Preto vibrava com o altear do nacionalismo, mas não sem deixar de vincar a matriz doutrinária e programática do Nacional-Sindicalismo; em entrevista à United Press, a sua demarcação face aos nacionalismos mais notórios e explícitos era bem clara: "O Fascismo e o Hitlerismo são totalitários, divinizadores do Estado, cesaristas: nós outros pretendemos encontrar na tradição cristianíssima do Povo Português a fórmula que permita harmonizar a soberania indiscutível do Interesse Nacional com a nossa dignidade moral de homens livres." Para Rolão Preto, eram inamovíveis os fundamentos do ideário político integralista, de raiz personalista e comunitária. E, se não pugnou pela restauração da Monarquia nas páginas do jornal A Revolução, a verdade é que no livro intitulado Para além do comunismo, em 1932, o "apelo ao Chefe" era claramente identificado com o Rei - o "Chefe histórico" e "dinástico".
Em 16 de Junho de 1933, no teatro São Carlos, Rolão Preto pronunciou um discurso muito crítico do Estado Novo em formação, denunciando-o como um regime de Partido Único, contrário às liberdade cívicas e políticas, e de um Corporativismo de Estado, contrário ao Sindicalismo livre. Visando o chefe do Governo, Oliveira Salazar, disse Rolão Preto: "pesam sobre nós as velhas teorias financeiras, os absurdos conceitos económicos, em nome dos quais o homem é escravo da plutocracia, da usura, do Estado." Poucos dias depois, em 24 de Julho, o jornal Revolução anuncia a sua suspensão forçada. Saíram apenas mais três números, o último em 23 de Setembro.
A contra ofensiva Salazarista vai então prosseguir no seio do próprio Nacional-Sindicalismo, manifestando-se no seu Congresso de Novembro através de José Cabral, aí apoiado por um minoria que incluía Eusébio Tamagnini, José Carlos Moreira, Amaral Pyrrait, Abílio Pinto de Lemos, Castro Fernandes. Pretendiam dissolver o MNS para integrar a União Nacional de Salazar. Essa minoria foi derrotada no Congresso, mas ficou aberta a fractura, exposta por Manuel Múrias no início de Março de 1934, ao publicar A Revolução Nacional em ruptura com o MNS.
Os nacional-sindicalistas, sob a liderança de Rolão Preto, vão responder com demonstração de força. Por ocasião do 28 de Maio de 1934, no Porto, reúnem uma coluna de 300 nacional-sindicalistas uniformizados e cerca de 2000 civis, na Praça Carlos Alberto. Sucedem-se os assaltos às suas instalações em Lisboa, Porto e Bragança. Em 20 de Junho, Rolão Preto acabará por apelar para o Presidente da República, solicitando-lhe "pronta intervenção" no sentido de, entre outras coisas, garantir condições de liberdade de organização e movimento ao Nacional-Sindicalismo.
Em 10 de Julho, Rolão Preto é detido e expulso para Espanha e, em 29 de Julho, através de uma nota oficiosa do governo, assinada por Oliveira Salazar, o MNS é proibido, sendo os nacional-sindicalistas convidados a aderir à União Nacional e os seus estudantes à Acção Escolar de Vanguarda (AEV, precursora da Mocidade Portuguesa). A nota oficiosa de Salazar terminava com ameaças, mas deixava igualmente tombar sarcasmo e ironia: o chefe de um Governo que forçava o estabelecimento de um regime de Partido Único em Portugal, imitando o bolchevismo e os fascismos, dizia que o MNS se "inspirava em certos modelos estrangeiros”. Sob a presidência de Eusébio Tamagnini, reuniu dias depois o directório do MNS aprovando uma moção de adesão à União Nacional. Estava consumada a desagregação do MNS. Rolão Preto e Alberto Monsaraz, que tinham conseguido mobilizar muitos jovens das Academias, são então abandonados por dirigentes como José Cabral, Dutra Faria, Ramiro Valadão, Pires de Lima, Cabral de Moncada, alguns dos quais viriam a integrar os quadros do regime. Fiéis ao ideário das liberdades preconizado pelos integralistas, permaneceriam Garcia Domingues, António Pedro, Alçada Padez e António Lepierre Tinoco. Apesar do desterro de Rolão Preto e Alberto Monsaraz, e da censura à imprensa, Salazar não ficou sem resposta. A Junta de Acção Nacional Sindicalista emitiu então o seguinte comunicado, em 12 pontos, no qual se desfazem os erros e as insídias da nota oficiosa do Governo, reafirmando "as características do Nacionalismo Português, tradicionalmente incompatível com a divinização do Estado e cioso das prerrogativas e liberdades essenciais da personalidade humana." (Junta de Acção Nacional Sindicalista, Lisboa, Agosto de 1934).
Em Espanha, Rolão Preto veio a residir durante cerca de um mês (Novembro) em casa de José António Primo de Rivera, com quem colaborou na redacção dos "27 pontos" programáticos da Falange. Em Fevereiro do ano seguinte, reentrou em Portugal com o intuito de reorganizar e relançar o Movimento mas, em Setembro, o Governo deu-o como implicado num frustrado movimento revolucionário contra o regime (o chamado "golpe Mendes Norton"). De novo forçado a sair para Espanha, Rolão Preto acabou por vir a acompanhar o desenrolar da Guerra Civil ao lado dos nacionalistas da Falange. O seu livro Revolução Espanhola (Aspectos, Homens, Ideias), dá conta dessa experiência.
Em 1936, Rolão Preto publicou o livro Justiça!, proibido de circular em Portugal, onde explicita o seu credo personalista e comunitário: partindo do conceito de "sociedade" como uma "pessoa de pessoas humanas", com expressa referência ao personalismo cristão de Emmanuel Mounier (Révolution personnaliste et communautaire, 1935), ali elucida os fundamentos doutrinários da sua rejeição do Liberalismo, do Fascismo e de todos os Estatismos, sejam eles das "esquerdas" ou das "direitas".
A sombra do seu exemplo de resistência ao Estado Novo, e o seu forte carisma pessoal, porém, não deixaram de martirizar Salazar durante esses anos, ao ponto de este o ter procurado neutralizar politicamente através de aliciamento para vários cargos importantes no seio do regime, como o de Administrador da SACOR ou o de Embaixador de Portugal junto da Santa Sé. Rolão Preto tudo recusou.
Após a segunda Grande Guerra, Rolão Preto veio a retomar intervenção política através do apoio ao Movimento de Unidade Democrática (MUD). Tomou parte no comité de candidatura à presidência da República do Almirante Quintão Meireles e, nas eleições de 1958, com Almeida Braga e Vieira de Almeida, integrou também a candidatura do General Humberto Delgado, assumindo a chefia dos Serviços de Imprensa, escrevendo vários discursos da Candidatura e parte do respectivo Programa Político (José Manuel Quintas, Os monárquicos e as eleições de 58).
Em estreita relação com Mário Saraiva, Barrilaro Ruas, entre outros, veio a ter directa intervenção na constituição da Editora «Biblioteca do Pensamento Político», nos movimentos da «Renovação Portuguesa», «Convergência Monárquica», bem como nas «Comissões Eleitorais Monárquicas», em cujas listas se apresentou como candidato a deputado à Assembleia Nacional, em 1969.
Em 23 de Maio de 1974, por iniciativa da «Convergência Monárquica», foi fundado o «Partido Popular Monárquico» (P.P.M.), no qual Rolão Preto assumiu a Presidência do Directório e do Congresso.
Francisco Rolão Preto morreu em 19 de Dezembro de 1977. Em 10 de Fevereiro de 1994, foi condecorado, a título póstumo, pelo Presidente da República, Mário Soares, com a Grã-Cruz da Ordem do Infante D. Henrique, pelo seu patriotismo e "entranhado amor pela liberdade".
Obras mais importantes:
1920 - A Monarquia é a Restauração da Inteligência, Lisboa.
1932 - Para Além do Comunismo, Coimbra.
1933 - Orgânica do Movimento Nacional Sindicalista, Lisboa.
1933 - Salazar e a Sua Época: Comentário às Entrevistas do Actual Chefe do Governo com o Jornalista António Ferro, Lisboa.
1936 - Justiça!, Lisboa.
1939 - O Fascismo, Guimarães.
1942 - Em Frente! Discurso pronunciado pelo Dr. Rolão Preto no banquete dos intelectuais nacionalistas, Castelo Branco.
1942 - Para Além da Guerra, Lisboa, Edições Gama.
"Da geração académica que veio a fazer a República, para só falar na que antecedeu a actual, pretendia-se que ela só era republicana nos bancos das escolas, pois à medida que os escolares ingressavam na "vida prática" se transmudavam logo em bons funcionários e serventuários da Monarquia distribuidora de benesses. Puro engano? Também a nossa, geração integralista, foi caluniada, apodada de snobismo, de estulta pretensão, de retrógrada, de artificial, de vã, e todavia foi ela e só ela que liquidou a república demagógica e que tão levianamente a desprezou, como Teófilo Duarte recorda no seu belo livro Sidónio Pais e o seu Consulado há pouco publicado" (p. 16)
1945 - A Traição Burguesa, Lisboa, 1945;
1963 - Inquietação, Lisboa, 1963;
1971 - Carta a um republicano, Lisboa.
"Sim! É verdade que Você sempre foi republicano, e republicano dos tempos em que esse era o outro nome de "Homem Livre": Mas que, passado tanto tempo e depois de vividas tantas experiências, Você estranhe o nosso apelo ao Rei e possa perguntar "Para quê a Monarquia?" - eis o que não compreendo, eis o que me espanta. Pois, para que é que Vocês lutaram, sofreram, fizeram com mil sacrifícios a República? Foi para "isto" que aí está? Não, de certo" (pp. 4-5)
1972 - Carta aberta ao Doutor Marcello Caetano, Lisboa.
José Manuel Quintas
Em finais de 1917, Rolão Preto estava em Portugal, assumindo responsabilidades no jornal A Monarquia - diário integralista da tarde. Após o assassínio de Sidónio Pais, em Dezembro de 1918, quando os partidos da «República Velha» preparavam a sua reinstalação no poder, Rolão Preto levou a ordem de Aires de Ornelas ("Go on!") pela Serra da Estrela e Beira Baixa, a levantar o Exército pela restauração da Monarquia (veio a ser proclamada no Norte e em Monsanto, Lisboa, em 1919; ver Os combates pela bandeira azul e branca, 1910-1919).
Em 1920, durante a prisão de Hipólito Raposo em S. Julião da Barra, Rolão Preto vem a assumir a direcção do jornal A Monarquia e da organização do Integralismo Lusitano. Cooptado para a sua Junta Central, em 1922, veio depois a desempenhar destacado papel nas acções conspirativas que derrubaram o regime parlamentar na sequência da revolta militar de 28 de Maio de 1926. Estreito colaborador do general Gomes da Costa, Rolão Preto escreveu o Manifesto em 12 pontos afixado nas paredes de Braga, no qual se formulavam as bases programáticas do movimento militar que ali se iniciava (ver José Manuel Quintas, O Integralismo Lusitano perante a "Salazarquia").
A máxima notoriedade de Rolão Preto, porém, viria a dar-se na sequência do lançamento do «Movimento Nacional-Sindicalista» (MNS), em Fevereiro de 1932, através do qual foi desafiada a instauração do Estado Novo de Oliveira Salazar. Sob a direcção dos integralistas Rolão Preto e Alberto Monsaraz, o MNS agitou o país político. Através do jornal A Revolução, Rolão Preto imprimiu ao MNS uma liderança carismática que mobilizou grande número de jovens, sobretudo das academias. Para a sua notoriedade e sucesso de adesões muito contribuiu a adopção de métodos milicianos de organização e propaganda, então em voga em organizações políticas que aspiravam a mobilizar as massas contra governos conservadores. Tais métodos foram adoptados por fascistas, comunistas, e mesmo por anarquistas, como a FAI (Federación Anarquista Ibérica) espanhola. A coreografia do MNS incluiu a saudação "à romana", a adopção de uma "camisa azul" (a cor das camisas dos operários portugueses) e uma braçadeira com a Cruz de Cristo.
Teria o MNS representado uma deriva fascista no seu percurso político tradicionalista, como pretendem alguns historiadores? Teria Rolão Preto abandonado a doutrina organicista, comunitária, municipalista, e sindicalista, do Integralismo Lusitano? - O programa do MNS desmente-o; e Rolão Preto sempre o negou. O Fascismo foi bem mais do que um método de organização, uma técnica de assalto ao poder ou uma coreografia - foi uma doutrina e uma prática política que o próprio Mussolini veio a definir como totalitária, nos antípodas do sindicalismo do MNS.
O equívoco de alguns historiadores pode radicar na confusão ou amálgama entre Fascismo e Nacionalismo. Sem dúvida que Rolão Preto se situou no campo das "revoluções nacionalistas", e foi por isso que saudou as vitórias dos fascistas em Itália, dos nacional-socialistas na Alemanha, e inclusive, após a morte de Lenine, a viragem nacionalista do bolchevismo - a "reacção nacionalista", notava Rolão Preto em Setembro de 1924, estava a revelar-se também no sovietismo, "que tem defendido os interesses exteriores da Rússia com tanto denodo e boa vontade como o imperialismo de Pedro o Grande". Questionava-se então Rolão Preto: "Para onde vamos na verdade? Para a direita, para a esquerda, velhas palavras sem sentido, mitos depostos pela onda incessante de vida nova que se ergue no horizonte da nova era. Não! Ninguém pode determinar a trajectória do tempo que corre cheio de inesperados saltos no abismo e cheio de largos vôos no céu azul da nossa esperança." Rolão Preto vibrava com o altear do nacionalismo, mas não sem deixar de vincar a matriz doutrinária e programática do Nacional-Sindicalismo; em entrevista à United Press, a sua demarcação face aos nacionalismos mais notórios e explícitos era bem clara: "O Fascismo e o Hitlerismo são totalitários, divinizadores do Estado, cesaristas: nós outros pretendemos encontrar na tradição cristianíssima do Povo Português a fórmula que permita harmonizar a soberania indiscutível do Interesse Nacional com a nossa dignidade moral de homens livres." Para Rolão Preto, eram inamovíveis os fundamentos do ideário político integralista, de raiz personalista e comunitária. E, se não pugnou pela restauração da Monarquia nas páginas do jornal A Revolução, a verdade é que no livro intitulado Para além do comunismo, em 1932, o "apelo ao Chefe" era claramente identificado com o Rei - o "Chefe histórico" e "dinástico".
Em 16 de Junho de 1933, no teatro São Carlos, Rolão Preto pronunciou um discurso muito crítico do Estado Novo em formação, denunciando-o como um regime de Partido Único, contrário às liberdade cívicas e políticas, e de um Corporativismo de Estado, contrário ao Sindicalismo livre. Visando o chefe do Governo, Oliveira Salazar, disse Rolão Preto: "pesam sobre nós as velhas teorias financeiras, os absurdos conceitos económicos, em nome dos quais o homem é escravo da plutocracia, da usura, do Estado." Poucos dias depois, em 24 de Julho, o jornal Revolução anuncia a sua suspensão forçada. Saíram apenas mais três números, o último em 23 de Setembro.
A contra ofensiva Salazarista vai então prosseguir no seio do próprio Nacional-Sindicalismo, manifestando-se no seu Congresso de Novembro através de José Cabral, aí apoiado por um minoria que incluía Eusébio Tamagnini, José Carlos Moreira, Amaral Pyrrait, Abílio Pinto de Lemos, Castro Fernandes. Pretendiam dissolver o MNS para integrar a União Nacional de Salazar. Essa minoria foi derrotada no Congresso, mas ficou aberta a fractura, exposta por Manuel Múrias no início de Março de 1934, ao publicar A Revolução Nacional em ruptura com o MNS.
Os nacional-sindicalistas, sob a liderança de Rolão Preto, vão responder com demonstração de força. Por ocasião do 28 de Maio de 1934, no Porto, reúnem uma coluna de 300 nacional-sindicalistas uniformizados e cerca de 2000 civis, na Praça Carlos Alberto. Sucedem-se os assaltos às suas instalações em Lisboa, Porto e Bragança. Em 20 de Junho, Rolão Preto acabará por apelar para o Presidente da República, solicitando-lhe "pronta intervenção" no sentido de, entre outras coisas, garantir condições de liberdade de organização e movimento ao Nacional-Sindicalismo.
Em 10 de Julho, Rolão Preto é detido e expulso para Espanha e, em 29 de Julho, através de uma nota oficiosa do governo, assinada por Oliveira Salazar, o MNS é proibido, sendo os nacional-sindicalistas convidados a aderir à União Nacional e os seus estudantes à Acção Escolar de Vanguarda (AEV, precursora da Mocidade Portuguesa). A nota oficiosa de Salazar terminava com ameaças, mas deixava igualmente tombar sarcasmo e ironia: o chefe de um Governo que forçava o estabelecimento de um regime de Partido Único em Portugal, imitando o bolchevismo e os fascismos, dizia que o MNS se "inspirava em certos modelos estrangeiros”. Sob a presidência de Eusébio Tamagnini, reuniu dias depois o directório do MNS aprovando uma moção de adesão à União Nacional. Estava consumada a desagregação do MNS. Rolão Preto e Alberto Monsaraz, que tinham conseguido mobilizar muitos jovens das Academias, são então abandonados por dirigentes como José Cabral, Dutra Faria, Ramiro Valadão, Pires de Lima, Cabral de Moncada, alguns dos quais viriam a integrar os quadros do regime. Fiéis ao ideário das liberdades preconizado pelos integralistas, permaneceriam Garcia Domingues, António Pedro, Alçada Padez e António Lepierre Tinoco. Apesar do desterro de Rolão Preto e Alberto Monsaraz, e da censura à imprensa, Salazar não ficou sem resposta. A Junta de Acção Nacional Sindicalista emitiu então o seguinte comunicado, em 12 pontos, no qual se desfazem os erros e as insídias da nota oficiosa do Governo, reafirmando "as características do Nacionalismo Português, tradicionalmente incompatível com a divinização do Estado e cioso das prerrogativas e liberdades essenciais da personalidade humana." (Junta de Acção Nacional Sindicalista, Lisboa, Agosto de 1934).
Em Espanha, Rolão Preto veio a residir durante cerca de um mês (Novembro) em casa de José António Primo de Rivera, com quem colaborou na redacção dos "27 pontos" programáticos da Falange. Em Fevereiro do ano seguinte, reentrou em Portugal com o intuito de reorganizar e relançar o Movimento mas, em Setembro, o Governo deu-o como implicado num frustrado movimento revolucionário contra o regime (o chamado "golpe Mendes Norton"). De novo forçado a sair para Espanha, Rolão Preto acabou por vir a acompanhar o desenrolar da Guerra Civil ao lado dos nacionalistas da Falange. O seu livro Revolução Espanhola (Aspectos, Homens, Ideias), dá conta dessa experiência.
Em 1936, Rolão Preto publicou o livro Justiça!, proibido de circular em Portugal, onde explicita o seu credo personalista e comunitário: partindo do conceito de "sociedade" como uma "pessoa de pessoas humanas", com expressa referência ao personalismo cristão de Emmanuel Mounier (Révolution personnaliste et communautaire, 1935), ali elucida os fundamentos doutrinários da sua rejeição do Liberalismo, do Fascismo e de todos os Estatismos, sejam eles das "esquerdas" ou das "direitas".
A sombra do seu exemplo de resistência ao Estado Novo, e o seu forte carisma pessoal, porém, não deixaram de martirizar Salazar durante esses anos, ao ponto de este o ter procurado neutralizar politicamente através de aliciamento para vários cargos importantes no seio do regime, como o de Administrador da SACOR ou o de Embaixador de Portugal junto da Santa Sé. Rolão Preto tudo recusou.
Após a segunda Grande Guerra, Rolão Preto veio a retomar intervenção política através do apoio ao Movimento de Unidade Democrática (MUD). Tomou parte no comité de candidatura à presidência da República do Almirante Quintão Meireles e, nas eleições de 1958, com Almeida Braga e Vieira de Almeida, integrou também a candidatura do General Humberto Delgado, assumindo a chefia dos Serviços de Imprensa, escrevendo vários discursos da Candidatura e parte do respectivo Programa Político (José Manuel Quintas, Os monárquicos e as eleições de 58).
Em estreita relação com Mário Saraiva, Barrilaro Ruas, entre outros, veio a ter directa intervenção na constituição da Editora «Biblioteca do Pensamento Político», nos movimentos da «Renovação Portuguesa», «Convergência Monárquica», bem como nas «Comissões Eleitorais Monárquicas», em cujas listas se apresentou como candidato a deputado à Assembleia Nacional, em 1969.
Em 23 de Maio de 1974, por iniciativa da «Convergência Monárquica», foi fundado o «Partido Popular Monárquico» (P.P.M.), no qual Rolão Preto assumiu a Presidência do Directório e do Congresso.
Francisco Rolão Preto morreu em 19 de Dezembro de 1977. Em 10 de Fevereiro de 1994, foi condecorado, a título póstumo, pelo Presidente da República, Mário Soares, com a Grã-Cruz da Ordem do Infante D. Henrique, pelo seu patriotismo e "entranhado amor pela liberdade".
Obras mais importantes:
1920 - A Monarquia é a Restauração da Inteligência, Lisboa.
1932 - Para Além do Comunismo, Coimbra.
1933 - Orgânica do Movimento Nacional Sindicalista, Lisboa.
1933 - Salazar e a Sua Época: Comentário às Entrevistas do Actual Chefe do Governo com o Jornalista António Ferro, Lisboa.
1936 - Justiça!, Lisboa.
1939 - O Fascismo, Guimarães.
1942 - Em Frente! Discurso pronunciado pelo Dr. Rolão Preto no banquete dos intelectuais nacionalistas, Castelo Branco.
1942 - Para Além da Guerra, Lisboa, Edições Gama.
"Da geração académica que veio a fazer a República, para só falar na que antecedeu a actual, pretendia-se que ela só era republicana nos bancos das escolas, pois à medida que os escolares ingressavam na "vida prática" se transmudavam logo em bons funcionários e serventuários da Monarquia distribuidora de benesses. Puro engano? Também a nossa, geração integralista, foi caluniada, apodada de snobismo, de estulta pretensão, de retrógrada, de artificial, de vã, e todavia foi ela e só ela que liquidou a república demagógica e que tão levianamente a desprezou, como Teófilo Duarte recorda no seu belo livro Sidónio Pais e o seu Consulado há pouco publicado" (p. 16)
1945 - A Traição Burguesa, Lisboa, 1945;
1963 - Inquietação, Lisboa, 1963;
1971 - Carta a um republicano, Lisboa.
"Sim! É verdade que Você sempre foi republicano, e republicano dos tempos em que esse era o outro nome de "Homem Livre": Mas que, passado tanto tempo e depois de vividas tantas experiências, Você estranhe o nosso apelo ao Rei e possa perguntar "Para quê a Monarquia?" - eis o que não compreendo, eis o que me espanta. Pois, para que é que Vocês lutaram, sofreram, fizeram com mil sacrifícios a República? Foi para "isto" que aí está? Não, de certo" (pp. 4-5)
1972 - Carta aberta ao Doutor Marcello Caetano, Lisboa.
José Manuel Quintas
Para uma bibliografia de Francisco de Barcelos Rolão Preto
1910
Echos do collegio: publicação mensal dos alumnos do Collegio Lyceu Figueirense, propr. e dir. José Luiz Mendes Pinheiro, red. princ. Rollão Preto, Figueira da Foz, mensal, c. 1910.
1915
Redempção (ensaio psychologico) (in Rolão Preto, Obras completas, Volume I, Lisboa, Edições Colibri, 2015, pp.1-39)
1918
"Serenamente", A Monarquia.
1920
A monarquia é a restauração da inteligência, Lisboa, 1920. (Tip. Soares & Guedes.)
Balizas: manual do sindicalismo organico, Lisboa, UP, c. 1920. Outra edição: Lisboa, UP, 3.ª ed., c. 1932.
1925
"A Política Social da Monarquia Orgânica (Apontamentos da conferência realizada no Palácio Murça a convite da A.R.P.)", Acção Realista, II (25-26), nº 10 e 11, 15 de Novembro de 1925, pp. 233-240.
1932
Para além do comunismo, Coimbra, Junta Escolar de Coimbra do Integralismo Lusitano, 1932.
1933
Salazar e a sua época. Comentário às entrevistas do actual chefe do governo com o jornalista António Ferro, Lisboa, 1933. (Tip. Imp. Moderna.)
Orgânica do Movimento Nacional-Sindicalista, Lisboa, 1933.
1932-1933
Revolução. Diário Nacional-Sindicalista da Tarde. Rolão Preto é o director desde o n.º 66 (28.05.1932) ao n.º 418 (23.09.1933, data em que o jornal foi suspenso).
1936
Justiça!, Lisboa, 1936. (Tip. Leiriense, Leiria.)
1937
Revolução espanhola: aspectos: homens: ideias, Lisboa, 1937. (Tip. Impr. Portugal-Brasil.)
O discurso de Fermin Yzurdiaga, Porto, 1937. (Tip. Emp. Guedes.)
1939
O fascismo: artigos ressuscitados de uma antiga polémica, Guimarães, 1939. Sep. da revista Gil Vicente, v. 15. (Vila Nova de Famalicão, Tip. Minerva.)
1940
Para além da revolução... a revolução: entrevistas com Rolão Preto, por José Plácido Machado Barbosa, Porto, 1940. (Tip. Aliança.)
1942
Para além da guerra, Porto, Ed. Gama, 1942.
Em Frente!, Discurso pronunciado pelo Dr. Rolão Preto no banquete dos intelectuais Nacionalistas, Castelo Branco, 1942.
1945
A traição burguesa, Lisboa, Pro Domo, 1945.
1946
“A Mensagem Política de Afonso Lopes Vieira”, Diário de Lisboa, ano 26º, nº 8404, Lisboa, 20 de Abril de 1946, p. 13.
1953
Tudo pelo homem, nada contra o Homem, palestra proferida ao microfone do Rádio Clube Português em 31 de Outubro de 1953, Lisboa, Inquérito, 1953.
1963
Inquietação, Lisboa, Specil, 1963. (A Alma)
1971
Carta a um republicano, Lisboa, 1971. (Tip. União Gráfica.)
1972
Carta Aberta ao Doutor Marcello Caetano, Lisboa, 1972.
2015
Obras completas, org. pref. e introd. José Melo Alexandrino, fixação do texto e notas Joaquim E. Oliveira, 2 volumes, Lisboa, Colibri, 2015.
[M.V.C.]
Outras referências / bibliografia
1934 - Francisco Rolão Preto - Representação ao Presidente da República em Junho de 1934
1945 - Francisco Rolão Preto - "Tudo pelo Homem, nada contra o Homem"
1953 - Francisco Rolão Preto - Tudo pelo Homem nada contra o Homem
1995 - Mário Saraiva - No Centenário de Rolão Preto
2001 - "Estado Novo" e Fascismo versus Nacional-Sindicalismo, em debate
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1959 - Entrevista a Francisco Rolão Preto, político, jornalista, escritor e um dos fundadores do Integralismo Lusitano e líder do Movimento Nacional-Sindicalista, Arquivo RTP, 13 de Janeiro de 1959. 1959 - Entrevista a Francisco Rolão Preto
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1975 - Rolão Preto: "Tudo pelo Homem nada contra o Homem", Arquivo RTP, 1975.
1934 - Francisco Rolão Preto - Representação ao Presidente da República em Junho de 1934
1945 - Francisco Rolão Preto - "Tudo pelo Homem, nada contra o Homem"
1953 - Francisco Rolão Preto - Tudo pelo Homem nada contra o Homem
1995 - Mário Saraiva - No Centenário de Rolão Preto
2001 - "Estado Novo" e Fascismo versus Nacional-Sindicalismo, em debate
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1959 - Entrevista a Francisco Rolão Preto, político, jornalista, escritor e um dos fundadores do Integralismo Lusitano e líder do Movimento Nacional-Sindicalista, Arquivo RTP, 13 de Janeiro de 1959. 1959 - Entrevista a Francisco Rolão Preto
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1975 - Rolão Preto: "Tudo pelo Homem nada contra o Homem", Arquivo RTP, 1975.