A Nova geração e o ideal nacionalista
Guilherme de Faria
Que pensam os novos da vida literária portuguesa? Eis aqui uma pergunta a que os novos poderão e deverão responder. Ouçamos pois, ao abrirmos esta secção – «vida literária» –, um dos mais jovens poetas, Guilherme de Faria, cujo último livro – Destino –, há pouco saído dos prelos, tão alto acaba de erguer o seu autor.
− Julgo admirável a hora que passa para a literatura portuguesa – começou por nos dizer. E acrescentou:
− Creio mesmo que esta renascença, que está latente, não engana. Cessaram de vez as torvas influências revolucionárias que, um século atrás, tanto prejudicaram e escureceram grandes espíritos. E, como era natural – dadas a sua origem e finalidade absolutamente estranhas ao sentimento e à verdade portuguesa –, à cessão destas influências correspondeu um movimento que foi de interesse e, hoje, é de amor verdadeiro pelas nossas coisas.
− Portanto?...
− Portanto, as modernas gerações estão, assim, com Gil Vicente, quando esse extraordinário poeta dizia: “As coisas de Portugal/ Todas têm grande valor...”
− As modernas gerações?...
− Basta citar-lhe a geração que deu o Integralismo: homens como António Sardinha, Luís de Almeida Braga – grande prosador e poeta –, João do Amaral – grande jornalista moderno – e tantos outros em que, dentre os mais novos, se destacam nomes como Manuel Múrias, que se votam, com heróico valor e sacrifício, à momentosa construção da Casa Portuguesa! É essa uma geração a valer – a geração do Resgate –, porque os benefícios da sua acção são imensos. Falando com os rapazes de hoje, ainda com os mais novos, encontramos neles uma boa formação moral e nacionalista. Estas almas de radiosa esperança e mocidade foram já resgatadas, pela ação de portugueses como os que citei, de todas as mentiras que, durante tanto tempo, turbaram o espírito nacional.
− E agora?
− Agora é que é prosseguir. Vejo próxima a Restauração de Portugal, do Reino de Santa Isabel e de Nun’Álvares, do Encoberto e de Camões. E não pensem os últimos crentes da mentira, que em todos os campos nos ia perdendo, que é meramente regressiva a renascença que ora se esboça com tanto esplendor. Não, não o creiam, porque será essa a última prova de que não são os descendentes dos antigos Portugueses.
− Então?
− Então, convençam-se todos de que a nossa missão não é contemplativa nem regressiva, porque a um Passado, como o que temos e amamos, tão glorioso e tão grande, não basta contemplá-lo estaticamente. Ele próprio exige uma continuação condigna e até superior em heroísmo e glória.
− A renascença de que fala não é uma quimera?
− Não é uma quimera minha. É uma verdade nacional.
E, a propósito, Guilherme de Faria acrescentou:
− Este movimento militar parece-me já muito bem e só deverá continuar animado dos princípios nacionalistas que o gerara.
Voltando à literatura:
− E depois, principalmente, esta bela geração que desponta e já se afirma, é um sintoma magnífico, porque é sabido que ao apogeu de um povo corresponde uma era de esplendor da sua literatura. É ver o nosso século XVI...
Continuando:
− E agora temos, na moderna geração, além dos que já mencionei, escritores como António de Sèves, que será, publicados os livros que prepara, um dos nossos maiores; filósofos como Mário Saa; dramaturgos como Vitoriano Braga que, ainda no outro dia, nos deu uma peça moderna e magistral, Alfredo Cortês, Correia d’Oliveira e Carlos Selvagem; artistas como Almada e Emmérico.
− E poetas?
− De poetas que nomes lhe direi se, à parte uma meia dúzia de literatos retóricos e falseadores da nossa saudade, todos têm, ao menos, uma quadra maravilhosa? E há-os em tão exuberante quantidade. Devemos pois voltar, em Poesia, às verdadeiras fontes do Lirismo Português: muita frescura e limpidez de sentimento, muita verdade íntima e nobreza de expressão, e nada de confusões palavrosas e de excessos de imagens e objetivismo.
A concluir:
− Enfim: na minha consciente e modesta pouquidade, sinto-me feliz de pertencer a esta geração. Continuarei pondo a minha pobre arte ao serviço do meu sentimento de humano e português, sem preocupações de escola, sem turbações de brumas, de metafísicas e saudosismos suspeitos, antes obedecendo só ao mando do ritmo interior, como na máxima famosa: Nada de regras, e viva a sinceridade!
(Guilherme de Faria, 1907-1929, "A nova geração e o ideal nacionalista" (entrevista por Armando Boaventura), in A Ideia Nacional, 30 de Março de 1927. (negritos acrescentados)
Que pensam os novos da vida literária portuguesa? Eis aqui uma pergunta a que os novos poderão e deverão responder. Ouçamos pois, ao abrirmos esta secção – «vida literária» –, um dos mais jovens poetas, Guilherme de Faria, cujo último livro – Destino –, há pouco saído dos prelos, tão alto acaba de erguer o seu autor.
− Julgo admirável a hora que passa para a literatura portuguesa – começou por nos dizer. E acrescentou:
− Creio mesmo que esta renascença, que está latente, não engana. Cessaram de vez as torvas influências revolucionárias que, um século atrás, tanto prejudicaram e escureceram grandes espíritos. E, como era natural – dadas a sua origem e finalidade absolutamente estranhas ao sentimento e à verdade portuguesa –, à cessão destas influências correspondeu um movimento que foi de interesse e, hoje, é de amor verdadeiro pelas nossas coisas.
− Portanto?...
− Portanto, as modernas gerações estão, assim, com Gil Vicente, quando esse extraordinário poeta dizia: “As coisas de Portugal/ Todas têm grande valor...”
− As modernas gerações?...
− Basta citar-lhe a geração que deu o Integralismo: homens como António Sardinha, Luís de Almeida Braga – grande prosador e poeta –, João do Amaral – grande jornalista moderno – e tantos outros em que, dentre os mais novos, se destacam nomes como Manuel Múrias, que se votam, com heróico valor e sacrifício, à momentosa construção da Casa Portuguesa! É essa uma geração a valer – a geração do Resgate –, porque os benefícios da sua acção são imensos. Falando com os rapazes de hoje, ainda com os mais novos, encontramos neles uma boa formação moral e nacionalista. Estas almas de radiosa esperança e mocidade foram já resgatadas, pela ação de portugueses como os que citei, de todas as mentiras que, durante tanto tempo, turbaram o espírito nacional.
− E agora?
− Agora é que é prosseguir. Vejo próxima a Restauração de Portugal, do Reino de Santa Isabel e de Nun’Álvares, do Encoberto e de Camões. E não pensem os últimos crentes da mentira, que em todos os campos nos ia perdendo, que é meramente regressiva a renascença que ora se esboça com tanto esplendor. Não, não o creiam, porque será essa a última prova de que não são os descendentes dos antigos Portugueses.
− Então?
− Então, convençam-se todos de que a nossa missão não é contemplativa nem regressiva, porque a um Passado, como o que temos e amamos, tão glorioso e tão grande, não basta contemplá-lo estaticamente. Ele próprio exige uma continuação condigna e até superior em heroísmo e glória.
− A renascença de que fala não é uma quimera?
− Não é uma quimera minha. É uma verdade nacional.
E, a propósito, Guilherme de Faria acrescentou:
− Este movimento militar parece-me já muito bem e só deverá continuar animado dos princípios nacionalistas que o gerara.
Voltando à literatura:
− E depois, principalmente, esta bela geração que desponta e já se afirma, é um sintoma magnífico, porque é sabido que ao apogeu de um povo corresponde uma era de esplendor da sua literatura. É ver o nosso século XVI...
Continuando:
− E agora temos, na moderna geração, além dos que já mencionei, escritores como António de Sèves, que será, publicados os livros que prepara, um dos nossos maiores; filósofos como Mário Saa; dramaturgos como Vitoriano Braga que, ainda no outro dia, nos deu uma peça moderna e magistral, Alfredo Cortês, Correia d’Oliveira e Carlos Selvagem; artistas como Almada e Emmérico.
− E poetas?
− De poetas que nomes lhe direi se, à parte uma meia dúzia de literatos retóricos e falseadores da nossa saudade, todos têm, ao menos, uma quadra maravilhosa? E há-os em tão exuberante quantidade. Devemos pois voltar, em Poesia, às verdadeiras fontes do Lirismo Português: muita frescura e limpidez de sentimento, muita verdade íntima e nobreza de expressão, e nada de confusões palavrosas e de excessos de imagens e objetivismo.
A concluir:
− Enfim: na minha consciente e modesta pouquidade, sinto-me feliz de pertencer a esta geração. Continuarei pondo a minha pobre arte ao serviço do meu sentimento de humano e português, sem preocupações de escola, sem turbações de brumas, de metafísicas e saudosismos suspeitos, antes obedecendo só ao mando do ritmo interior, como na máxima famosa: Nada de regras, e viva a sinceridade!
(Guilherme de Faria, 1907-1929, "A nova geração e o ideal nacionalista" (entrevista por Armando Boaventura), in A Ideia Nacional, 30 de Março de 1927. (negritos acrescentados)
Em Março de 1927, o jovem poeta Guilherme de Faria dizia estar muito esperançoso no futuro de Portugal. Identificando-se com a obra da "geração do Resgate" do Integralismo Lusitano - em que destacava os fundadores Luís de Almeida Braga e António Sardinha - via como "próxima a Restauração de Portugal", bastando que o movimento militar do 28 de Maio continuasse "animado dos princípios que o gerara".
Como Poeta, o seu programa era o de um retorno "às verdadeiras fontes do Lirismo Português: muita frescura e limpidez de sentimento, muita verdade íntima e nobreza de expressão". Tinha adversários? - Sem dúvida. A literatura das "confusões palavrosas e dos excessos de imagens e objectivismo", também a das "turbações de brumas, de metafísicas e saudosismos suspeitos", em alusão ao movimento republicano na "Renascença Portuguesa".
J.M.Q.
Como Poeta, o seu programa era o de um retorno "às verdadeiras fontes do Lirismo Português: muita frescura e limpidez de sentimento, muita verdade íntima e nobreza de expressão". Tinha adversários? - Sem dúvida. A literatura das "confusões palavrosas e dos excessos de imagens e objectivismo", também a das "turbações de brumas, de metafísicas e saudosismos suspeitos", em alusão ao movimento republicano na "Renascença Portuguesa".
J.M.Q.