Poder Local e Corpos Intermédios, segundo o Integralismo Lusitano
... o Povo é quem a si mesmo se administra por magistrados eleitos e delegados seus.. - Almeida Garrett
O Regionalismo, para ser eficaz e sério tem de ser precedido do Municipalismo, e nunca realizado ou imposto pelo Estado - António Jacinto Ferreira
Sem Poder Local não há nacionalidade nem cidadãos; não passamos todos de simples administrados pelos Partidos Políticos - Jean Madiran
O Regionalismo, para ser eficaz e sério tem de ser precedido do Municipalismo, e nunca realizado ou imposto pelo Estado - António Jacinto Ferreira
Sem Poder Local não há nacionalidade nem cidadãos; não passamos todos de simples administrados pelos Partidos Políticos - Jean Madiran
Em 18 de Outubro de 2001, Filipe Cordeiro apresentou no fórum do espaço Unica Semper Avis a seguinte mensagem, terminando com uma pergunta:
Há 2 ou 3 anos falou-se muito na "regionalização".
Uma lei de 1935 reconhecia a divisão do território nacional em províncias. Contudo nunca passou do papel, continuando os distritos civis a desempenhar o seu papel, apesar da falta de correspondência das fronteiras distritais às divisões naturais, históricas e etnográficas do país (por exemplo, o distrito de Setúbal que inclui concelhos alentejanos e da região de Lisboa, o distrito de Leiria que situa-se metade na Estremadura (região Oeste) e metade na Beira Litoral, etc.) As designações provinciais nunca passaram a uma realidade institucional e administrativa na época do Estado Novo. Os governantes actuais também apresentam planos regionalistas à medida dos interesses partidários (por exemplo, Mangualde e Nelas pertenceriam à Beira Litoral!).
Qual era a posição do integralismo/nacional-sindicalismo em relação ao papel legal-administrativo das províncias de Portugal, isto é, Estremadura, Beira Litoral, etc.?
A resposta foi a seguinte, em duas mensagens ( 21 e 22 de Outubro de 2001), que aqui se juntam na melhor ordem:
Caro Filipe Cordeiro,
No primeiro programa-índice do Integralismo Lusitano ( apresentado sob o título “Monarquia Orgânica, Tradicionalista, Anti-parlamentar”, publicado em 1914 na revista Nação Portuguesa), afirmava-se sob o título “TENDÊNCIA DESCENTRALIZADORA”, no “aspecto familiar administrativo”: “Família (...); Paróquia (...); Município (...) Província: câmara por delegação municipal, sindical, escolar” (etc.).
O aspecto essencial quanto à Província, para o Integralismo Lusitano, sempre foi o de considerar que este deveria ser uma delegação do município, segundo o conceito da “livre federação dos municípios”. O regionalismo, na perspectiva integralista, nunca deveria ser realizado ou imposto pelo poder central.
Como “textos de apoio”, deixo-lhe aqui dois excertos de um livro de António Jacinto Ferreira, Poder Local e Corpos Intermédios (Lisboa, 1987), onde a ideia se encontra doutrinariamente bem explanada nos seus fundamentos:
“Salta aos olhos que estas disposições estabelecidas por um Estado, não menos centralizador do que o anterior desaparecido em 25 de Abril de 1974, são apenas uma concessão ao reconhecidamente existente espírito tradicionalista, já fortemente oposicionista ao totalitarismo caído.
”As promessas de descentralização das democracias partidistas nunca vão além do palavreado estéril. A sua transformação em realidade implicaria a perda da chave do cofre das eleições gerais, sem a qual não se pode reter, e muito menos conquistar, o Poder e desfrutar das suas benesses.
”E, realmente, apesar das tímidas concessões efectuadas ao longo de doze anos [Jacinto Ferreira escrevia em 1986], os Partidos continuam a dominar a Governação local, em regime de quase exclusivismo legal. O sistema partidista não se pode dispensar de possuir a garantia dos votos, e para isso, domina as tentativas de ressurreição do Poder Local, colocando os Organismos naturais sob a dependência dos Governos, por intermédio dos Governadores Civis, autênticos sobas instalados nos diversos distritos, que ainda se mantêm integralmente, não obstante a tão falada regionalização. Do comportamento eleitoral dessas colectividades vigiadas se faz depender a realização dos indispensáveis e desejados melhoramentos locais, que assim passam a ser simples e proclamados favores dos agentes do partido que governa.
”As velhas liberdades tradicionais, ao invés de tudo isto, clamam que seja dado ao Município o que é do Município; à Região o que pertence à Região; ao Estado o que é da Nação.
"Apesar de todas as mesquinhas concessões feitas pelo Poder Central, sem dúvida vantajosas para o governo local dos povos, os núcleos populacionais que não deixam de as acolher com o maior interesse, não cessam de solicitar o seu integral e devido privilégio, reagindo assim contra um absolutismo pior do que o dos tempos idos, pois é absolutismo anónimo e irresponsável da chamada soberania popular, que assumiu forma jurídica do seu odioso e tirânico impersonalismo. Por isso já foi possível dizer-se que o Absolutismo não desapareceu em 1789. Foi transmitido integralmente ao chamado Povo Soberano. As autênticas liberdades opõem-se a que o Município seja considerado simples repartição do Poder Central, e muito menos que seja sua criação, com o carácter de mera circunscrição subordinada, tendo à frente, em muitos casos, funcionários administrativos ou delegados dos directórios dos Partidos.
”Há antagonismo irredutível e largamente reconhecido entre a mítica Liberdade e as verídicas liberdades locais e profissionais, cuja necessidade nem sempre é sentida com agudeza, pois só se manifesta quando a pessoa tem garantidas as exigências humanas mais prementes, como a subsistência, a segurança e o bem-estar.
”Assim, pode dizer-se que o homem só é realmente livre quando membro de comunidades cuja existência e actividades possam decidir em forma contrapartida, as quais por isso são levadas a velar zelosamente pela sua autonomia.
“Não há liberdade sem comunidade, como não há comunidade sem liberdade. Sociedade significa o respeito de todos por todos com responsabilidade de todos por todos e, por consequência, a vigência dos mesmos direitos fundamentais para todos. Liberdade significa responsabilidade pessoal e autónoma em todas as esferas vitais, com a participação em todos os regulamentos, que em cada uma delas afecta todos os membros da sociedade” (Ioanes Messner, La question sociale, Madrid, 1960)
(...)
”Alguns sociólogos usam linguagem diferente, ainda que o seu significado final seja equivalente.
”Assim Vasquez de Mella estabelece distinção entre «soberania social» pertença de cada grupo social ou pessoa colectiva com funções permanentes e próprias na comunidade, e «soberania política» que é a acção coordenadora das diferentes soberanias sociais. E diz: “Quando estas duas soberanias se juntam (no Parlamento, seja nacional ou regional) isso representa um regresso ao absolutismo, agravado pela irresponsabilidade e pelo anonimato das democracias partidistas”
(...)
”CONCLUSÕES
”Os Corpos Intermédios são, por sua natureza, anteriores ao Estado.
Os Corpos Intermédios são os autênticos representantes do espírito associativo do Povo, ao contrário dos partidos políticos que são essencialmente fictícios.
A representação dos Corpos Intermédios na Assembleia do Povo é, por isso, a verdadeira Representação Nacional.”
21 de Outubro de 2001
Em 1987, António Jacinto Ferreira, apresentou também ao País “UM ESQUEMA POSSÍVEL” para um Portugal Restaurado. Eis uma passagem significativa, tratando precisamente do problema da organização e articulação dos poderes municipais e regionais, que ficou inscrita sob uma epígrafe de Almeida Garrett – “... o Povo é quem a si mesmo se administra por magistrados eleitos e delegados seus...”:
”Ainda que todos os doutrinadores da Nova Ordem Social estejam de acordo em que a valorização do Poder Local deve ser de evolução ascendente, nada impede e até não deixa de ser recomendável que do poder central surjam iniciativas, incentivos, impulsos no sentido duma organização, sobretudo enquanto esta se mostrar incipiente.
”E, como é natural que nem todos os agregados de famílias constituindo Freguesias e Municípios, contem com núcleos de homens bons, esclarecidos e dinâmicos capazes de erguerem uma sociedade local, o estímulo Central nunca deixará de ser bem-vindo porque não trará a capa de intenções abusivas. [A objecção lançada sobre quem poderia tomar a iniciativa primária não tem base de aceitação, porque também não se pergunta quem tem ou teve a iniciativa de fundar um grupo folclórico, uma banda musical ou um grupo desportivo]
”O esquema que a seguir traçamos é apenas um exemplo do que pode ser e não tem pretensões a originalidade nem a constituir um traçado imutável.
”Tudo começará pela nomeação democrática, mas sem intervenção partidista, da Junta de Freguesia.
”Esta será constituída por seis membros, com a reserva de um lugar para qualquer lista de oposição porventura surgida.
”No Município, idêntico movimento criador procurará levar à confecção de uma lista de dez membros, homens e mulheres honradas e isentos de partidismo, para serem votados, também democraticamente por todos os habitantes desse Município com direito a voto, acrescidos dos naturais nele não domiciliados, reservando-se dois lugares na lista para opositores mais votados, caso venha a manifestar-se essa oposição.
”Haverá em cada Município uma Assembleia Municipal constituída por delegados de cada um dos Corpos Intermédios locais e sociais, devidamente classificados, com sede no Concelho.
”O sufrágio universal esgota-se ao nível do Município.
”O mandato dos vereadores durará, por exemplo, quatro anos.
”A vereação, na primeira sessão do último ano do seu mandato, proporá ao eleitorado uma lista para o quadriénio seguinte, e anunciará a aceitação de listas de oposição, depois de ter tornado conhecida aquela que elaborou.
”Todas as operações eleitorais constituem encargo do Município.
”Para a Região ou Província haverá um Corpo Executivo e uma Assembleia Regional. A primeira com mandato igual ao dos vereadores municipais, será constituída por doze membros, delegados de tantos Municípios SORTEADOS em todos os da Região. Estes não poderão entrar no sorteio seguinte, no qual, pelo contrário, participarão todos os que não exerceram cargos anteriores.
”Na Assembleia Regional terão assento os representantes de todos os Municípios sem assento no Corpo Executivo, além de um representante de cada Corpo Intermédio de carácter social e Federações e Uniões sediadas em território regional.
”As Regiões, Municípios e todos os outros Corpos Intermédios de grau superior, terão representação na Assembleia do Povo, que terá uma forma especial de soberania, dita soberania mitigada.
”A função legislativa poderá ser exercida pelo Governo e por esta Assembleia, mas assim como os projectos governamentais exigem aprovação da Assembleia, assim também os oriundos deste último órgão só serão lei depois de assinados pelo REI."
(...)
[este esquema, de raiz integralista, não dispensa naturalmente o Rei, entendido por Jacinto Ferreira, logo adiante no mesmo texto, como “o coordenador da governação, a qual será efectivamente exercida por Ministros por ele nomeados e assistido na sua missão coordenadora pelos Conselhos de Estado, cujos vogais serão uns de nomeação real e outros de inerência a cargos públicos ou privados”]
22 de Outubro de 2001, José Manuel Quintas
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