O Integralismo Lusitano incomodou Aquilino Ribeiro
Na obra Arcanjo Negro, um romance que reconstrói acontecimentos à roda do 28 de Maio de 1926 (a acção no Arcanjo Negro continua Mónica, de 1925 a 1929), Aquilino tentou transmitir uma ideia negativa do Integralismo. Na sua prosa travam diálogo a personagem principal, Ricardo Tavarede, e o seu primo, Filipe Alvarenga, uma espécie de alter-ego de Ricardo.
Aí afirma Filipe:
“Vai-te para o Diabo! Imaginas que estás na Brasileira a deitar piada! Felizmente a nação e a raça vão passando de saúde como as caravanas. Uma conta à beira de oitocentos anos e porque os conta tem seiva própria, cerne próprio e individualidade na floresta dos povos; a outra irradiou pelo mundo, tendo criado um instrumento inigualável de cultura que é a língua, e a sua imortalidade está nos impérios que fundou, não precisando mais do que o Brasil no testamento. Espíritos como o teu, satânicos e furta-cores, é que estabelecem a confusão... levam a duvidar. Diz lá: não é Portugal um país de agricultores?... De marinheiros?... Diz?... Equilíbrios por um lado, aventura por outro. Africanos, latinos, bárbaros do Norte, árabes deviam ter caldeado no jazigo étnico como escórias no cadinho. Por outra, à beira do Atlântico o português não foi a sentinela da Europa contra o muçulmano, de modo geral contra o asiático? Simbolizar o nosso génio é pôr em evidência esses valores históricos, valores de sobejo para ter existência própria, carácter próprio, vender e dar glória, blasonar de quem nos pede a razão de ser.”
Ricardo Tavarede objecta: “Já ouvi isso a uma pseudodoutrina nacionalista mascavada de maurraísmo, saudosismo, miguelismo e patetismo chamada integralismo.”
Aquilino Ribeiro conhecia os integralistas, tendo participado na efémera revista Homens Livres - Livres da Finança & dos Partidos, em 1923, onde se juntaram seareiros e integralistas por poucas semanas. Em 1940, esta caricatura e ataque ao Integralismo, chegando ao "patetismo", revela-nos uma persistente aversão e incómodo.
Não era a primeira vez que o tema do multiracialismo imperial português perturbava Aquilino. Precisamente na revista Homens Livres, em acentuado contraste com a perspectiva dos integralistas, que acolhiam no ser português uma elevada visão universalista, em linha do que viria ser a perspectiva luso-tropicalista de Gilberto Freire (O mundo que o português criou, 1940), desenvolvida em reação às teses das superioridade raciais da época , então moeda corrente na Alemanha do Nazismo. Palavras de Aquilino, em 1923:
a “raça (portuguesa) desce a vertente rápida do seu aniquilamento”, acrescentando: “A raça, na sua maioria, é constituída por impaludados e luxuriosos, - impaludismo que a migração secular trouxe ao sangue português, e luxúria que, mercê do clima, educação sexual, cruzamento com outras raças inferiores, se infiltrou também no sangue da grei.” (Aquilino Ribeiro, "Em torno do problema da raça", Homens Livres, nº 1, 1 de Dezembro de 1923, p. 14).
É possível que nessas palavras de Aquilino Ribeiro estivesse um eco das teses do “nacionalismo rácico” (ou étnico) do republicano Teófilo Braga, ou mesmo de um Oliveira Martins, a quem repugnava a ideia de que Portugal pudesse ser uma “nação mestiça”. A apreciação racista de Aquilino era moeda corrente no ambiente colonialista da 1ª República (foi então que se começou a levantar o problema da assimilação jurídica das populações indígenas dos territórios de África), mas não deixava de levantar ali um forte pomo de discórdia com os integralistas, para quem Portugal era e devia permanecer uma Nação plurirracial e pluricontinental.
No início dos anos de 1940, ao escrever o Arcanjo Negro, a história de cruzamento da "raça" portuguesa "com outras raças inferiores", continuava manifestamente a perturbar Aquilino Ribeiro.
Aí afirma Filipe:
“Vai-te para o Diabo! Imaginas que estás na Brasileira a deitar piada! Felizmente a nação e a raça vão passando de saúde como as caravanas. Uma conta à beira de oitocentos anos e porque os conta tem seiva própria, cerne próprio e individualidade na floresta dos povos; a outra irradiou pelo mundo, tendo criado um instrumento inigualável de cultura que é a língua, e a sua imortalidade está nos impérios que fundou, não precisando mais do que o Brasil no testamento. Espíritos como o teu, satânicos e furta-cores, é que estabelecem a confusão... levam a duvidar. Diz lá: não é Portugal um país de agricultores?... De marinheiros?... Diz?... Equilíbrios por um lado, aventura por outro. Africanos, latinos, bárbaros do Norte, árabes deviam ter caldeado no jazigo étnico como escórias no cadinho. Por outra, à beira do Atlântico o português não foi a sentinela da Europa contra o muçulmano, de modo geral contra o asiático? Simbolizar o nosso génio é pôr em evidência esses valores históricos, valores de sobejo para ter existência própria, carácter próprio, vender e dar glória, blasonar de quem nos pede a razão de ser.”
Ricardo Tavarede objecta: “Já ouvi isso a uma pseudodoutrina nacionalista mascavada de maurraísmo, saudosismo, miguelismo e patetismo chamada integralismo.”
Aquilino Ribeiro conhecia os integralistas, tendo participado na efémera revista Homens Livres - Livres da Finança & dos Partidos, em 1923, onde se juntaram seareiros e integralistas por poucas semanas. Em 1940, esta caricatura e ataque ao Integralismo, chegando ao "patetismo", revela-nos uma persistente aversão e incómodo.
Não era a primeira vez que o tema do multiracialismo imperial português perturbava Aquilino. Precisamente na revista Homens Livres, em acentuado contraste com a perspectiva dos integralistas, que acolhiam no ser português uma elevada visão universalista, em linha do que viria ser a perspectiva luso-tropicalista de Gilberto Freire (O mundo que o português criou, 1940), desenvolvida em reação às teses das superioridade raciais da época , então moeda corrente na Alemanha do Nazismo. Palavras de Aquilino, em 1923:
a “raça (portuguesa) desce a vertente rápida do seu aniquilamento”, acrescentando: “A raça, na sua maioria, é constituída por impaludados e luxuriosos, - impaludismo que a migração secular trouxe ao sangue português, e luxúria que, mercê do clima, educação sexual, cruzamento com outras raças inferiores, se infiltrou também no sangue da grei.” (Aquilino Ribeiro, "Em torno do problema da raça", Homens Livres, nº 1, 1 de Dezembro de 1923, p. 14).
É possível que nessas palavras de Aquilino Ribeiro estivesse um eco das teses do “nacionalismo rácico” (ou étnico) do republicano Teófilo Braga, ou mesmo de um Oliveira Martins, a quem repugnava a ideia de que Portugal pudesse ser uma “nação mestiça”. A apreciação racista de Aquilino era moeda corrente no ambiente colonialista da 1ª República (foi então que se começou a levantar o problema da assimilação jurídica das populações indígenas dos territórios de África), mas não deixava de levantar ali um forte pomo de discórdia com os integralistas, para quem Portugal era e devia permanecer uma Nação plurirracial e pluricontinental.
No início dos anos de 1940, ao escrever o Arcanjo Negro, a história de cruzamento da "raça" portuguesa "com outras raças inferiores", continuava manifestamente a perturbar Aquilino Ribeiro.