António Sardinha - “Mais longe ainda!” (1923) in “A Prol do Comum..." - Doutrina e História, Lisboa, Livraria Ferin, 1934, pp. 253-266
António Sardinha perante o recente triunfo de Mussolini em Itália e de Miguel Primo de Rivera em Espanha (1923)
Perante o recente triunfo de Benito Mussolini em Itália, António Sardinha assinala nele uma "febre nacionalista" (em Ao Princípio era o Verbo será mais explicito quanto à espécie de nacionalismo que detectava em Roma) ainda com algo de misterioso - eram “as primeiras estrofes de um ritmo que ainda de leve se entende”. Sardinha considera que falta a Mussolini “o sentido orgânico de uma doutrina” - referindo-o por duas vezes neste texto e colocando a palavra “doutrina” em itálico – mas saúda com otimismo o seu triunfo por ver nele uma prova de que a decadência do Ocidente latino, vaticinada pelos germânicos Oswald Spengler e conde de Keyserling, não se estava a materializar. O seu entusiasmo em torno da ideia de um Chefe, não devia ser entendido como uma subordinação à “simples imposição materialista de qualquer pretoriano, mordido de cesarite aguda”. O triunfo de Mussolini em Itália e de Miguel Primo de Rivera em Espanha, não sendo a vitória do "sentido orgânico duma doutrina" - que faltava a ambos - era entendido como “uma soberba e convincente demonstração (...) de que o Ocidente não morreu...”. (pp. 255-256)
Perante o recente triunfo de Benito Mussolini em Itália, António Sardinha assinala nele uma "febre nacionalista" (em Ao Princípio era o Verbo será mais explicito quanto à espécie de nacionalismo que detectava em Roma) ainda com algo de misterioso - eram “as primeiras estrofes de um ritmo que ainda de leve se entende”. Sardinha considera que falta a Mussolini “o sentido orgânico de uma doutrina” - referindo-o por duas vezes neste texto e colocando a palavra “doutrina” em itálico – mas saúda com otimismo o seu triunfo por ver nele uma prova de que a decadência do Ocidente latino, vaticinada pelos germânicos Oswald Spengler e conde de Keyserling, não se estava a materializar. O seu entusiasmo em torno da ideia de um Chefe, não devia ser entendido como uma subordinação à “simples imposição materialista de qualquer pretoriano, mordido de cesarite aguda”. O triunfo de Mussolini em Itália e de Miguel Primo de Rivera em Espanha, não sendo a vitória do "sentido orgânico duma doutrina" - que faltava a ambos - era entendido como “uma soberba e convincente demonstração (...) de que o Ocidente não morreu...”. (pp. 255-256)
Perante a capitulação inesperada dos depositários da herança vencida pela intervenção estrangeira sobre a colina de Évora-Monte, dir-se-ia que apenas nos restava, ou capitular também, ou retirar-nos da liça, emudecendo para sempre. Louvores a Deus, não emudámos, nem capitulámos! (pp. 253-254)
[há aqui referência ao que poderia ser uma dupla capitulação: após a aceitação da derrota das forças portuguesas pelo rei D. Miguel, perante a superior força militar da intervenção estrangeira na guerra civil que culminou em Évora Monte, em 1834, ter-se-ia dado uma segunda capitulação pelos depositários dessa herança no "Pacto de Paris", em 17 de Abril de 1922]
[há aqui referência ao que poderia ser uma dupla capitulação: após a aceitação da derrota das forças portuguesas pelo rei D. Miguel, perante a superior força militar da intervenção estrangeira na guerra civil que culminou em Évora Monte, em 1834, ter-se-ia dado uma segunda capitulação pelos depositários dessa herança no "Pacto de Paris", em 17 de Abril de 1922]
"Quando Deus apaga, é que Ele quer construir", - proclamava Joseph de Maistre.
“Coube à Itália romper a jornada sonhada por nós para Portugal. E tão depressa os loureiros romanos acolheram na sua sombra patrícia os legionários audazes do Fascio, toda a sagrada terra latina "Giovinezza! Giovinezza! Primavera di belleza!" Sacudindo o seu marasmo centenário, o Ocidente acordava para as sugestões exaltadoras do futuro, desmentindo aqueles que lá dos nevoeiros densos da Germânia, por boca de Oswald Spengler e do conde de Keyserling, anunciavam a fatalidade da sua decadência. A febre nacionalista, escachoando como uma força bárbara, acordou por sobre o Mediterrâneo o cantar extinto das sereias. Bem cedo a Cruz a batizou, - à epopeia recém-nascida, em que já se coalham, com acentos de bronze e ouro, as primeiras estrofes de um ritmo que ainda de leve se entende, mas a cuja sedução ninguém, com raça nas veias e com Cristo na alma, poderá, em verdade, resistir! O que nós quiséramos para Portugal, pôde Mussolini empreendê-lo. Empreendê-lo, não como doutrina, mas como uma soberba e convincente demonstração pelo facto de que o Ocidente não morreu e de que na sua volta às virtudes clássicas do Poder reside o segredo do seu inevitável ressurgimento.
Retardada no andamento regular da sua aparição, a nossa revista [Nação Portuguesa], ao encerrar-se a segunda série, reconforta-se, para maiores caminhadas, com a vitória de Mussolini. Enche-nos essa vitória de animadoras certezas, tanto mais que na vizinha Espanha um ditador se levanta também e com gentil bravura liberta a Realeza dos vergonhosos compromissos partidários que a diminuíam e manietavam. Quando enfileiramos com tão chamejante entusiasmo em torno da ideia de um Chefe, escusado é declarar que não nos subordinamos à simples imposição materialista de qualquer pretoriano, mordido de cesarite aguda. Saudamos no Chefe, ou seja, Rei, ou Ditador, o realizador necessário das aspirações de resgate já tão abertas na alma dos povos ocidentais, despertados enfim, dum pesadelo trágico de cem anos. Deste modo, civil um, o outro militar, [Miguel] Primo de Rivera é bem irmão de Mussolini na mesma ânsia que o impulsiona e conduz. Falta-lhe, como a Mussolini falta, o sentido orgânico duma doutrina. Mas não falta a ambos um instinto apurado de arquitecto, - e vê-mo-los depressa ocupar no agradecimento dos seus concidadãos o lugar que na Bíblia ocupam os antigos fundadores de Cidades."
(pp. 255-256; negritos acrescentados)
Retardada no andamento regular da sua aparição, a nossa revista [Nação Portuguesa], ao encerrar-se a segunda série, reconforta-se, para maiores caminhadas, com a vitória de Mussolini. Enche-nos essa vitória de animadoras certezas, tanto mais que na vizinha Espanha um ditador se levanta também e com gentil bravura liberta a Realeza dos vergonhosos compromissos partidários que a diminuíam e manietavam. Quando enfileiramos com tão chamejante entusiasmo em torno da ideia de um Chefe, escusado é declarar que não nos subordinamos à simples imposição materialista de qualquer pretoriano, mordido de cesarite aguda. Saudamos no Chefe, ou seja, Rei, ou Ditador, o realizador necessário das aspirações de resgate já tão abertas na alma dos povos ocidentais, despertados enfim, dum pesadelo trágico de cem anos. Deste modo, civil um, o outro militar, [Miguel] Primo de Rivera é bem irmão de Mussolini na mesma ânsia que o impulsiona e conduz. Falta-lhe, como a Mussolini falta, o sentido orgânico duma doutrina. Mas não falta a ambos um instinto apurado de arquitecto, - e vê-mo-los depressa ocupar no agradecimento dos seus concidadãos o lugar que na Bíblia ocupam os antigos fundadores de Cidades."
(pp. 255-256; negritos acrescentados)
E ninguém imagine que nos seduz a estulta miragem dum retorno ao que, em fraseologia parlamentar, se entende por "situação" ou "governo" das "direitas"! O que marca a ditadura legalizada de Mussolini marca também o aprumo ditatorial de [Miguel] Primo de Rivera: - é a sua perfeita consciência de que o eixo das questões que avassalam na Europa a combalida carcassa do Estado se encontra nos conflitos do Trabalho e do Capital, - na subjugação cada vez mais opressiva das actividades produtoras à tirania dum argentarismo crescente e sem escrúpulos.
O que caracteriza, pois, o movimento fascista é o que caracteriza o movimento militar espanhol. Não é um partido que sobe às esferas da governação pública, suscitado por exigências torvas de repressão. É antes, e unicamente, uma obra de reparação e equilíbrio que se começa, um pouco cirurgicamente, é certo, usando-se de métodos adormecidos por uma longa época de sonâmbula e hipócrita legalidade. Gritam as "direitas", - gritam as "esquerdas". "Esquerdas" e "direitas" urge que desapareçam, porque são filhas do individualismo solto da Revolução [Francesa], - e a Revolução é a morte da alma centenária dos povos e a geradora da monstruosidade plutocrática dos tempos modernos, perante a qual, e esquecidas as regras divinas da Justiça, é quase de legítima defesa a monstruosidade bolchevista. (pp. 258-259)
Recolhidos ao castelo-interior da nossa doutrina, atirámos de novo a lume a Nação Portuguesa. Voltámos ao começo. E agora que a sua segunda série se fecha, decerto que não é escusado este exame de consciência.
...os exemplos da Itália e da Espanha abrem janelas no reduto fechado donde combatemos e dão-nos, mais forte e mais consistente, a convicção do nosso destino superior. Por nós, Portugal não morrerá! Não por nós, - caducos indivíduos de um momento, pó viajante que não demorará a juntar-se ao pó das gerações que transitaram! Mas pelo fermento que se agita nas nossas palavras, que se incendeia nos nossos corações e imprime às nossas artérias um "alerta" heróico e harmonioso. (pp. 262-263)
...os exemplos da Itália e da Espanha abrem janelas no reduto fechado donde combatemos e dão-nos, mais forte e mais consistente, a convicção do nosso destino superior. Por nós, Portugal não morrerá! Não por nós, - caducos indivíduos de um momento, pó viajante que não demorará a juntar-se ao pó das gerações que transitaram! Mas pelo fermento que se agita nas nossas palavras, que se incendeia nos nossos corações e imprime às nossas artérias um "alerta" heróico e harmonioso. (pp. 262-263)
- O que nos mata, o que nos abate, são as "direitas" - é o monarquismo tonto e exibicionista dos nossos salões... Aprendamos com a lição do Santo Condestável, unindo-se à arraia-miúda para lhe conferir direcção e finalidade, no momento em que as "direitas" do seu tempo - consinta-se a expressão - teimavam em amarrar Portugal a conceitos mortos, a posições já cadaverizadas! (p. 264)
E, atinando, por fim, com o segredo da sua consolidação, a República assenta à mesa, em que se está devorando a Riqueza Nacional, conservadores e jacobinos, reconciliados nos bastidores das Companhias e dos Bancos sobre esse suculento festim de Trimalcião.
... nós não levantaríamos nem o dedo mínimo, se salvar Portugal fosse salvar o conúbio apertado de plutocratas e arrivistas em que para nós se resumem, à luz da perfeita justiça, as "esquerdas" e as "direitas"!
(p. 265-266)
... nós não levantaríamos nem o dedo mínimo, se salvar Portugal fosse salvar o conúbio apertado de plutocratas e arrivistas em que para nós se resumem, à luz da perfeita justiça, as "esquerdas" e as "direitas"!
(p. 265-266)