Ao Princípio era o Verbo
António Sardinha
Neste livro, António Sardinha reune "algumas páginas de forte e sincera campanha nacionalista" (p. ix).
A "ideia-madre" do Integralismo Lusitano - a defesa de um "regresso da sociedade portuguesa às condições naturais da sua formação e desenvolvimento" - é explicitada desde a abertura (p.ix).
António Sardinha (re) afirma o seu tradicionalismo contra-revolucionário, acolhendo a herança dos "Vencidos da Vida" em prol de um "reaportuguesamento Portugal" ao serviço da cristandade Ocidental:
"Se o mal de que Portugal enferma deriva da influência desenraizadora da Revolução [Francesa, 1789], destruir sistematicamente semelhante influência deve ser para quantos trabalham com a pena a mais empenhada das suas preocupações. Carecemos de reparar, no doloroso momento de transição que se atravessa, o erro herdado das gerações que nos antecederam. Cabe-nos melhor de que a ninguém o grande ensinamento do neto de Renan: - "é preciso tomar o partido dos nossos Maiores contra o partido de nossos Pais". Tomar o partido dos nossos Maiores é reconciliar-nos com a essência eterna da Pátria, - é integrar-nos na sequência tradicional do nosso passado de ocidentais e de portugueses." (p. xii)
A definição do seu nacionalismo é preocupação central do prefácio ("Ao Princípio era o Verbo", pp. ix-xxii), aí distinguindo três espécies: (1) o nacionalismo “da sôfrega dilatação que, de nacionalismo, se torna depressa em perturbadora exaltação imperialista” (o Fascismo triunfara recentemente em Roma); (2) o nacionalismo que, a exemplo da Suíça, quer ser “placa giratória” da Europa, e “não ambiciona para Portugal outras vantagens que não sejam as de um turismo promissor e condescendente”; e (3) o "nacionalismo esclarecido pelo tradicionalismo" - o seu nacionalismo - que identifica como "católico romano", apto a “reconstruir uma ordem internacional em que todas as pátrias, pequenas ou grandes, se achem naturalmente enlaçadas por uma finalidade comum.” (p. xvi)
Dizer "ao princípio era o Verbo" é "confessar o Verbo ao princípio de todas coisas, é confessar o Espírito dirigindo o Mundo" (p. xi).
António Sardinha escrevia em Fevereiro de 1923, na Quinta do Bispo, em Elvas, mas como que pressentindo já o aproximar de uma nova hecatombe europeia:
“Urge que, na floresta espessa dos mitos e superstições dominantes, nos não abandonemos cegamente ao encanto bárbaro da aspiração nacionalista. Acentuamos "encanto bárbaro", porque, na sua ansia impetuosa há na aspiração nacionalista que desvaira a Europa uma força de agressividade primitiva, - um total olvido da harmonia que é imperioso restabelecer nas relações dos povos, como assento sólido da Cidade-de-Deus”. (pp. xiii-xiv)
Na perspectiva de António Sardinha, "se em relação a cada pátria, o tradicionalismo supõe um nacionalismo, supõe também, em relação ao grande conjunto humano, um universalismo". (p. xiv).
Ao elucidar o seu Nacionalismo através do Universalismo, Sardinha aborda o tema da Fé e o Império e o lugar de Portugal na Civilização Ocidental.
Sardinha refere-se à divisão que H. G. Wells estabelecia entre dois tipos de mentalidade humana – a mentalidade ocidental (o “homem legislativo”, edificador, dinâmico, impulsionador, revolucionário) e a mentalidade oriental (o “homem legal”, sem preocupação pelo futuro, sempre identificado com as situações criadas, conservador), contestando-a: “Atacado da avariose filosófica dos nossos tempos”, Wells esquece que esse “revolucionário” é, fundamentalmente, uma energia empenhada em subjugar o “relativo” e, por consequência, em “aprisioná-lo no individualismo das formas imediatas”, ou seja, na “legalidade” (p. xix).
O capitalismo levara a sociedade do “estado pré-económico” para o “estado-económico”. Na perspetiva de Sardinha, a mentalidade burguesa da Revolução conduzira-nos a uma “encruzilhada sinistra” - individualista, cujo objectivo é o de obter a posse completa do “relativo”. Caber-nos-ia a nós, hispânicos – portugueses e espanhóis -, o papel do autêntico “homem ocidental”, na dupla posição de anti modernos e de ultramodernos: a nossa reação à modernidade colocava-nos para além da modernidade. Nos hispânicos se encontrava “a recusa de uma fácil acomodação aos limites quotidianos da Existência, - aos aspetos utilitários e materiais. A loucura de D. Quixote volve-se assim numa paixão, com tanto de dolorosa como de sublime!(pp. xx-xxi). Para Sardinha, o “elaborador constante do futuro” seria o hispânico, pelo seu apego a uma “conceção absoluta da Vida”, com “total desprezo pela ideia legal do Universo”.
A sua prosa é sempre de combate, nascida no tumulto de uma trincheira. Os textos aqui reunidos não constituem excepção, com o explicito propósito de "alimentar e desenvolver uma mística". Segundo Sardinha, em Portugal respirava-se uma atmosfera de permanente intoxicação mental, pelo que interrogava - “como romper caminho, como ganhar desafogo para a respiração, senão gritando, senão protestando, senão demolindo?”
[J.M.Q.]
A "ideia-madre" do Integralismo Lusitano - a defesa de um "regresso da sociedade portuguesa às condições naturais da sua formação e desenvolvimento" - é explicitada desde a abertura (p.ix).
António Sardinha (re) afirma o seu tradicionalismo contra-revolucionário, acolhendo a herança dos "Vencidos da Vida" em prol de um "reaportuguesamento Portugal" ao serviço da cristandade Ocidental:
"Se o mal de que Portugal enferma deriva da influência desenraizadora da Revolução [Francesa, 1789], destruir sistematicamente semelhante influência deve ser para quantos trabalham com a pena a mais empenhada das suas preocupações. Carecemos de reparar, no doloroso momento de transição que se atravessa, o erro herdado das gerações que nos antecederam. Cabe-nos melhor de que a ninguém o grande ensinamento do neto de Renan: - "é preciso tomar o partido dos nossos Maiores contra o partido de nossos Pais". Tomar o partido dos nossos Maiores é reconciliar-nos com a essência eterna da Pátria, - é integrar-nos na sequência tradicional do nosso passado de ocidentais e de portugueses." (p. xii)
A definição do seu nacionalismo é preocupação central do prefácio ("Ao Princípio era o Verbo", pp. ix-xxii), aí distinguindo três espécies: (1) o nacionalismo “da sôfrega dilatação que, de nacionalismo, se torna depressa em perturbadora exaltação imperialista” (o Fascismo triunfara recentemente em Roma); (2) o nacionalismo que, a exemplo da Suíça, quer ser “placa giratória” da Europa, e “não ambiciona para Portugal outras vantagens que não sejam as de um turismo promissor e condescendente”; e (3) o "nacionalismo esclarecido pelo tradicionalismo" - o seu nacionalismo - que identifica como "católico romano", apto a “reconstruir uma ordem internacional em que todas as pátrias, pequenas ou grandes, se achem naturalmente enlaçadas por uma finalidade comum.” (p. xvi)
Dizer "ao princípio era o Verbo" é "confessar o Verbo ao princípio de todas coisas, é confessar o Espírito dirigindo o Mundo" (p. xi).
António Sardinha escrevia em Fevereiro de 1923, na Quinta do Bispo, em Elvas, mas como que pressentindo já o aproximar de uma nova hecatombe europeia:
“Urge que, na floresta espessa dos mitos e superstições dominantes, nos não abandonemos cegamente ao encanto bárbaro da aspiração nacionalista. Acentuamos "encanto bárbaro", porque, na sua ansia impetuosa há na aspiração nacionalista que desvaira a Europa uma força de agressividade primitiva, - um total olvido da harmonia que é imperioso restabelecer nas relações dos povos, como assento sólido da Cidade-de-Deus”. (pp. xiii-xiv)
Na perspectiva de António Sardinha, "se em relação a cada pátria, o tradicionalismo supõe um nacionalismo, supõe também, em relação ao grande conjunto humano, um universalismo". (p. xiv).
Ao elucidar o seu Nacionalismo através do Universalismo, Sardinha aborda o tema da Fé e o Império e o lugar de Portugal na Civilização Ocidental.
Sardinha refere-se à divisão que H. G. Wells estabelecia entre dois tipos de mentalidade humana – a mentalidade ocidental (o “homem legislativo”, edificador, dinâmico, impulsionador, revolucionário) e a mentalidade oriental (o “homem legal”, sem preocupação pelo futuro, sempre identificado com as situações criadas, conservador), contestando-a: “Atacado da avariose filosófica dos nossos tempos”, Wells esquece que esse “revolucionário” é, fundamentalmente, uma energia empenhada em subjugar o “relativo” e, por consequência, em “aprisioná-lo no individualismo das formas imediatas”, ou seja, na “legalidade” (p. xix).
O capitalismo levara a sociedade do “estado pré-económico” para o “estado-económico”. Na perspetiva de Sardinha, a mentalidade burguesa da Revolução conduzira-nos a uma “encruzilhada sinistra” - individualista, cujo objectivo é o de obter a posse completa do “relativo”. Caber-nos-ia a nós, hispânicos – portugueses e espanhóis -, o papel do autêntico “homem ocidental”, na dupla posição de anti modernos e de ultramodernos: a nossa reação à modernidade colocava-nos para além da modernidade. Nos hispânicos se encontrava “a recusa de uma fácil acomodação aos limites quotidianos da Existência, - aos aspetos utilitários e materiais. A loucura de D. Quixote volve-se assim numa paixão, com tanto de dolorosa como de sublime!(pp. xx-xxi). Para Sardinha, o “elaborador constante do futuro” seria o hispânico, pelo seu apego a uma “conceção absoluta da Vida”, com “total desprezo pela ideia legal do Universo”.
A sua prosa é sempre de combate, nascida no tumulto de uma trincheira. Os textos aqui reunidos não constituem excepção, com o explicito propósito de "alimentar e desenvolver uma mística". Segundo Sardinha, em Portugal respirava-se uma atmosfera de permanente intoxicação mental, pelo que interrogava - “como romper caminho, como ganhar desafogo para a respiração, senão gritando, senão protestando, senão demolindo?”
[J.M.Q.]
SEJA EM LOUVOR DAQUELA OBSCURA ESPERANÇA
QUE DOS MEUS MORTOS HERDEI
E, CREPITANTE, COMUNICO
A QUEM A SOUBER ACOLHER!
QUE DOS MEUS MORTOS HERDEI
E, CREPITANTE, COMUNICO
A QUEM A SOUBER ACOLHER!