Três Mensagens ao Mundo Lusíada
Plínio Salgado
(...)
14 - Confraternização das Raças e Unidade Católica
Hoje compreendemos melhor tão grande símbolo, depois das falsas teorias das superioridade étnicas e do desprezo que os povos do norte do planeta têm votado aos meridionais, acusando principalmente as nações latinas de decadentes, por se conservarem católicas e, em consequência do catolicismo, não se haverem premunido contra o igualitarismo racial, o que levam à conta de detrimento do tipo antropológico de teor ariano.
O progresso material dos grupos germânicos e anglo-saxões na faixa do globo melhor aquinhoada em hulha, levou certos teoristas a esquecer a posição industrial e militar secundária dos escandinavos, dos canadenses e dos povos despigmentados que se fixaram em regiões sem combustíveis minerais, para só considerarem como símile de atraso os latinos e outras famílias humanas que não puderam acompanhar o ritmo do desenvolvimento industrial do século XIX, por não possuírem carvão de pedra, e só por isso (1).
A confusão lançada nas inteligências pelos teóricos ao serviço das nações hulheiras criou nos povos desprovidos de possibilidades siderúrgicas um complexo de inferioridade tão deprimente que a si próprios se passam certidão de invalidez e de óbito moral. Esse estado de espírito levou seus intelectuais a pesquisar as causas da decadência nacional e, de tudo cogitando, menos da causa verdadeira, não faltaram os que responsabilizassem o obscurantismo dos reis, a opressão do clero, as peias dos costumes católicos pelo atraso e pobreza das nações. A História Portuguesa, assim como a Brasileira, foi falseada, desde o reinado de D. João V, até os nossos dias.
15 - Ciclo do Ouro e Ciclo do Ferro
O fim do reinado do construtor de Mafra (1750) ocorre três anos antes das primeiras fundições de ferro mediante a aplicação da hulha (1753). Termina o ciclo do ouro para iniciar-se o ciclo do ferro. Estabelece-se inevitável fatalidade económica: as nações que tiveram ferro terão ouro. E a recíproca: as que tiveram ouro, não tendo ferro, perderão o ouro através das transacções comerciais para as que tiverem ferro. O ferro é a máquina, é a indústria, é o transporte e, sobretudo, é o navio.
D. João V, até no estilo da sua mobília e na exuberância da arte barroca, marca o apogeu do ciclo do ouro. O reinado seguinte (D. José) assinala o declínio da economia portuguesa, assim como de todas as nações dependentes das máquinas de outras. Os esforços de Pombal para industrializar o país tornam-se improfícuos, e tanto assim que, ao assumir o governo a rainha D. Maria I, é desesperadora a situação das finanças públicas (2), exactamente como em França onde o financista Necker luta de balde para restabelecer o equilíbrio financeiro, originado pelas mesmas causas e falseado pelos caluniadores de Luís XVI. O reinado daquela soberana e o de seu filho, o arguto D. João VI, constituem economicamente um drama que ainda não foi posto em foco: o da transição do poder do ouro para o poder do ferro, seguida, no período constitucional de D. Maria II, pela substituição do agente meteorológico no sistema de navegação pelo agente geológico, ou seja, a queda, do poder marítimo português por depender da hulha e do ferro de outras nações.
No fim do reinado de D. Maria I surgiu a Economia Política de Adam Smith baseada nas leis naturais de oferta e procura, portanto aparentemente humanitária, mas no fundo favorecendo as nações detentoras dos melhores meios de produção industrial. O facto é eloquentíssimo, pois marca a translação do sentido espiritualista da Economia baseada no livre arbítrio dos dirigentes perante Deus pelo bem estar do povo, para o sentido materialista baseado no determinismo dos fenómenos da produção e do consumo, sem nenhuma consideração pelas consequências do desequilíbrio social e internacional.
Essa doutrina (3) enriqueceu as classes burguesas e os países de concentração industrial e reactivou as ideias revolucionárias, agora também baseadas nas leis da evolução consoante ensinaram Sorel e Marx; por outro lado, favorecendo os grupos étnicos que assentaram a prosperidade nos recursos siderúrgicos, suscitou a teoria da superioridade racial dos menos pigmentados.
Coincidindo ter sido entre estes que se originaram a reforma religiosa, o naturalismo filosófico, o experimentalismo, o criticismo, o positivismo, o agnosticismo e finalmente, o pragmatismo, concluiu-se que um dos índices da inferioridade rácica repontava nos caracteres místicos e principalmente católicos, logo designados pelos escritores do nosso próprio grémio, com os epítetos de «fanatismo supersticioso», «vícios educacionais», «obscurantismo fradesco», «ultramontanismo clerical».
16 - A Cegueira do Fanatismo Anti-Católico
Nunca tínhamos reparado que essa propaganda visava arrebatar-nos a defesa contra o predomínio imperialista e a absorção económica por parte de povos mais aquinhoados de instrumentos geológicos de produção, os quais necessitavam explicar a desigualdade das nações pelo determinismo da selecção dos mais aptos.
Foi a obra nefasta que inoculou em nações, cheias de força intelectual e moral, o veneno do desânimo, o vírus do fatalismo e a convicção de que nada mais podiam aspirar no desempenho de nobres missões no mundo.
Denegriu-se a memória dos reis; inventaram-se lendas contra os jesuítas e a opressão dos padres, enquanto, incoerentemente, se erguiam glorificações ao precursor e mestre dos ditadores do nosso tempo... Acusava-se a Igreja de inimiga da ciência e entoavam-se loas a Voltaire, esquecendo-se os turiferários de que este ridicularisara, por exemplo, as primeiras revelações da paleontologia metendo à bulha os sábios do seu tempo. Clamava-se que a Inquisição queimara cientistas na fogueira (o que não é verdade) mas a morte de Lavoisier, fundador da química, levado à guilhotina pelos ateus da Revolução Francesa, não merecia o menor comentário.
Assim procedendo, enfraquecíamos as raízes das nossas Pátrias, dando curso ao materialismo dentro de cujas ideias se justificavam as nossas escravizações nacionais aos povos que Frederico Nieztsche denomina orgulhosamente «povos hiperbóreos».
Notas:
(1) Veja-se o livro de Pires do Rio O combustível na economia mundial, livro que deveria ser lido por todos os portugueses e brasileiros.
(2) Caetano Beirão, no seu D. Maria II.
(3) Alberto Torres, o ilustre sociólogo brasileiro (não confundir com o jornalista António Torres) tecendo um hino ao valor da raça lusitana, critica acerbamente no seu livro O problema nacional brasileiro a deplorável atitude daqueles que aceitam as doutrinas contrárias aos interesses supremos da sua Pátria, doutrinas essas que são propagadas, diz ele, por nossos inimigos e que nós perfilhamos inconscientemente.
(In Plínio Salgado, O Rei dos Reis e Mensagens ao Mundo Lusíada, Lisboa, Ed. Pro Domo, 1945.) Editado no fórum «Unica Semper Avis» por Filipe Cordeiro.
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14 - Confraternização das Raças e Unidade Católica
Hoje compreendemos melhor tão grande símbolo, depois das falsas teorias das superioridade étnicas e do desprezo que os povos do norte do planeta têm votado aos meridionais, acusando principalmente as nações latinas de decadentes, por se conservarem católicas e, em consequência do catolicismo, não se haverem premunido contra o igualitarismo racial, o que levam à conta de detrimento do tipo antropológico de teor ariano.
O progresso material dos grupos germânicos e anglo-saxões na faixa do globo melhor aquinhoada em hulha, levou certos teoristas a esquecer a posição industrial e militar secundária dos escandinavos, dos canadenses e dos povos despigmentados que se fixaram em regiões sem combustíveis minerais, para só considerarem como símile de atraso os latinos e outras famílias humanas que não puderam acompanhar o ritmo do desenvolvimento industrial do século XIX, por não possuírem carvão de pedra, e só por isso (1).
A confusão lançada nas inteligências pelos teóricos ao serviço das nações hulheiras criou nos povos desprovidos de possibilidades siderúrgicas um complexo de inferioridade tão deprimente que a si próprios se passam certidão de invalidez e de óbito moral. Esse estado de espírito levou seus intelectuais a pesquisar as causas da decadência nacional e, de tudo cogitando, menos da causa verdadeira, não faltaram os que responsabilizassem o obscurantismo dos reis, a opressão do clero, as peias dos costumes católicos pelo atraso e pobreza das nações. A História Portuguesa, assim como a Brasileira, foi falseada, desde o reinado de D. João V, até os nossos dias.
15 - Ciclo do Ouro e Ciclo do Ferro
O fim do reinado do construtor de Mafra (1750) ocorre três anos antes das primeiras fundições de ferro mediante a aplicação da hulha (1753). Termina o ciclo do ouro para iniciar-se o ciclo do ferro. Estabelece-se inevitável fatalidade económica: as nações que tiveram ferro terão ouro. E a recíproca: as que tiveram ouro, não tendo ferro, perderão o ouro através das transacções comerciais para as que tiverem ferro. O ferro é a máquina, é a indústria, é o transporte e, sobretudo, é o navio.
D. João V, até no estilo da sua mobília e na exuberância da arte barroca, marca o apogeu do ciclo do ouro. O reinado seguinte (D. José) assinala o declínio da economia portuguesa, assim como de todas as nações dependentes das máquinas de outras. Os esforços de Pombal para industrializar o país tornam-se improfícuos, e tanto assim que, ao assumir o governo a rainha D. Maria I, é desesperadora a situação das finanças públicas (2), exactamente como em França onde o financista Necker luta de balde para restabelecer o equilíbrio financeiro, originado pelas mesmas causas e falseado pelos caluniadores de Luís XVI. O reinado daquela soberana e o de seu filho, o arguto D. João VI, constituem economicamente um drama que ainda não foi posto em foco: o da transição do poder do ouro para o poder do ferro, seguida, no período constitucional de D. Maria II, pela substituição do agente meteorológico no sistema de navegação pelo agente geológico, ou seja, a queda, do poder marítimo português por depender da hulha e do ferro de outras nações.
No fim do reinado de D. Maria I surgiu a Economia Política de Adam Smith baseada nas leis naturais de oferta e procura, portanto aparentemente humanitária, mas no fundo favorecendo as nações detentoras dos melhores meios de produção industrial. O facto é eloquentíssimo, pois marca a translação do sentido espiritualista da Economia baseada no livre arbítrio dos dirigentes perante Deus pelo bem estar do povo, para o sentido materialista baseado no determinismo dos fenómenos da produção e do consumo, sem nenhuma consideração pelas consequências do desequilíbrio social e internacional.
Essa doutrina (3) enriqueceu as classes burguesas e os países de concentração industrial e reactivou as ideias revolucionárias, agora também baseadas nas leis da evolução consoante ensinaram Sorel e Marx; por outro lado, favorecendo os grupos étnicos que assentaram a prosperidade nos recursos siderúrgicos, suscitou a teoria da superioridade racial dos menos pigmentados.
Coincidindo ter sido entre estes que se originaram a reforma religiosa, o naturalismo filosófico, o experimentalismo, o criticismo, o positivismo, o agnosticismo e finalmente, o pragmatismo, concluiu-se que um dos índices da inferioridade rácica repontava nos caracteres místicos e principalmente católicos, logo designados pelos escritores do nosso próprio grémio, com os epítetos de «fanatismo supersticioso», «vícios educacionais», «obscurantismo fradesco», «ultramontanismo clerical».
16 - A Cegueira do Fanatismo Anti-Católico
Nunca tínhamos reparado que essa propaganda visava arrebatar-nos a defesa contra o predomínio imperialista e a absorção económica por parte de povos mais aquinhoados de instrumentos geológicos de produção, os quais necessitavam explicar a desigualdade das nações pelo determinismo da selecção dos mais aptos.
Foi a obra nefasta que inoculou em nações, cheias de força intelectual e moral, o veneno do desânimo, o vírus do fatalismo e a convicção de que nada mais podiam aspirar no desempenho de nobres missões no mundo.
Denegriu-se a memória dos reis; inventaram-se lendas contra os jesuítas e a opressão dos padres, enquanto, incoerentemente, se erguiam glorificações ao precursor e mestre dos ditadores do nosso tempo... Acusava-se a Igreja de inimiga da ciência e entoavam-se loas a Voltaire, esquecendo-se os turiferários de que este ridicularisara, por exemplo, as primeiras revelações da paleontologia metendo à bulha os sábios do seu tempo. Clamava-se que a Inquisição queimara cientistas na fogueira (o que não é verdade) mas a morte de Lavoisier, fundador da química, levado à guilhotina pelos ateus da Revolução Francesa, não merecia o menor comentário.
Assim procedendo, enfraquecíamos as raízes das nossas Pátrias, dando curso ao materialismo dentro de cujas ideias se justificavam as nossas escravizações nacionais aos povos que Frederico Nieztsche denomina orgulhosamente «povos hiperbóreos».
Notas:
(1) Veja-se o livro de Pires do Rio O combustível na economia mundial, livro que deveria ser lido por todos os portugueses e brasileiros.
(2) Caetano Beirão, no seu D. Maria II.
(3) Alberto Torres, o ilustre sociólogo brasileiro (não confundir com o jornalista António Torres) tecendo um hino ao valor da raça lusitana, critica acerbamente no seu livro O problema nacional brasileiro a deplorável atitude daqueles que aceitam as doutrinas contrárias aos interesses supremos da sua Pátria, doutrinas essas que são propagadas, diz ele, por nossos inimigos e que nós perfilhamos inconscientemente.
(In Plínio Salgado, O Rei dos Reis e Mensagens ao Mundo Lusíada, Lisboa, Ed. Pro Domo, 1945.) Editado no fórum «Unica Semper Avis» por Filipe Cordeiro.